terça-feira, 29 de agosto de 2017

Por linhas tortas – Editorial | Folha de S. Paulo

A tentativa recorrente de sustentar a economia com estímulos ao consumo —da expansão do crédito a reajustes de benefícios sociais— acabou catalogada entre os muitos erros da administração petista. Não deixa de ser irônico que, agora, um certo retorno das famílias às compras venha em socorro do reformista Michel Temer (PMDB).

Nesta semana conheceremos os resultados do Produto Interno Bruto do segundo trimestre. Espera-se variação zero ou próxima disso; entretanto a expectativa de alta do consumo, após mais de dois anos de queda, embala o diagnóstico de que a descomunal recessão enfim começa a ficar para trás.

O país não está em condições de desprezar nenhum alento na atividade econômica. Cumpre notar, de todo modo, que a recuperação não segue o roteiro planejado.

Há um ano, quando apresentou pela primeira vez projeções detalhadas para o PIB de 2017, o Banco Central estimou crescimento impulsionado por expressiva retomada dos investimentos em obras, máquinas e fábricas.

Estes, porém, não se desviaram da sinistra tendência de encolhimento iniciada ao final de 2013, resultante da deterioração da confiança dos empresários. "Essa ordem está um pouco diferente", diz o presidente do BC, Ilan Goldfajn.


Bem diferente: enquanto o setor privado reluta em expandir negócios —e o claudicante ajuste nas contas do governo não inspira maior otimismo com o futuro—, famílias reagem à queda da inflação, ao corte dos juros e à liberação do FGTS.

Dirão os pragmáticos, em especial os da política, que é o bastante para alguma melhora do movimento do comércio, do emprego e dos humores nacionais. A experiência ensina, no entanto, que tal efeito tem alcance limitado.

Com a vexatória taxa de investimento brasileiro, na casa de 16% do PIB (almejam-se pelo menos 25%), um aumento contínuo do consumo não será acompanhado pela capacidade produtiva do país, gerando inflação e importações crescentes —como se viu no período que antecedeu o ciclo recessivo.

Há que comemorar, repita-se, qualquer respiro da economia neste momento. Igualmente, deve-se resistir à tentação de imaginar que se encontrou uma trilha segura.

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