segunda-feira, 24 de abril de 2017

Risco na aprovação de reforma pode atrapalhar baixa de juro – Editorial | Valor Econômico

A cada nova estatística divulgada, o cenário inflacionário vem se revelando mais favorável do que o esperado, o que teoricamente permitiria ao Banco Central cortar com ainda mais força a taxa básica de juros. Mas o aumento das incertezas, nas últimas semanas, sobre a aprovação da reforma da Previdência poderá impedir estímulos mais expressivos para animar a débil atividade econômica.

A ata da reunião de abril do Comitê de Política Monetária (Copom) do BC, divulgada na semana passada, registra progressos significativos na estratégia de combate à inflação. As projeções macroeconômicas apresentadas no documento mostram que, hoje, há espaço para os juros básicos da economia caírem dos atuais 11,25% ao ano para 8,5% ao ano nos próximos meses sem colocar em perigo o objetivo de entregar a inflação na meta, de 4,5%, em 2017 e 2018.

Segundo a ata, ao examinar o cenário econômico na reunião de abril, os membros do Copom concluíram que "a conjuntura econômica permitiria uma intensificação do ritmo de flexibilização maior" no seu encontro seguinte, marcado para os dias 30 e 31 de maio. Ou seja, depois de baixar os juros em um ponto percentual em abril, de 12,25% ao ano para 11,25% ao ano, haveria espaço para um corte maior do que isso em maio, provavelmente de 1,25 ponto percentual.

São amplas as justificativas técnicas para maior ousadia. A inflação está, literalmente, derretendo. Na véspera do feriado de Tiradentes, a prévia do Índice de Preços ao Consumidor Amplo, o IPCA-15, registrou variação de 0,21%, abaixo da previsão de 0,27% dos analistas econômicos, segundo projeções coletadas pelo Valor Data. Os economistas do setor privado já esperam que a inflação fique abaixo da meta não apenas em 2017, mas também em 2018.

Se o BC caminha para cumprir seu mandato legal de estabilidade de preços, o mesmo não se pode dizer do preceito dos regimes de metas de minimizar a flutuação da atividade econômica. A expansão do PIB projetada pelo mercado para este e para o próximo ano, respectivamente de 0,4% e de 2,5%, é bem aquém do necessário para preencher o elevado grau de ociosidade da economia.

O Copom tem mostrado algum grau de sensibilidade para a esse aspecto fundamental do seu mandato, com a adoção de ritmos de corte de juros progressivamente mais acelerados. Em janeiro, intensificou a baixa de juros, de 0,25 ponto para 0,75 ponto; em abril, de 0,75 ponto para 1 ponto. Por isso, faz sentido imprimir ainda mais força na distensão monetária, com um movimento de 1,25 ponto ou até mais.

O que pode atrapalhar os planos do Copom, porém, é a incerteza do lado político. "A continuidade das incertezas e dos fatores de risco que ainda pairam sobre a economia tornaria mais adequada a manutenção [em maio] do ritmo imprimido nesta reunião [de abril]", diz a ata do Copom, sugerindo que algumas nuvens em seu horizonte poderiam recomendar uma dose de cautela, mantendo as baixas de juros em um ponto percentual.

No documento, o Copom apresenta uma lista de riscos relevantes à condução da política monetária, que incluem o cenário externo, as reformas fiscais e a atividade econômica, mas não especifica qual desses fatores preocupa mais no momento. Mas sabe-se que, nas últimas semanas, cresceram as incertezas sobre o andamento da reforma da Previdência, com dúvidas sobre a formação de maioria no Congresso para aprová-la e concessões no texto original. O risco político se exacerbou, também, com a divulgação da Lista Fachin.

Sem uma reforma da Previdência suficientemente ampla, o teto constitucional de gastos vira letra morta. O governo sustenta que foi preservada 80% da economia gerada pela proposta original, mas não abriu os dados que permitam uma checagem independente dessa afirmativa. O mercado financeiro tem muitas dúvidas e, segundo alguns cálculos de especialistas de fora do governo, a economia fiscal seria inferior a 60% da prevista no projeto.

Para reduzir as incerteza, é preciso que o governo dê maior transparência aos dados. O Congresso também tem que ter consciência de que, se houver excesso de concessões, a reforma será insuficiente para assegurar a necessária sustentabilidade fiscal. Num cenário extremo, podemos ter uma nova alta do risco país e da cotação do dólar, reavivando as pressões inflacionárias e levando o Copom a subir os juros.

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