quarta-feira, 14 de junho de 2017

A importância da OCDE para o Brasil | Cristiano Romero

- Valor Econômico

Nos governos do PT, MRE impediu que país aderisse à organização

Fazer parte da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), o grupo que reúne desde os anos 60 as maiores economias do mundo, foi durante muito tempo uma aspiração do Brasil, rejeitada pela instituição. Durante o último boom da economia brasileira (2004-2010), a OCDE, reconhecendo não apenas os avanços econômicos do país, mas também os institucionais, passou a fazer a corte. Desta vez, porém, quem não quis conversa com o "clube dos ricos", a alcunha pejorativa atribuída por décadas ao grupo, foi o governo Lula, mais especificamente o Itamaraty, na ocasião chefiado pelo chanceler Celso Amorim. No início deste mês, o Ministério da Fazenda e o Itamaraty se engajaram numa nova tentativa de aproximação.

Em 2007, a OCDE, cuja sede fica em Paris, lançou a iniciativa "enhanced engagement" (engajamento ampliado), para estimular a adesão de cinco nações - além do Brasil, China, Índia, África do Sul e Indonésia. O grupo foi batizado de E-5. O interesse no E-5 tinha uma justificativa óbvia: sem a participação dessas nações emergentes, cujas economias eram as que mais cresciam naquela época, a entidade perderia relevância.

De lá para cá, a OCDE não perdeu o interesse em ter o Brasil como país-membro, mas a ansiedade diminuiu. Nesses anos, o país, como se sabe, rumou para a mais grave crise econômica de sua história, levado por um governo, o de Dilma Rousseff, que, por puro voluntarismo ideológico, decidiu mudar a política econômica que vinha dando razoavelmente certo e fazer experimentos que, no passado, já não tinham dado certo.

O resultado - recessão que já dura três anos e queimou quase 9% do PIB; queda de 11% da renda per capita no biênio 2015-2016; 14 milhões de desempregados; quebradeira recorde de empresas e até setores; falência do Estado (designação, sem eufemismo, do déficit primário anual de 3% do PIB e do crescimento vertiginoso da dívida pública) - nos desqualificou como pretendentes e o assunto morreu. É verdade que os emergentes, em geral, também perderam nos últimos anos o brilho conquistado na primeira década do século.

A Rússia negocia há dez anos sua adesão à OCDE. Dos outros três integrantes do E-5, nenhum ingressou na instituição. Chile, Estônia, Israel e Eslovênia, que começaram a conversar depois da Rússia e dos outros gigantes emergentes, se tornaram membros. O fato é que, com exceção da Rússia, os outros quatro do E-5 tinham pouco ou nenhum interesse em aderir.

Durante os dois mandatos do presidente Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), o Brasil se aproximou bastante da OCDE. No início, integrava apenas o Centro de Desenvolvimento da instituição, mas, ao longo dos anos, passou a fazer parte de inúmeros comitês e grupos de trabalho. O ápice da aproximação ocorreu em 2000, quando o governo brasileiro assinou a Convenção de Combate à Corrupção de Autoridades Estrangeiras, inspirada na lei americana que combate esse tipo de crime desde os anos 70 e que agora tem sido bastante útil nas investigações da Operação Lava-Jato.

No primeiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2006), o interesse pela OCDE continuou forte no Ministério da Fazenda, mas não no Itamaraty. A equipe da Fazenda acreditava que o ingresso na OCDE daria ao país um selo de qualidade que, em última instância, facilitaria a concessão, pelas agências de classificação de risco, do grau de investimento - o país acabou conquistando esse status em maio de 2008, mas, graças à ruinosa gestão Dilma, perdeu-o em apenas sete anos. Além disso, estar na OCDE asseguraria ao Brasil assento num fórum econômico que estabelece regras para a economia mundial, cria padrões de comportamento em várias áreas e influencia nas negociações de outras instituições multilaterais, como a Organização Mundial do Comércio (OMC).

Há uma percepção no mercado de que os países da OCDE seguem boas políticas. A percepção de risco dos 35 países-membros da organização é menor que a dos que não integram o grupo. O secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Fábio Kanczuk, estima, num cálculo bastante conservador, que apenas o ingresso do Brasil na OCDE já reduziria em 0,1 ponto percentual ao ano o prêmio exigido pelos investidores para financiar a dívida pública. Como essa dívida está em torno de R$ 4,5 trilhões, a economia imediata que a adesão produziria nos gastos públicos seria, grosso modo, de R$ 4,5 bilhões.

Como sempre ocorre no Brasil, alguém já veio a público afirmar que, ao tornar-se membro da OCDE, o país terá que arcar com um pagamento anual de € 15 milhões (cerca de R$ 55 milhões) à organização, um valor "caro". Fica combinado, então, que essa quantia é irrisória diante das vantagens, inclusive financeiras, que o país passará a ter quando estiver lá. Isso vale também para as empresas privadas, igualmente submetidas às regras da OCDE.

"Só vejo grandes vantagens para o Brasil em integrar a OCDE", disse Kanczuk a esta coluna. "A irrelevância dessa despesa [os € 15 milhões] é enorme diante do carimbo de seriedade que o país ganhará. Daremos um sinal claro ao mundo de que estamos nos movendo na direção certa."

No governo Lula, usou-se o seguinte argumento para bloquear as tratativas entre o país e a OCDE: a crise global de 2008, originada nos Estados Unidos, teria desmoralizado o receituário econômico dos países ricos; diante disso, por que o Brasil deveria aderir a uma instituição cujas receitas levaram à crise? Menos de uma década depois, o que se vê, depois da adoção da Nova Matriz Econômica, é o Brasil numa crise sem-fim e os EUA há mais tempo e a Europa mais recentemente crescendo pouco, mas crescendo, e ampliando seu domínio na economia mundial.

Embora não integre oficialmente os quadros da OCDE, o Brasil tem uma intensa relação com o organismo em termos de cooperação técnica. Nada menos que 32 órgãos públicos - 16 ministérios e 16 autarquias - participam de comitês, grupos de trabalho e forças-tarefas da organização. Até pouco tempo atrás, o país era o único país da América do Sul que participava do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa), da OCDE, desde a sua primeira aplicação, em 2000.

Há obstáculos a uma adesão completa, mas, quando vistos de perto, são desafios que, se superados, tornarão o Brasil um país melhor para quem vive, produz e investe nele.

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