sexta-feira, 9 de junho de 2017

Especialistas divergem sobre delações

Por Ricardo Mendonça e Fernando Taquari | Valor Econômico

SÃO PAULO - Crítico da Lava-Jato e dos processos que atingem o PT, o advogado Pedro Estevam Serrano, professor de Direito constitucional da PUC-SP, diz que não enxerga elementos no processo em curso no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que justifiquem a cassação do presidente Michel Temer.

"Sei que pode parecer absolutamente antipático isso que estou defendendo. Mas não vejo fundamento jurídico constitucional para cassar a chapa", afirma. Serrano lista restrições desde a forma como o caso tem sido conduzido pelo TSE. "A meu ver, a investigação eleitoral não pode ter caráter inquisitorial. É processual", diz.

Serrano argumenta que as delações, no caso específico, jamais poderiam ser consideradas. Para ele, as colaborações são sempre "problemáticas", já que, para garantir os benefícios, "é natural que o delator invente casos". Além disso, afirma ele, seria inconstitucional considerá-las neste julgamento porque não constavam na reclamação original contra a chapa.

As peças contra Dilma e Temer, que terminaram unificadas em um só processo, foram protocoladas pela coligação que sustentava a candidatura presidencial de Aécio Neves (PSDB-MG) entre 2014 e 2015, bem antes das delações. A inclusão ou não de novas provas, que faz parte das preliminares do julgamento, tem sido o centro do debate entre os ministros do TSE.

Sem os depoimentos da Odebrecht e do marqueteiro João Santana, diz Serrano, não há no caso em curso ilicitudes com dolo e má-fé suficientemente caracterizados. Sendo assim, acrescenta, seria necessário provar que houve corrupção econômica por parte da campanha vencedora com intensidade para alterar o resultado da eleição. Isso não foi provado, segundo ele.

Um aspecto especialmente preocupante para o constitucionalista é o que ele chama de "vulgarização" da ideia, segundo a qual, os magistrados deveriam dar atenção aos apelos da opinião pública na hora de julgar, uma noção que classifica como "autoritária".

"O tribunal tem a função de ser a voz dos direitos fundamentais. O lugar de a opinião pública ser preponderante é o Legislativo. É por isso que o juiz tem boa remuneração e é vitalício no cargo. Mas no Brasil, infelizmente, o que estamos vendo é uma sensibilidade excessiva dos juízes para o fato noticiado, para as repercussões", critica.

O jurista Modesto Carvalhosa discorda de Serrano. Em sua opinião, uma eventual absolvição da chapa desacreditará o Judiciário e levará a uma "desestabilização institucional" no país, com o agravamento da crise política e a paralisação da atividade econômica.

O jurista, que já chegou a defender a extinção do PT, defende a admissibilidade de novas provas, com as delações da Odebrecht e do casal de marqueteiros, e diz que há "elementos cabais" para cassação de Dilma e Temer. "É de uma falácia e de uma sem-vergonhice sem tamanho dizer que os depoimentos não podem ser incorporados ao processo. Trata-se de uma aberração jurídica. Nunca vi coisa alguém".

"Esse entendimento subverte os princípios da lei eleitoral. A absolvição da chapa, fundamentada com este argumento, levará a desestabilização institucional do Brasil, com repercussões socioeconômicas. Será um desserviço ao país", acrescentou Carvalhosa.

De acordo com o jurista, ministros julgam "com uma falsa análise política consequencialista", de que é preciso manter Temer na Presidência para preservar a economia. "Vejo uma posição de oportunismo e má-fé em relação às prerrogativas de desvio de autoridade. Os ministros não tem obrigação de proteger ninguém", declara.

A absolvição de Temer, ressaltou Carvalhosa, abre um precedente perigoso e coloca em risco a imagem do Judiciário. "Passa a ideia de que se pode fraudar as eleições, desde que você seja amigo do rei. No caso, o presidente do TSE, Gilmar Mendes", alegou Carvalhosa, lançado recentemente por um grupo de juristas como candidato à Presidência numa eventual eleição indireta.

Aos 85 anos, Carvalhosa pretende defender a bandeira da refundação do Estado e de uma nova assembleia constituinte.

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