terça-feira, 14 de março de 2017

A sucessão de Temer e a Previdência Social - Raymundo Costa

- Valor Econômico

"Presidente das Reformas" no teste da Previdência

O ex-presidente Lula e o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, deram a largada na corrida presidencial, o petista atrás de uma blindagem às investigações da Operação Lava-Jato, e o tucano talvez tratando de assegurar um lugar na pista antes que a raia seja ocupada por pretendentes com maior apelo para um eleitorado que não parece seduzido por antigas apostas. O interesse de cada um pode ser diferente, mas a antecipação do debate sucessório tem em comum o condão de depreciar o governo Temer, num momento decisivo para as reformas econômicas.

Decisivo não só porque a reforma da Previdência caminha para a votação na comissão especial da Câmara dos Deputados, que deve aprová-la, como também porque a primeira onda de críticas à proposta parece ter abalado convicções no Congresso, onde até agora todas as pesquisas diziam que a proposta do governo passaria, com mudanças, mas certamente seria aprovada. Ganhou curso até uma tese exdrúxula segundo a qual é inexistente o déficit da Previdência. Só o que não parece ter mudado é a convicção do Palácio do Planalto de que a reforma será aprovada, pois não interessaria a ninguém que ela seja derrubada.

Não interessaria nem mesmo à oposição. Se Lula for efetivamente candidato, se livrar do abraço de morte da Lava-Jato e vencer a eleição de 2018, ele também irá preferir reencontrar o país com a reforma da Previdência pronta, do contrário, terá que fazê-la, cobrando um preço possivelmente ainda mais alto que a fatura apresentada por Michel Temer. O mesmo vale para Geraldo Alckmin ou qualquer outro candidato da base aliada, pois se a reforma não passar e o país quebrar, a oposição ganha a eleição. A sorte da situação está lançada, é a recuperação econômica ou apenas a danação da Lava-Jato.

"Quem acha que vai ser presidente, vai ter que torcer para pegar um país melhor", diz o ministro Gilberto Kassab, encarregado de botar de pé o ministério que reuniu comunicações com ciência e tecnologia, mas que não perde de vista o que acontece no Congresso. "Se a reforma for aprovada, quem for eleito em 2018 vai pegar um país melhor para governar, do contrário vai pegar um país quebrado".

Antes de ser prefeito de São Paulo e ministro dos governos Dilma (Cidades) e Temer (Comunicação), Kassab construiu a fama de hábil operador político, em dois mandatos na Câmara dos Deputados. Atualmente preside o PSD. Já passou pelo PL, o extinto PFL e o DEM. A exemplo de outros presidentes de partido, também é citado na Lava-Jato. Tem estrada e conhece como poucos os meandros do Legislativo, o que confere autoridade a seu prognóstico de que a PEC não só vai passar, como também será aprovada com menos mudanças do que deixa antever o declaratório dos políticos, às vésperas das primeiras votações.

Kassab reconhece que a reforma da Previdência é a mais difícil enfrentada pelo governo do presidente Temer, "mas também é a mais importante". O pacote de reformas ficará "capenga" sem a Previdência, e o governo, Kassab não diz mas está subjacente no seu raciocínio, já não terá muito o que fazer no Palácio do Planalto a não ser a contagem regressiva para a passagem da faixa presidencial em 2018. "As mudanças [no texto da proposta do governo] não serão profundas, se o governo ceder, será pouco" - e se as concessões forem muitas, vão inviabilizar os objetivos da reforma.

O ministro faz questão de ressaltar que não está no grupo palaciano encarregado de negociar a votação da reforma previdenciária, que desde ontem conta com sua escalação completa, com a volta ao cargo do ministro Eliseu Padilha (Casa Civil). A exemplo do que aconteceu com as outras votações de matérias de interesse do governo, o Palácio do Planalto deve convocar a sua força-tarefa de ministros políticos nos momentos decisivos - votação na comissão especial e no plenário da Câmara.

Em mais de uma entrevista recente, Temer disse que quer passar para a história como um presidente reformista que não hesitou em fazer as mudanças necessárias para o país retomar o trilho do crescimento. Depois de fazer passar 52 projetos de interesse do governo, ano passado, entre os quais quatro propostas de emenda constitucional de difícil aprovação, mas que obtiveram ampla maioria, Temer demonstra empolgação e fala até em remover antigos entulhos do Congresso, como a reforma tributária, numa versão simplificada, e a reforma política. É de se imaginar, portanto, a energia e o esforço que o Palácio do Planalto vai concentrar a partir de agora na mãe de todas as reformas. A marca "presidente das reformas" precisa da Previdência.

Outros setores do governo que também acompanham de perto as conversas, no entanto, demonstram preocupação com alguns deslizes da coordenação política do Palácio do Planalto. A liberação do voto do PMDB, por exemplo, libera outros partidos da base a não fechar questão. O acordo tácito era pelo fechamento. Ao contrário do julgamento de Kassab, há quem imagine que a reforma sairá, mas tão mitigada que representará uma derrota para o governo. Um dos motivos é que o Planalto teria botado muitos bodes na sala para negociar. Em risco, a reforma do Benefício de Prestação Continuada (BPC), os 49 anos de contribuição e o limite de idade igual entre homens e mulheres.

Temer quer resolver o assunto na Câmara em abril, e ainda neste semestre no Senado, que já arma suas barricadas, como demonstram recentes declarações do senador Renan Calheiros, líder da bancada majoritária do PMDB. As chances de qualquer reforma da Previdência ser feita neste governo diminuirão consideravelmente se a tramitação chegar a outubro, uma data emblemática (um ano antes da eleição presidencial), e o assunto não estiver resolvido. Se ficar para fevereiro de 2018, o governo afunda e aí já vira um problema da campanha sucessória e do próximo presidente. Saído da oposição, se o vaticínio de Kassab se confirmar.

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