sábado, 15 de julho de 2017

Parecidas demais | Pablo Ortellado

- Folha de S. Paulo

Um desavisado pode achar que o PT tem uma agenda radicalmente diferente do governo Temer. O partido votou contra o teto dos gastos, tem feito oposição sistemática à reforma da Previdência e criticado a agenda do governo, como se fosse o reverso da sua. No entanto, pouco tempo atrás, o governo Dilma apresentou propostas semelhantes.

Como escapamos da oposição aparente entre as forças políticas —na prática tão parecidas— e criamos alternativas reais?

Em janeiro de 2016, o ex-ministro Nelson Barbosa anunciou a proposta de criar um teto para os gastos. A proposta era mais sofisticada que a de Temer, incluía um teto com banda e um sistema gradual de cortes em caso de deficit. Pode-se argumentar que as diferenças eram significativas, mas eram de grau e detalhe, não de substância.

A mesma coisa acontece com a Previdência. Dilma tinha anunciado uma reforma para elevar a idade dos que se aposentam, por meio do estabelecimento de idade mínima ou uma combinação entre idade e contribuição. A proposta de Temer era mais ampla, mas, depois da resistência que sofreu, deve ficar parecida com a da ex-presidente.

Se a diferença das propostas de Temer e Dilma é apenas de grau e detalhe, porque a retórica do PT faz crer que vivíamos um processo de expansão dos direitos e agora vivemos um "desmonte golpista"?

A explicação do petismo é que, ao contrário do PMDB, seus governos estão em disputa e podem avançar mais, sendo necessário engajamento para fazer prevalecer a posição progressista. O que teria faltado aos governos petistas é vontade e compromisso.

Essa falsa explicação esconde e coloca fora do alcance das pessoas comuns o problema dos constrangimentos da política: limites contábeis, imperativos da gestão macroeconômica, equilíbrio das forças que apoiam o governo e opções estratégicas entre diferentes agendas.

Ao fazer parecer que o que impede a adoção de políticas alternativas é falta de compromisso, e não os constrangimentos institucionais, a cidadania é deixada à margem dos processos decisórios e não pode exercer controle sobre as opções estratégicas da classe política. Ela fica ocupada, discutindo falsas questões.

Se quisermos influenciar a ação dos políticos, temos que parar de nos deixar enganar, entender os constrangimentos da política institucional e controlar os políticos no jogo da política real e não no da ilusão que nos vendem para nos distrair.

Quem sabe assim poderemos escapar da triste situação de escolher entre versões mais ou menos fortes das reformas liberais e conseguimos colocar sobre a mesa propostas factíveis das mudanças que tanto precisamos.

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