sexta-feira, 23 de junho de 2017

Clima de tensão e ironia

Em discussão, Barroso reage a Gilmar, que acusara o colega de não respeitar posições divergentes

André de Souza e Carolina Brígido, O Globo

-BRASÍLIA- O clima azedou ontem no Supremo Tribunal Federal (STF) entre os ministros Luís Roberto Barroso e Gilmar Mendes. Os dois têm posições diferentes sobre as regras das delações premiadas, tema que estava sendo julgado. Os ânimos se exaltaram pouco antes de a sessão ser interrompida no meio da tarde para um intervalo. Barroso, que votou com a maioria pela manutenção da forma como as colaborações são feitas, reagiu irritado quando Gilmar o acusou de não respeitar posições divergentes.

— Essa é a opinião de Vossa Excelência, deixe os outros votarem — exaltou-se Gilmar.

— Sim, mas tá todo mundo votando — respondeu Barroso.

— E respeite o voto dos outros — reagiu Gilmar.

— Claro, vou plenamente respeitar os votos dos outros. Estou ouvindo Vossa Excelência. Inclusive foi Vossa Excelência que ontem suscitou: a questão não é só essa, temos outras considerações. E em consideração à de Vossa Excelência, eu trouxe a minha. Agora não pode: Acho que vou perder e vou embora, não! Estamos discutindo — devolveu Barroso, em possível ironia ao fato de Gilmar ter abandonado o plenário do STF durante debate sobre financiamento privado de campanha, em 2015, após desentendimento com Ricardo Lewandowski, que presidia a sessão e concedera aparte ao advogado que representava a OAB.

No intervalo, após a discussão, Gilmar chegou de fato a deixar o tribunal. Quando a sessão foi retomada, ele não estava presente, e só voltou quando Dias Toffoli já proferia seu voto.

Barroso não costuma discutir com os colegas no plenário. Gilmar, por sua vez, já se desentendeu com outros ministros. Antes da discussão, Barroso argumentou que provas trazidas na delação, mesmo que anuladas, não devem ser capazes de contaminar a colaboração.

— Os temas de legalidade têm que ser enfrentados neste momento. Para dar um exemplo real: se num caso concreto o Supremo venha a declarar ilegítima, por qualquer razão, uma gravação ambiental, que, no entanto, foi levada em conta no momento da celebração do acordo, eu acho que a eventual invalidação da gravação ambiental não contamina a colaboração premiada se o procurador-geral tiver proposto o acordo e o relator tiver homologado — defendeu Barroso.

O ministro alertou para a possibilidade de o julgamento abrir caminho para a anulação da delação mais à frente, mesmo que o delator tenha cumprido o acordo. Barroso disse isso após comentário de Gilmar sobre gravações feitas por delatores da JBS sem conhecimento dos interlocutores.

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