domingo, 9 de abril de 2017

O mergulho da inflação | Celso Ming

- O Estado de S. Paulo

Redução da taxa de inflação deve ter consequências positivas ao consumidor

A inflação está mergulhando e deve mergulhar ainda mais.

Este 2017 começou com um avanço do custo de vida (evolução do IPCA) em 12 meses de 6,29%. Apenas três meses depois, já eram 4,57%. Os próximos meses prometem algo em torno dos 4%. A gente sabe disso porque a queda da inflação não é episódica, está bem espalhada, e porque, no mercado atacadista, o ambiente é de forte desinflação. Em março, o recuo dos preços no atacado (desinflação) foi de 0,78%. Será inevitável que parte dessa queda seja repassada para o varejo (custo de vida).

Como a vida continua dura, o desemprego é recorde e a renda, cada vez mais apertada, é compreensível que muita gente não esteja dando o devido valor ao mergulho da inflação e à importância desse fator na recuperação da economia. Mas as consequências objetivas, desta vez positivas, são inevitáveis, porque a esse ritmo, os formadores de preços tenderão a evitar remarcações. Os que tentarem aumentar demais os preços correrão o risco de encalhe da mercadoria.

A observação mais atenta sobre o comportamento da inflação e dos juros básicos (Selic) mostra que o juro real (preço do dinheiro descontada a inflação) ficou muito elevado. É o dobro do que era no início de 2016. Acompanhe aqui: em janeiro de 2016, a Selic era de 14,25% ao ano, enquanto a inflação em 12 meses era de 10,71%. Numa conta sem sutilezas técnicas, os juros reais (descontada a inflação) eram de 3,54%. Hoje a Selic ainda está a 12,25% ao ano para uma inflação em 12 meses em 4,57%, o que dá um juro real de 7,34%.

Mesmo com a perspectiva de queda da Selic de 1 ponto porcentual ao ano na reunião do Copom desta quarta-feira, os juros reais continuam altos demais em relação ao que eram no início de 2016.

É um fator que o Banco Central certamente levará em conta nesta e nas reuniões seguintes do Copom. Isso mostra que, apesar do mergulho dos juros, as aplicações de renda fixa continuam atrativas, mais atrativas do que no período em que a Selic permaneceu nos 14,25%.

Do ponto de vista do funcionamento da economia, a inflação na meta e, mais do que isso, com perspectiva de resvalar para abaixo do centro da meta, não só aponta para redução persistente dos juros, mas, também, para aumento da confiança na economia. Além disso, quanto mais baixa a inflação, maior tende a ser a eficácia da política monetária (política de juros) do Banco Central no controle da inflação.

Como a principal vítima da inflação alta é sempre o assalariado, na medida em que corrói poder aquisitivo, é inevitável que a relativa estabilização da economia acabe por ser mais bem percebida pelo consumidor. Quanto mais alta a inflação, menor sua capacidade de controlar suas compras. Nessas condições, ele se limita a baixar as mercadorias para o carrinho da feira e do supermercado, sem olhar demais para as diferenças. Quando a inflação baixa para níveis civilizados, digamos assim, fica mais fácil a memorização dos preços e, portanto, mais fácil o controle indireto do jogo de mercado. Ou seja, na medida em que tem mais condições de avaliar a evolução dos preços, o consumidor tende a evitar, a adiar uma compra ou, então, a substituí-la por outra.

Mesmo levando em conta que se trata de fruto de uma dolorosa recessão, o recuo da inflação é, no momento, a melhor indicação de que a economia está em recuperação.

Isso não é tudo, porque o melhor desempenho da economia pode ficar seriamente contaminado por “fatores extracampo”. A variável de previsão mais complicada é a que permeia as relações de poder. 

Os políticos estão apavorados com os desdobramentos da Operação Lava Jato e vivem no modo de sobrevivência. São pressões que fragilizam as bases do governo e complicam o apoio à aprovação de projetos de lei de importância estratégica, como o da reforma da Previdência. Se for rejeitada ou se for aprovada excessivamente desfigurada, a economia volta pro saco.

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