domingo, 7 de maio de 2017

O difícil cálculo político das reformas | Samuel Pessôa

- Folha de S. Paulo

Na quarta-feira (3) à noite, foi aprovado o relatório de Arthur Oliveira Maia (PPS-BA) da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) da Previdência na Comissão Especial da Reforma da Previdência na Câmara.

O placar apontou 23 votos favoráveis ao relatório e 14 contrários, ou seja, 62% dos 37 integrantes da Comissão votaram a favor.

Com grande dificuldade, as reformas avançam.

Há pouco tempo, imaginava-se que seria impossível que evoluísse ambiciosa agenda de reformas simultaneamente ao forte desgaste do sistema político com o processo da Operação Lava Jato. Ainda mais sendo tocada por governo com baixa popularidade.

Constata-se hoje autonomia entre as duas dinâmicas. A agenda de reformas acompanha a dinâmica política mediada pelos impactos das reformas na economia e, portanto, no cenário político em 2018. A agenda da Lava Jato acompanha a dinâmica policial e da Justiça. A autonomia delegada em lei aos organismos de controle do Estado tem produzido a autonomia da esfera política em relação à policial. Fortíssimo sinal de evolução institucional de nossa sociedade.

A esta altura do jogo, é possível que a classe política que protagonizou o impedimento da presidente Dilma Rousseff esteja arrependida: a recuperação tem sido mais difícil do que se supunha. O motivo é que a desastrosa política econômica praticada de 2009 até 2014, além de desorganizar a macroeconomia, destruiu a economia real. Levará anos para arrumar.

Com arrependimento ou sem arrependimento, a base do governo terá que embalar Mateus até a próxima eleição.

No Ibre, desde o ano passado revisamos o cenário de atividade em 2017 para levemente melhor: no início de 2016, achávamos que a economia cresceria 0% em 2017, e em maio já considerávamos números próximos da projeção atual, de 0,4%.

O jogo das expectativas de mercado em relação à economia tem efeitos ambíguos sobre a dinâmica política. O ano e meio que falta para as eleições sinaliza que fica cada vez mais difícil a aprovação das reformas. Menor o tempo de colheita dos bônus.

No entanto, a rejeição das reformas pode recolocar a economia –por meio das reações do mercado financeiro– em situação próxima à vivida no segundo semestre de 2015, quando ficou clara a incapacidade de Dilma aprovar reformas: o prêmio de risco pago pelos títulos soberanos brasileiros de dez anos subiu quase três pontos percentuais, e o câmbio bateu em R$ 4,1.

Um cenário como esse aborta o processo de desinflação e, consequentemente, o ciclo de redução da taxa Selic. A desorganização da economia, agora com Temer no leme, joga mais água no moinho da candidatura de Lula.

Resta aos deputados governistas o difícil cálculo. De um lado, o custo político de apoiar uma agenda de reformas cujos efeitos na economia real levarão mais do que ano e meio para aparecer. Por outro, a aprovação das reformas garante a manutenção da lenta recuperação econômica e do cenário de inflação e juro real em queda. Adicionalmente há o bônus de algum cargo mantido ou emenda que pode ser liberada.

"O leitor Georg Elster lembrou-me do excelente texto de Marcelo Medeiros e Pedro de Souza sobre o impacto das regras muito mais generosos de aposentadoria dos servidores públicos na reprodução da desigualdade de renda. Trata-se do "Texto para Discussão" do Ipea 1.876 de outubro de 2013."

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