quinta-feira, 24 de agosto de 2017

Crise tucana abre espaço para mais candidaturas de centro – Editorial | Valor Econômico

As próximas eleições deveriam ser muito favoráveis ao PSDB, o vencedor dos pleitos nas grandes cidades do país em 2016. Só que não. O partido encontra-se em uma das maiores crises de seus 29 anos e seu candidato natural, o senador Aécio Neves, que arrebatou 51 milhões de votos na última disputa presidencial, foi atingido por uma saraivada de denúncias e está fora do páreo. É uma ironia da história que, depois de 14 anos em que a vida política do país esteve polarizada entre PT e PSDB, ambos enfrentem grandes dificuldades nas urnas.

O momento favorece o agrupamento de forças de centro-direita, depois que o governo petista de Dilma Rousseff arruinou a economia e retirou boa parte das chances de a esquerda voltar ao poder no curto prazo. Ao PSDB, que tem em seus quadros economistas liberais e apoio do empresariado, caberia mais uma vez o papel de aglutiná-las. Mas o partido está se esfacelando e sua proverbial indecisão está lhe custando caro agora - uma parte apoia Temer, a outra quer o rompimento. As angústias do PSDB nutrem as ambições de legendas que já foram dadas como mortas, como o Democratas, e das onipresentes, como o PMDB, de serem protagonistas em um jogo que parecia reservado aos tucanos.

Foi preciso uma crise aguda e o desgaste das tergiversações para manchar a imagem do partido. O PSDB continua um partido de quadros, sem bases populares. Sua identidade, ainda que difusa e conflituosa, foi delineada pela cúpula da legenda, e, nela, pelos caciques paulistas, como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e José Serra, que não dão mais as cartas. Na economia, o PSDB alinhou-se no campo liberal, com pragmatismo e sem radicalismos. Politicamente, depois de um período em que fundadores como Mario Covas e José Richa tinham princípios e prestígio, é um balaio de gatos sem rumo

O auge do PSDB foram os 8 anos da Presidência de Fernando Henrique. Longe do poder presidencial por 14 anos, o PSDB perdeu força, apesar de governar alguns dos mais ricos Estados da federação. Diante da escalada eleitoral petista, que lhe impôs quatro derrotas em sequência nas eleições presidenciais, o PSDB fez uma inarticulada e progressiva volta atrás em seu ideário. Os tucanos esconderam a bandeira das privatizações, agindo com um oportunismo eleitoral, que se acentuou depois.

Quando a correlação de forças voltou a se tornar favorável, com vitórias municipais e quase sucesso nas eleições presidenciais de 2014, os tucanos rasgaram seu programa para tentar chegar ao poder a qualquer custo. Ao votar pautas-bomba para explodir no colo de Dilma Rousseff, e ao dar apoio ao fim do fator previdenciário, por ele aprovado no governo de FHC, o PSDB mostrou que havia mudado qualitativamente - para pior.

Assim, o centro liberal está em disputa sem seu ocupante natural. O PSDB está sendo desafiado pelo DEM, que ainda quer cooptar dissidentes tucanos, irritados com o programa de TV partidário, que fez corajoso mea culpa genérico, mas sem força propositiva. Legendas, como o Novo, surgiram para aliar ideias liberais à renovação política, distinguindo-se de tucanos e Democratas, que encarnam a velha ordem política. Esse espaço centrista poderá ser ocupado por quem o PMDB, o fiel da balança, emprestar seus votos. Não à toa, DEM e PMDB já abriram os braços para a mais recente promessa tucana, o prefeito de São Paulo, João Doria, que pode não encontrar espaço para se candidatar pelo PSDB. Marina Silva, da Rede, defende também com ideias liberais na economia, com matizes à esquerda na política.

Se havia algum verniz social-democrata nas propostas tucanas, ele se gastou. Fernando Henrique e José Serra, que tinham essa tendência, perderam força - a hora é de Geraldo Alckmin e Doria, que empurram o partido politicamente para a direita. É parte da lógica das coisas que os dois favoritos à pré-candidatura tucana não estejam comprometidos com o governo de Michel Temer e tenham de abrir na raça o caminho para concorrer contra a vontade da cúpula.

O enfraquecimento da esquerda e a crise do principal rival, o tucanato, abre uma fenda para outsiders buscarem o Planalto. A gravidade da crise política e da descrença nos políticos, favorece alguém de fora das máquinas partidárias, mas, ao mesmo tempo, exige candidatos com experiência e um currículo mais ou menos limpo. A direita não deve surpreender, e a disputa se travará ao centro, apesar do previsível radicalismo da campanha.

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