segunda-feira, 31 de julho de 2017

Reajustes dos servidores aprofundam a crise fiscal – Editorial | Valor Econômico

Diante das crescentes dificuldades fiscais, o governo federal agora sinaliza a possibilidade de enfrentar um difícil embate com um dos setores mais mobilizados da sociedade: os servidores públicos. A área econômica do governo, como antecipou o Valor PRO na quarta-feira, estuda a adoção de medidas como a suspensão temporária dos aumentos dados ao funcionalismo público federal e até o aumento da contribuição previdenciária de 11% para 14% nesse segmento. Deve apoiar, também, projetos que tramitam no Congresso para incluir, no limite do teto, os benefícios e vantagens recebidos por funcionários.

Em 2018, os reajustes salariais devem gerar impacto de R$ 7,12 bilhões nas contas do governo. Vale lembrar que esse efeito se dá sobre a base de despesa que já subiu R$ 12,39 bilhões, por causa dos reajustes que entraram em vigor neste ano. A despesa com pessoal ativo em 2017 supera os R$ 130 bilhões, segundo dados do ministério do Planejamento.

Note-se que o crescimento desse gasto, apenas por força da elevação dos salários no Executivo federal em 2017, é maior do que os R$ 10,4 bilhões que o governo espera arrecadar com a elevação do PIS/Cofins sobre combustíveis. Também é superior aos R$ 11 bilhões que o governo reduziu nos investimentos no primeiro semestre para viabilizar o cumprimento da meta fiscal, que, mesmo assim, continua na berlinda.

O governo defende a decisão sobre a concessão dos reajustes tomada no ano passado alegando que os acordos já estavam assinados pelo governo anterior e que o compromisso do Estado deveria ser cumprido. A justificativa, nobre por certo, apenas tangencia o real problema, que é a falta de capacidade do país bancar essa despesa por conta da penúria orçamentária.

Cabe ainda ressaltar que os compromissos ocorreram em um ambiente absolutamente fora do normal, no qual a fragilidade política crescente da gestão Dilma Rousseff foi aproveitada pelo funcionalismo para o sucesso de sua negociação. Ainda que se desconsidere esse aspecto político, o governo Michel Temer, ao assumir, teve como seu compromisso primordial a reorganização das contas públicas. E, com base nessa premissa, deveria ter suspendido o acordo já de início, esclarecendo que o momento das finanças do país não comportava sua efetivação.

É claro que lidar com insatisfação de funcionários é um problema para qualquer empresa e, no caso do governo, não é diferente. Mas quando uma dificuldade é honestamente explicada, há possibilidade de entendimento, se não da corporação atingida, com certeza da sociedade. O erro da falta de firmeza do governo Temer no ano passado já foi cometido e não há o que se fazer. A ideia de adiar o aumento previsto para 2018 é um paliativo que, dado o quadro complicado das contas públicas, merece ser considerado.

A forte queda da inflação é um elemento a mais no esforço de convencimento dos servidores federais. O prejuízo das bem remuneradas carreiras federais seria bem menor, já que neste ano estão tendo até um imprevisto ganho real de renda.

A discussão sobre aumentar a tributação previdenciária dos servidores também faz sentido. O governo tem cobrado essa medida dos Estados que estão em situação tão ruim ou pior do que a União como parte do ajuste fiscal desses entes. Poderia dar o exemplo. Mesmo que um eventual aumento também seja temporário, o debate precisa ser feito, já que o déficit previdenciário dos funcionários públicos (civis e militares) é muito alto: R$ 82,5 bilhões nos 12 meses encerrados até junho, de acordo com dados do Tesouro Nacional.

Mas o esforço fiscal não pode ser uma discussão restrita ao Poder Executivo. Os demais Poderes também precisam se sensibilizar quanto ao tema. A conjuntura econômica brasileira não comporta reajustes salariais para carreiras altamente remuneradas, como o Ministério Público Federal e o Supremo Tribunal Federal.

Ainda que o impacto orçamentário do aumento de 16,7% aprovado pelo Conselho Superior do Ministério Público seja proporcionalmente pequeno (R$ 116 milhões) diante da trilionária estrutura de gasto do país, o efeito simbólico é relevante. Além disso, o movimento, se for levado a cabo com aprovação pelo Congresso Nacional, deve gerar pressões de outras categorias. É uma espiral infindável na qual o Estado, que não dá conta de suas despesas atuais, fica cada vez mais fragilizado e pressionado a subir impostos.

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