domingo, 6 de agosto de 2017

As flechas de Janot e o risco da estudantada | Elio Gaspari

- O Globo

Há risco de Janot jogar o MPF numa estudantada. Apoiado no que há de pior na sua base parlamentar e valendo-se dos piores instrumentos de persuasão, Michel Temer mostrou a força de seu método e garantiu-se na cadeira de presidente. Confirmando sua ameaça de que “enquanto houver bambu, lá vai flecha", o procurador-geral, Rodrigo Janot, mira novamente em Temer e anuncia que vai apresentar novas denúncias contra ele.

Na flechada que a Câmara rejeitou, havia o áudio de uma conversa de Temer e o vídeo de Rodrigo Rocha Loures com sua mala preta. Faltou só um fundo musical. Os deputados acharam pouco e mandaram o caso ao arquivo.

O que a Procuradoria-Geral teria a apresentar nas novas denúncias? Talvez um depoimento, devidamente documentado, com as impressões digitais de Temer. Ainda assim, a maioria governista já mostrou do que é capaz. Só Janot sabe o que guarda no bambuzal, mas há uma distância entre sua frase de efeito e seu poder sobre o plenário da Câmara. A vontade de condenar Temer com provas convincentes para o público, porém consideradas insuficientes pela Câmara, lança sobre as ameaças de Janot o receio de que ele jogue o Ministério Público numa estudantada.

Estudantadas são aqueles gestos altruístas e destemidos que levam a juventude para as ruas.

Passam os anos, as pessoas envelhecem e criticam a rebeldia dos jovens, mas sempre lembram das próprias aventuras com doce nostalgia. Estudante com cabeça de velho é uma desgraça. Velho com cabeça de estudante é um perigo.

A última grande estudantada nacional também nasceu de uma votação decepcionante da Câmara. Em abril de 1984, a emenda constitucional que restabelecia as eleições diretas para presidente foi derrubada pelos deputados. Era o amargo desfecho da maior campanha popular da história do Brasil, apoiada por 85% da população (semana passada, 81% queriam que Temer fosse a julgamento).

No dia seguinte à derrota, com o brado de “a luta continua”, começou a estudantada. Criou-se um Comitê Suprapartidário Nacional para prosseguir na campanha. Pensou-se até numa monumental marcha sobre Brasília. Aos poucos, o movimento murchou. A eleição direta estava morta, e Tancredo Neves seria o candidato da oposição num pleito indireto, mas essa é outra história.

A situação de 2017 tem muitas diferenças em relação a 1984. Uma delas é que Janot sabe a consistência de suas próximas denúncias. Se as flechas forem boas, ótimo. Do contrário, se e quando se perceber que o bambu era curto, a estudantada ficará exposta, tendo prejudicado a confiabilidade da Operação Lava-Jato.

Barroso expõe a operação lama a jato
O ministro Luis Roberto Barroso pode vir a ser a novidade da temporada. Quando ele disse que está em curso uma operação para abafar a Lava-Jato, sabia do que falava. Não se trata apenas de impedir que os larápios apanhados sejam punidos, tratase de permitir que se continue a roubar. Só isso explica que Rodrigo Rocha Loures fosse buscar a mala preta na pizzaria Camelo. Barroso foi além: “Essas pessoas têm aliados importantes em toda parte, nos altos escalões da República, na imprensa e nos lugares onde a gente menos imagina".

Há dois meses, quando o Supremo Tribunal Federal cuidava da girafa da colaboração negociada pelo procurador Rodrigo Janot com os irmãos Batista, Barroso soltou um aviso: “Todos sabemos o caminho que isso vai tomar e, portanto, já estou me posicionando antes. Sou contra o que se quer fazer aqui lá na frente."

Foi o início de uma longa inimizade com o ministro Gilmar Mendes. O acordo aceito por Edson Fachin era uma girafa, mas o que se queria era fechar o zoológico, e Barroso ajudou a impedir que isso acontecesse

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