terça-feira, 28 de março de 2017

IDH mostra um Brasil sem progressos e desigual – Editorial | Valor Econômico

O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) anunciou na semana passada que um dos mais importantes indicadores sociais, o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), estagnou no Brasil. Composto por dados de saúde, educação e renda, o IDH brasileiro permaneceu em 0,754 em 2015 e continuou no 79º lugar em uma relação de 188 nações. O país faz parte do grupo minoritário de 29 nações cujo IDH estacionou ou caiu. Na América Latina, o Brasil ficou atrás do Chile, Argentina, Uruguai e até da Venezuela. Ajustado pela desigualdade medida pelo índice de Gini, o Brasil cai para o 98º lugar.

O recuo do IDH do Brasil em 2015 foi causado principalmente pela queda da renda em consequência da recessão econômica. O levantamento do Pnud calculou em 4,8% a diminuição da renda per capita apurada pelo critério de paridade de poder de compra (PPP), uma perda um pouco maior do que a de 4,6% do PIB per capita calculada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) para aquele ano. Os outros indicadores estacionaram ou avançaram muito pouco. Houve um pequeno aumento de 7,7 para 7,8 anos em média de estudo. O período esperado de estudo ficou estagnado em 15,2 anos pelo terceiro ano seguido. A expectativa de vida ao nascer, pela qual o índice avalia a saúde, pouco mudou ao apontar 74,7 anos em comparação com 74,5 anos anteriormente.

O IDH começou a ser calculado em 1990 pelas Nações Unidas e o maior avanço foi registrado pelo Brasil na primeira década, de 12,1%, ganhando mais 5,7% na década seguinte. No acumulado em 25 anos, o IDH brasileiro aumentou 23,4% e foi puxado pela média de anos de estudo, que mais do que dobrou, de 3,8 anos para os 7,8 anos. A expectativa anos de estudo aumentou 24,6%, em comparação com os 12,2 de 1990. A renda per capita cresceu 31,6%; e a expectativa de vida ao nascer aumentou 14,4% sobre os 65,4 anos.

As perspectivas não são promissoras no curto prazo, a se calcular por outros indicadores disponíveis. O PIB per capita caiu mais no ano passado, 4,4%; e a previsão é de nova queda neste ano dada a previsão de expansão econômica de 0,5% e de crescimento da população de 0,9%. O peso da recessão pode ser mais visível no próximo levantamento do Pnud.

Nem a expectativa de vida nem a de anos de estudo devem registrar variações expressivas. Há 2,8 milhões de brasileiros de 4 a 17 anos fora da escola. A existência de cerca de 13 milhões de desempregados e salários estabilizados com tendência de queda também não ajudam. A taxa de desemprego chega a 23,1% entre a população de 15 a 24 anos. Além disso, o Pnud calculou que 3,6 milhões de pessoas entraram na pobreza; e que a renda dos 5% mais pobres caiu 14%. O Brasil é considerado o 10º mais desigual do mundo pelo índice de Gini, em um grupo de 143 países.

Nesse quadro de números pouco animadores, a direção do Pnud vê com preocupação as reformas econômicas em curso - notadamente a da Previdência e a trabalhista. Embora reconheça que são necessárias, receia que acentuem as desigualdades, afetando os mais vulneráveis, entre os quais os pobres, trabalhadores rurais e mulheres. O pesquisador Marcelo Neri, diretor da FGV Social, lembra o forte impacto negativo que teve o congelamento nominal do valor do Bolsa Família por dois anos, de 2015 a 2016 (Valor 22/3).

Especialistas receiam que a tendência do governo em priorizar o crescimento econômico para posteriormente melhorar os indicadores sociais agrave o quadro. Flávio Comim, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, defende o investimento na oferta de saúde e educação para a população para a melhora do IDH (Valor, 27/3). Cálculo que exclui a renda mostra um IDH pior no Brasil, que o leva para o 85º lugar no ranking feito de acordo com esse critério. Fernando Abrucio, coordenador do curso de administração pública da FGV-SP, lembra que a redução da desigualdade e o aumento da educação concorrem para o crescimento econômico na medida que levam mais pessoas a consumir (Valor, 24/3).

Até a reforma da Previdência pode acentuar a desigualdade caso piorem muito as condições de concessão dos Benefícios de Prestação Continuada para os mais pobres, sem falar no favorecimento dos servidores públicos, que chegam a ganhar em média cinco vezes mais do que o empregado do setor privado.

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