segunda-feira, 17 de julho de 2017

Marina admite que está consultando amigos e partidos sobre 2018

Sonia Racy, O Estado de S. Paulo

A ex-senadora e líder da Rede Sustentabilidade evita frases diretas mas admite que está dialogando com possíveis parceiros sobre 2018 e que a sua Rede terá candidatura própria ao Planalto

Mesmo depois da condenação de Lula na semana passada – que saudou como uma prova de que “a lei vale para todos” –, Marina Silva hesita em assumir sua candidatura ao Planalto em 2018. Em longa conversa com a coluna, a ex-senadora avisou que precisa ouvir auxiliares diretos, na Rede, e mesmo outras pessoas fora dela, antes de bater o martelo sobre os desafios práticos a vencer para levar adiante a ideia.

A discussão concreta sobre candidatura, segundo ela, “deve ser feita em 2018”. Mas admitiu: “A Rede tem uma expectativa, claro, de candidatura própria, e está dialogando a respeito com outros partidos”.

Quanto ao País real, de hoje, a líder da Rede Sustentabilidade entende que está na hora de se pensar “no pós-presidencialismo de coalizão”, e se pôr em prática um acordo sério entre governo e sociedade “para se preservar as conquistas institucionais e parar de fulanizar e partidarizar”. A seguir, trechos da entrevista.

Nós estamos perto de um caos político, ético e social. O senhora vê algum túnel, mesmo sem luz, para o País sair da escuridão?

A grande vantagem do ser humano é que ele tem a capacidade de, quando não existir túnel, usar o seu próprio corpo e sua mente para construir um. Neste momento, talvez o grande problema de não se ver luz nem túnel seja porque a maioria dos que deveriam acreditar na força da sociedade para criar esse túnel simplesmente não consegue entregar a tarefa.

Pode ser mais específica? Alguma parte da sociedade tem mais culpa?

Qualquer pessoa medianamente informada sabia que, quando houvesse um trabalho sério por parte da Justiça, chegaríamos onde chegamos. Tenho defendido, desde 2015, que o TSE deveria cassar a chapa Dilma-Temer, abrindo-se caminho para uma agenda de transição, com nova eleição.

Mas isso não aconteceu. Olhando para frente, com ‘Fora Temer’ ou ‘Renuncia Temer’, o que vem depois? Cadê o túnel?

Não se chega no túnel apostando nos atalhos. O que vemos é um atalho atrás do outro para que os mesmos permaneçam no poder. É uma vergonha que neste momento a gente tenha um presidente da República que vivenciou tudo o que vivenciou com o empresário da JBS, que tenha mais de seis ministros encastelados no governo querendo se proteger da Justiça, que se use dinheiro do Orçamento para comprar votos para evitar a autorização de um julgamento. Uma intervenção ao modo da Venezuela. Fazer uma intervenção na CCJ trocando deputados… isso é uma venezuelização.

Como assim?

Se todos acreditarmos que é possível confiar nos cidadãos e cidadãs que foram usurpados em seu direito de escolha por uma eleição fraudulenta… A eleição de 2014 foi uma fraude. E por quê? Porque quem ganhou usou dinheiro da corrupção do caixa 2, quem foi para o segundo turno usou dinheiro da corrupção de caixa dois. Um fraude absolvida pela instância mais alta da corte eleitoral do nosso País.

Com toda certeza a sra. vai ser candidata em 2018, não? Como pretende disputar com as dificuldades que vem enfrentando?

A discussão sobre candidaturas vai ser feita em 2018. A Rede tem uma expectativa, claro, de candidatura própria. Nesse sentido, está dialogando com outros partidos.

Existe a possibilidade de a sra. não ser candidata?

Quando se tem uma visão democrática da política a decisão é sempre do coletivo. Se você dissesse que não há essa possibilidade estaria se sobrepondo autoritariamente ao partido.

A Rede nasceu cercada de muita expectativa, mas parece demorar para deslanchar. Como está vendo o futuro da legenda?

A Rede é um partido que acaba de nascer, só temos dois anos e uma contribuição muito grande. Foi a Rede que entrou com o pedido de cassação do Delcídio, com pedido de cassação do Aécio Neves, com a ação no Supremo para que alguém sendo investigado não faça parte da linha sucessória. E entrou com o pedido de cassação do Cunha.

Mas em 2016, entre 5.500 prefeituras, o partido só elegeu seis prefeitos. O que falta fazer para ele crescer?

