sábado, 15 de abril de 2017

Democracia direta? | Hélio Schwartsman

- Folha de S. Paulo

Há alguns dias, meu colega Vladimir Safatle propôs em sua coluna acabar com o "representativo" de nossa democracia representativa e abraçar uma "democracia real", na qual a população, reunida numa espécie de ágora virtual, decidiria diretamente as questões de seu interesse.

Não sou contra ampliar as ocasiões em que os eleitores se convertam em legisladores por meio de referendos e plebiscitos, mas reservo-me o direito de ser cético em relação às chances de uma democracia direta.

O maior problema, me parece, é que as pessoas não a querem. Como sempre brinco, se democracia direta fosse bom, reuniões de condomínio seriam um sucesso. Não são.

Para Safatle, que reconhece o desinteresse da população, ele tem como causa principal a consciência da irrelevância. Nas palavras do autor: "Desinteresso-me, porque sei que, no fundo, minha opinião não conta, que nada vai mudar". Penso que o problema é mais grave.

Embora de vez em quando o Parlamento precise decidir sobre assuntos polêmicos ou estimulantes, a maior parte da atividade legislativa diz respeito a questões aborrecidas, muitas vezes exasperantemente técnicas, ainda que importantes. Pior, compreendê-las para votar responsavelmente exigiria dedicar-lhes algumas horas de estudo, tempo que, em geral, as pessoas não têm ou preferem destinar a outras atividades.

Como a longo prazo a preguiça sempre vence, a solução foi profissionalizar os políticos. Em tese, eles deveriam agir como contadores ou advogados, mergulhando nos temas para encontrar decisões tecnicamente viáveis que sirvam aos melhores interesses de seus constituintes, definidos por uma espécie de contrato político-ideológico firmado com o eleitor durante a campanha.

O problema, e aí concordo com Safatle, é que políticos têm pensado mais em sua própria sobrevivência do que em honrar esse contrato.

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