terça-feira, 4 de julho de 2017

Ideologia nacional – Editorial | Folha de S. Paulo

Pouco mais de um ano depois que o PT foi substituído no poder federal por uma coalizão liderada pelo PMDB, hoje igualmente impopular, os brasileiros de novo se mostram divididos entre posições à esquerda e à direita.

Na mais recente pesquisa do Datafolha, nota-se oscilação rumo à primeira do pêndulo ideológico nacional, quando se comparam as preferências manifestadas agora com as de quase três anos atrás.

Em setembro de 2014, conforme os critérios do levantamento, 45% do eleitorado identificava-se com pontos de vista tidos em geral como mais conservadores, enquanto 35% apoiavam ideias comumente associadas ao campo oposto.

Agora, apurou-se um empate técnico —de 40% a 41%, respectivamente— que reproduz o equilíbrio observado em novembro de 2013, na primeira sondagem do tipo realizada pelo instituto.

Sempre haverá discordâncias, é claro, quanto à metodologia adotada em uma pesquisa como essa, baseada em questões sobre temas tão diversos quanto direitos trabalhistas, pena de morte, razões da pobreza e maioridade penal.

Muitos dos que se consideram de esquerda ou centro-esquerda, sem dúvida, discordarão de respostas atribuídas a esse lado do espectro político; o mesmo se dará no flanco direito.

Entretanto os dados não apenas revelam a evolução das opiniões nacionais como permitem identificar, com clareza, valores comuns à grande maioria.

Percebe-se, a esse respeito, um eleitorado mais conservador no que diz respeito a costumes (em tese, à direita) e defensor de um Estado forte na economia (posição associada à esquerda).

Os brasileiros exprimem, assim, boa dose de rejeição a teses liberais —em comportamento, por influência decisiva da religião (para 83%, acreditar em Deus torna as pessoas melhores), e, do lado econômico, das tradições intervencionistas (para 76%, o governo deve ser o maior responsável pela promoção da prosperidade).

Há, decerto, contradições aqui e ali. É notável, por exemplo, a crescente aceitação dos homossexuais, defendida por 74%, ante 64% três anos atrás. O estatismo tampouco impede que 51% desejem pagar menos impostos e contratar saúde e educação privadas.

No entanto, acima da dicotomia direita-esquerda, cujos contornos não se afiguram tão nítidos no Brasil, prevalecem a crença no governo, depositário das esperanças nacionais, e a moral cristã.

Com raízes que remontam ao surgimento da nação, tais valores não são imutáveis, mas ainda parecem os guias mais genuínos do que seria uma ideologia brasileira.

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