Não estamos preocupados com aumento quantitativo, fizemos um esforço por aumento qualitativo. O PSOL que já tem mais de 10 anos, não é? Então…

Então a sra. está feliz com o ritmo, com as propostas…

Nada do que aconteceu estava fora daquilo que a gente se propôs a fazer, que foi ter candidaturas comprometidas com o programa. A Rede é um partido programático.

Mas uma campanha exige metas e prazos concretos.

Estamos vivendo as dificuldades de um partido que para ser criado teve que passar pelo fogo e pela água. Primeiro porque anularam as nossas fichas com o intuito, hoje para mim fica cada vez mais claro, de que não fôssemos beneficiados pela mesma legislação que beneficiou o Solidariedade e o partido do ex-prefeito Kassab. Nós temos apenas 12 segundos de TV.

No começo da conversa a sra. enfatizou que as instituições estão funcionando. O Congresso está funcionando?

Sim, com todos os defeitos do seu funcionamento. Uma parte da Justiça está funcionando, e muito bem, e no Congresso há deputados e senadores fazendo bem o seu trabalho.

Há pouco a sra. mencionou que “a alta corte”, no caso o TSE, errou ao não punir a chapa Dilma-Temer. Acha que a PGR acertou no episódio dos irmãos Batista?

As medidas tomadas pela PGR e pela Polícia Federal são recepcionadas pela lei. E a gravação feita pelo empresário recebido na calada da noite, pelo presidente, no palácio, foi dele, não houve combinação para que ele fizesse.

A sra. já atuou no Senado. Como interpreta o que aconteceu na semana passada, com senadoras invadindo e ocupando a Mesa da Casa?

Tivemos duas invasões no Congresso na semana passada. A primeira, a invasão do Executivo sobre a CCJ, substituindo deputados e liberando emendas para mudar os votos. A segunda, a das senadoras. Não vejo diferença entre as medidas provisórias que foram compradas e aqueles que recebem emendas em troca de voto favorável aos que deveriam ser julgados pela Justiça. É uma atitude política a meu ver incompatível com a ação do parlamento. Veja que quando foi decidida a absolvição do senador Aécio Neves, mesmo tendo o seu primo recebido igualmente uma mala de dinheiro em espécie de R$ 2 milhões, o Conselho de Ética o absolveu sem sequer acolher para debate a denúncia sobre o mandato, como havia ocorrido com o senador Delcídio do Amaral. Aí se abre um precedente e tudo é possível. E se você arquiva esse processo, como vai censurar as senadoras que ficaram sentadas na cadeira do presidente da Casa? Não estou advogando nem um e nem outro, nenhum dos dois está correto.

Acha que há chance de se fazer uma reforma política?

Desde 2010 venho defendendo a necessidade dessa reforma. Mas diante de tudo que está ocorrendo insisto que só teremos mudança de estrutura se houver mudança de posturas. Com as posturas de hoje não teremos mudança de estrutura, até porque a reforma política proposta torna as estruturas políticas piores do que já são.

Dá para inverter? Mudar a estrutura para obrigar mudança de postura?

Não acredito. É preciso que haja uma mudança primeiro de postura, de fora pra dentro do Congresso, porque a Lei de Abuso de Autoridade só não foi aprovada por causa da mobilização da sociedade contra ela. A anistia para o caixa 2 só não foi aprovada pela mobilização da sociedade. A Ficha Limpa só foi aprovada pela mobilização da sociedade. Toda a legislação de direitos humanos, de direitos à saúde, de melhoria da educação, do meio ambiente, foi graças à mobilização da sociedade.

O que diz da reforma trabalhista recém-aprovada?

Conheço a proposta, o Brasil precisa de reformas. Não da forma como estão fazendo, numa abordagem puramente fiscal.

Tem alguma área do governo que a sra. veja com bons olhos? A área econômica tem algo tocado corretamente?

Antes a gente tinha o País indo para o abismo em alta velocidade. Agora temos pelo menos uma equipe econômica que está ziguezagueando pra não cair no abismo. São pessoas tecnicamente competentes, mas com uma abordagem política totalmente equivocada, dentro de uma visão puramente fiscal. Você faz um corte linear, por exemplo, em áreas que são estratégicas, como é que faz um corte na Polícia Federal? Os sacrifícios que estão sendo feitos são para a velha economia ou para a nova economia?

Com esse cobertor curto, o pé de quem ficaria de fora?

Acho que o que não deveria ficar de fora de jeito nenhum, que deveria ser cortado, é o pé da corrupção.

Nenhum comentário: