terça-feira, 29 de agosto de 2017

Janot apoia Fux, e Maia reage

O procurador Rodrigo Janot concordou com o ministro Luiz Fux e disse que iniciativas do Congresso, após a Lava-Jato, “geraram perplexidade”. Presidente da Câmara, Rodrigo Maia reagiu.

Embate entre poderes

Janot endossa crítica de ministro do STF a ações do Congresso contra o Judiciário

Marco Grillo, Gabriel Cariello, Catarina Alencastro, Tatyane Mendes* Sérgio Roxo | O Globo

-RIO, BRASÍLIA E SÃO PAULO- Um dia após o ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), acusar o Congresso de tentar enfraquecer o Poder Judiciário, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, seguiu a mesma linha e afirmou que algumas iniciativas dos legisladores “geraram perplexidade”. Tanto o integrante da Corte quanto o chefe do Ministério Público Federal se referiram a iniciativas que teriam o objetivo de minar as investigações da Operação Lava-Jato.

Janot, assim como Fux, estabeleceu um paralelo com a reação de parlamentares italianos à Operação Mãos Limpas, que revelou escândalos de corrupção no sistema político na década de 1990. Para o procurador-geral, o contra-ataque é uma resposta ao avanço das apurações.

— A partir do momento que as investigações prosseguem, as reações acontecem. Toda ação corresponde a uma reação. Algumas iniciativas do Congresso geraram perplexidade mesmo. Uma delas foi a lei do abuso de autoridade. Esse é um projeto de lei em tramitação desde 2006, e esse projeto de lei caminhava, parava, caminhava, parava, mais ou menos (em paralelo) a algum andamento mais marcante das investigações — afirmou Janot, que participou do seminário E agora, Brasil?, organizado pelo GLOBO.

Ontem, em entrevista ao GLOBO, Fux já havia explorado o assunto e citado o ímpeto de retaliação à Justiça:

— O enfraquecimento do Judiciário é uma das fórmulas que se utilizaram para fulminar os resultados positivos da Operação Mãos Limpas, na Itália. E parece que isso está acontecendo agora no Brasil, em relação à Operação LavaJato. Enquanto nós estamos estudando as melhores formas de combater a corrupção, as melhores formas de investigação, o que se tem feito no Congresso é estudar como se nulificou, na Itália, todos os resultados positivos da Operação Mãos Limpas.

RODRIGO MAIA REAGE
Para o procurador-geral, a análise detalhada das iniciativas mostra um retrato similar ao que foi visto na Itália há pouco mais de duas décadas:

— Se a gente fizer um paralelo do que aconteceu na Itália e do que aconteceu aqui (no Brasil), boa parte do que se passou na Itália se passou ou está se passando aqui no Brasil. Basta olhar as iniciativas legislativas feitas na Itália e as iniciativas legislativas que são apresentadas aqui no Brasil — afirmou Janot.

As declarações de Fux não foram bem recebidas no Congresso. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou que não há pauta na Casa direcionada a qualquer dos poderes da República.

— No Brasil de hoje, nós estamos precisando de mais pessoas que tenham o equilíbrio no debate. É isso que tenho tentado fazer. Ter equilíbrio para dialogar e encontrar soluções com o Poder Executivo e com o Poder Judiciário. Não tenho nenhuma dúvida de que a gente vem avançando. Não tem nenhuma pauta da Câmara nos últimos meses com nenhum viés contra o poder A ou B. Não tem sido o papel da Câmara — afirmou Maia, que participou de um evento em São Paulo.

Líder da oposição no Senado, Humberto Costa (PT-PE) afirmou que não consegue enxergar em que medida o Congresso tenta enfraquecer o Judiciário.

— Não acredito que no Congresso haja essa intenção (de enfraquecer o Judiciário). No presente momento, aprovamos muitas leis que viabilizaram a existência da Lava-Jato e mecanismos fundamentais de investigação, como a delação premiada. Alguns alegam que a proposta da lei de abuso de autoridade representa uma forma de barrar o judiciário, mas não é assim — defendeu o senador.

Na entrevista, Fux também chamou de “indecência” a proposta do semidistritão, sistema no qual os parlamentares mais votados seriam eleitos, abandonando o atual modelo proporcional — no projeto em discussão, também está prevista a possibilidade de que os votos na legenda sejam distribuídos igualmente entre os candidatos de cada partido.

Para o líder do DEM na Câmara, Efraim Filho (PB), os parlamentares não poderiam se omitir com relação ao sistema pelo qual são eleitos deputados e vereadores, pois este é o principal vetor da corrupção e dos escândalos políticos.

— Parece que o interesse do ministro (Fux) é deixar as coisas como estão, mantendo esse modelo exaurido, esgotado, que provocou um círculo vicioso de corrupção, escândalo e prisão. É muito fácil fazer críticas e defender a permanência na zona de conforto. A pior resposta que a gente pode dar é a omissão. Isso seria a total falta de sintonia com a sociedade — afirmou Efraim.

O deputado Júlio Delgado (PSB-MG), no entanto, se posicionou ao lado do ministro nas críticas ao distritão.

— Felizmente, acho que tanto o distritão quanto o fundão (de R$ 3,6 bilhões) dançaram. Ninguém teve coragem de defender esses dois temas no plenário. O Fux tem razão: o Parlamento não tem credibilidade para fazer essas reformas — afirmou Delgado, que se referiu também ao fundo público que chegou a ser proposto para financiar as eleições.

Para Marco Antonio Teixeira, cientista político da Fundação Getúlio Vargas, os movimentos do Congresso são no sentido de defender seus representates ao avanço da Lava-Jato.

— A leitura do ministro Fux faz sentido por uma razão simples: o Congresso dá uma resposta no momento em que está sendo questionado pela Justiça. As medidas da reforma política estão muito mais preocupadas em garantir a permanência de quem já tem mandato, e fundos de financiamento para campanha, do que para melhorar a qualidade do processo eleitoral — afirma Marco Antônio Texeira, cientista político da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

PRISÃO DEPOIS DA SEGUNDA INSTÂNCIA
Na avaliação do cientista político Humberto Dantas, não só o Congresso, “mas o Executivo e alguns setores da sociedade também tentam impedir a Lava-Jato”.

— Principalmente com o questionamento da prisão logo após o julgamento em segunda instância — explica Dantas, que, por outro lado, questiona a autoridade de Fux para interferir no debate que trata do formato que o Congresso vem dando à proposta de reforma política.

— O papel de promover a reforma cabe ao Congresso, não ao judiciário. Fux tem o direito de emitir opinião como cidadão, mas não se pode considerar que ela é mais relevante (por ser ministro do Supremo) — completa. (*Estagiária sob supervisão de Maria Lima)

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