sexta-feira, 7 de julho de 2017

Quando o costume é roubar | Hélio Schwartsman

- Folha de S. Paulo

A lista de condenados na Lava Jato, que tem pouco mais de três anos, já chega a 63. Há muitos mais na fila —e mais graúdos também. Levantamento do Congresso em Foco mostra que 42 dos 81 senadores ou são investigados ou já viraram réus no STF (não só pela Lava Jato). A crer na delação dos irmãos Batistas, só a JBS comprou uns 2.000 políticos brasileiros. Se Cunha falar, como parece que será o caso, mais bombas devem aparecer.

Como a corrupção pode ser tão generalizada? Não existe mais ética no país? A etimologia aqui pode nos ajudar a entender o problema. Tanto a palavra "ética" quanto a "moral" têm origem em termos que significam "costume", "éthos" em grego e "mos" em latim. E isso ocorre porque, de modo geral, consideramos éticos os comportamentos que são adotados pela maioria e, portanto, estão inscritos em nossos costumes.


Se levarmos essa interpretação etimológica às últimas consequências, num mundo em que todos roubassem, roubar passaria a ser ético. Isso se dá porque a ética não resulta de um comando externo ditado por Deus, pelas leis ou pela razão, mas é um fenômeno social. Quando tentamos avaliar a adequação de um comportamento, olhamos para o lado para ver o que os próximos estão fazendo e nos ancoramos no que julgamos ser a atitude da maioria. Não vemos sociedades compostas só de ladrões porque sancionar o roubo de modo generalizado criaria tantas disfuncionalidades para o grupo que ele não se manteria estável por muito tempo.

Voltando ao Brasil, vivemos uma situação de choque de culturas. De um lado, políticos, com honrosas exceções, entendiam que aceitar caixa dois, agrados e mesmo propina fazia parte das regras do jogo. Mas, à medida que as instituições avançaram mais, procuradores, juízes e a própria população foram ficando mais rigorosos nessa matéria. É essa providencial mudança de cultura que está produzindo nossa crise política.

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