segunda-feira, 26 de junho de 2017

Dinheiro a qualquer preço é suicídio político | Angela Bittencourt

- Valor Econômico

Meta de 2019 e TJLP do 3º trimestre são decisões do CMN

O segundo semestre está no aquecimento para entrar no calendário e acumulam-se evidências de que o governo - com a baixíssima aprovação de 7%, segundo Pesquisa Datafolha - pode cometer um suicídio político se buscar dinheiro a qualquer preço para aliviar a corda que tem no pescoço. Com a meta de déficit primário de R$ 139 bilhões definida para o ano fora de alcance, o governo tentará, no mínimo, evitar o constrangimento de que o rombo nas contas públicas aumente em mais R$ 40 bilhões ou R$ 50 bilhões até dezembro. Esse é mais um risco que se soma ao político, neste momento em que o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, apresentará denúncia contra o presidente Michel Temer.

Três notícias divulgadas na semana passada são eloquentes quanto aos apuros por que passa o Ministério da Fazenda: a arrecadação total da Receita Federal em maio somou R$ 97,694 bilhões (o resultado - pior para o mês desde 2010 - revela a tibieza da atividade econômica); a proposta feita em comissão da Câmara pelo adiamento, por seis meses, da reoneração da folha de pagamento com a inclusão de mais seis setores aos já beneficiados pela decisão poderá desfalcar o caixa da União em R$ 4,7 bilhões ainda neste ano e o governo discute reter parte do FGTS dos trabalhadores demitidos sem justa causa para economizar com o pagamento do seguro desemprego.

A informação, veiculada na edição do jornal "O Globo" na sexta, e confirmada pelo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, foi o ponto alto da semana na área econômica, mas o atrevimento do governo para fazer menos feio no fim do ano, quando fechar o balanço de suas contas, não para por aí.

O governo já tem pronta e trabalha para enviar ao Congresso nas próximas semanas uma Medida Provisória que regulamenta a retomada de recursos públicos pagos indevidamente a pessoas que morreram. O repórter Fábio Graner, explica que hoje, quando um servidor público ou beneficiário do INSS ou de outro programa morre, o salário, aposentadoria ou benefício segue sendo pago por mais alguns meses até sua interrupção. A estimativa dos técnicos é que essa medida gere cerca de R$ 700 milhões aos cofres federais neste ano só pela reversão do estoque de recursos pagos a mais.

Pelas contas do governo, só para servidores públicos já foram identificados cerca de R$ 75 milhões pagos indevidamente. Além disso, outros R$ 600 milhões pagos para aposentados do INSS que já morreram foram rastreados pela área técnica do governo e poderão ser revertidos com a edição da MP. A nova legislação também evitaria novos pagamentos indevidos, acelerando a interrupção tão logo seja constatada a morte da pessoa.

A MP tem objetivo semelhante ao do projeto enviado neste ano pelo governo ao Congresso que permite a retomada de precatórios pagos pela União e não sacados pelos beneficiários por pelo menos dois anos. Esse projeto de lei já foi aprovado na Câmara dos Deputados. Depende agora da chancela do Senado. Com os precatórios, a equipe econômica espera arrecadar R$ 8,6 bilhões neste ano.

Dados da Receita Federal antecipam que os resultados fiscais de maio, que saem esta semana, serão muito ruins. "A arrecadação continua caindo, receitas recorrentes escasseiam, despesas correntes seguem em alta e os cortes nos investimentos não são suficientes para remendar as contas", afirma o economista-chefe do Banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves. "Agora, aceita-se que se a economia não andar a arrecadação não anda... já é alguma coisa. Falta aceitar-se que investimentos são necessários para que a economia cresça. E que mesmo com recuperação da atividade, prejuízos acumulados em dois anos de recessão serão compensados na tributação [já existente] das empresas. Para maio, estimamos déficit de R$ 18,7 bilhões para o governo central, o que levaria o déficit em doze meses de R$ 136,2 bilhões para R$ 154,9 bilhões, aumento de quase 14%", acrescenta.

Positiva para o governo é a informação de que, nesta semana, o Conselho Monetário Nacional (CMN) cumpre uma determinação legal estabelecida na implantação do regime de inflação no país em 1999: define a meta de inflação de dois anos à frente, 2019, portanto. Já é notório que a meta cairá de 4,50% para 4,25%. Haverá grande surpresa se o Conselho optar por outra referência, mas o mercado financeiro reconhece que poderia trazer a meta para 4%, conforme apurou o repórter José de Castro, do Valor.

O passo que as autoridades monetárias darão parece irrisório, mas a perspectiva de cumprimento de meta menor tem poderoso efeito sobre as expectativas. Certamente, os pequenos ajustes feitos no regime de metas contribuem para a reeducação de formadores de preços.

Até o ano passado, a meta estava em 4,50% com a possibilidade de variar 2 pontos acima e 2 pontos abaixo dessa marca - mantendo o teto da banda de flutuação em 6,5%. No ano em curso, a meta ainda é de 4,50%, mas a margem de tolerância caiu a 1,50 ponto para mais ou para menos. O teto do regime caiu para 6,0%. O mesmo vale para 2018. Em 2019, porém, com meta de 4,25% e banda de 1,50 ponto, o teto cairá a 5,75%.

Esse declínio gradual e persistente da meta inflacionária - desde que cumprido - dá ao Banco Central (BC) mais elementos para prosseguir com o corte da taxa básica de juro, a Selic. A flexibilização monetária iniciada em outubro do ano passado já reduziu a Selic em 4,0 pontos percentuais, de 14,25% para 10,25%. No fim de julho, o Comitê de Política Monetária (Copom) se reúne e poderá cortar a Selic em mais 1,0 ponto, para 9,25%, e a redução total no ciclo a 5,0 pontos.

O Conselho Monetário decide também, na próxima quinta-feira, o valor da TJLP (Taxa de Juro de Longo Prazo) para o terceiro trimestre do ano. Essa taxa é o fator de correção da maior parte dos financiamentos concedidos pelo BNDES. A TJLP está em 7% ao ano e, em 2018, deverá ser substituída pela Taxa de Longo Prazo (TLP) que, atrelada à variação de um título público chamado NTN-B, tende a um valor mais aproximado às taxas de juros praticadas no mercado financeiro.

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