quinta-feira, 10 de agosto de 2017

Um problema a menos | Míriam Leitão

- O Globo

A inflação de julho trouxe para o Banco Central um dilema e, para o país, uma certeza. O BC terá que saber como agir diante de uma taxa que, por estar abaixo do piso, mostra que os juros estão excessivos e deveriam cair mais. O país afasta, com o dado de julho, os temores de que a economia esteja em deflação. Houve um mês de deflação, em junho, mas foi fenômeno pontual. O país está é com inflação baixa.

A diferença entre uma coisa e outra é enorme. Inflação baixa é desejável, e neste ano é resultado de uma série de fatores positivos que vai do compromisso do Banco Central de manter a inflação na meta à safra recorde. Deflação é um problema econômico, porque levaria a um agravamento da recessão.

Ao contrário, os sinais são de melhora lenta e pontual, mas melhora. Pelo quarto mês consecutivo, o país teve criação líquida de vagas com carteira assinada. Isso é compatível com cenário de recuperação.

A inflação de julho ficou em 0,24%, subindo em relação ao mês de junho, em que a taxa foi –0,23%, mas confirmando a trajetória de queda da inflação em 12 meses, que agora está em 2,71%. O que pesou na inflação foi o aumento do combustível, o imposto sobre gasolina e diesel, e a alta da energia elétrica com a bandeira amarela.

Isso vai continuar pressionando agosto, porque a alta dos combustíveis, provocada pela elevação do PIS/Cofins, foi em parte capturada em julho, mas o maior peso será em agosto. Quanto à energia, ela saiu do amarelo e foi para bandeira vermelha.

A bandeira só fica amarela e depois vermelha quando há falta de energia e é preciso acionar as termelétricas que são mais caras. O fato de ter acontecido isso agora prova que o governo cometeu barbeiragem no fim do ano passado quando suspendeu o leilão de reserva alegando que havia energia de sobra no sistema. Energias mais baratas deixaram de ser ofertadas, e agora está sendo gerada de térmicas mais caras e poluentes. Outro erro do governo Temer na energia aconteceu ontem. O Ministério das Minas e Energia divulgou as diretrizes para um leilão para fornecimento de energia a partir de térmica a carvão, mais suja e mais cara. Isso é um espantoso retrocesso para um governo no qual o BNDES havia dito que não financiaria geração a carvão e a óleo combustível.

Atualmente, nada está comprometendo a trajetória da inflação no curto prazo, nem os aumentos de impostos, nem os erros na gestão da energia. A inflação de alimentos caiu pelo terceiro mês consecutivo. Esse foi um dos motivos da taxa mais benigna este ano. Para agosto, a previsão do professor Luiz Roberto Cunha, da PUC-Rio, é de que o índice ficará mais alto, em 0,5%, mas a inflação em 12 meses continuará em torno de 3%, bem abaixo do centro da meta. “Estamos caminhando para uma inflação anual um pouco acima de 3%.”

Com inflação baixinha, os juros podem cair, o impacto positivo na renda das famílias eleva um pouco o consumo, há uma série de consequências positivas. Ela sozinha não faz a recuperação da economia, mas ajuda bastante um quadro que tem perturbações demais.

O país continua mergulhado na crise política, continua atolado na crise fiscal, mas tem colhido alguns bons sinais em determinadas áreas como a do combate à inflação e ligeira melhora no desemprego. Ainda é um cenário devastador no mercado de trabalho, com 13,5 milhões de pessoas procurando emprego e sem encontrar. Mas a comparação entre os dados da criação de emprego este ano e os do ano anterior mostra que está, sim, havendo uma melhora.

Mesmo a economia melhorando, a crise fiscal permanece muito grave e não há horizonte para o equilíbrio das contas públicas. Nos próximos dias, o governo vai anunciar uma mudança da meta fiscal, para abrigar um déficit maior do que os R$ 139 bilhões já aprovados, e até o fim de agosto terá que dizer qual é o rombo do ano que vem. Ainda que a inflação não tenha previsão de alta a curto e médio prazos, a conjuntura econômica é repleta de temores: a crise fiscal permanece muito grave, a dívida pública tem tido um crescimento assustador, o desemprego cai muito lentamente. A inflação baixa é um problema a menos. O que é bom, mas não é suficiente.

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