sexta-feira, 29 de setembro de 2017

Cláusula de barreira pode atingir 10 partidos

Por Raphael Di Cunto, Marcelo Ribeiro e Ricardo Mendonça | Valor Econômico

BRASÍLIA E SÃO PAULO - A proposta de emenda à Constituição (PEC) aprovada pela Câmara na quarta-feira para instituir uma cláusula de desempenho para os partidos poderia ter reduzido de 28 para 18 o número de legendas com representação no Congresso, caso as regras estivessem em vigor nas eleições de 2014, segundo cálculos da consultoria legislativa da Casa.

A população elegeu deputados de 28 partidos para a Câmara nesta legislatura, a mais fragmentada da história, e atualmente são 25 siglas, algumas criadas recentemente, como o Rede, da ex-ministra de Meio Ambiente Marina Silva. No Senado, a legislatura começou com 16 partidos e hoje são 17 siglas, além de dois senadores sem filiação.

Há pelo menos mais um partido que diz contar com o número de assinaturas suficientes para obter o registro na Justiça Eleitoral e poder disputar eleições: o Muda Brasil, articulado pelo ex-deputado federal Valdemar Costa Neto, ex-presidente do PR e condenado no mensalão. Para disputar a eleição de 2018, o registro precisa ser aprovado até a próxima semana.

A PEC estabelece que os partidos precisam de apoio mínimo de 1,5% entre os eleitores, distribuídos em no mínimo 1% dos votos em nove Estados, para terem direito ao fundo partidário, que este ano distribuirá R$ 860 milhões, e à propaganda eleitoral no rádio e TV. Os que não superarem a cláusula não serão extintos, mas seus deputados poderão mudar para outras siglas sem risco de perderem o mandato por infidelidade.

Se replicado o resultado da eleição de 2014 para estas regras, partidos como o PSL, PTdoB (hoje Avante), PRP, PCB, PMN, PPL, PSTU e PHS ficariam abaixo da cláusula. Os sempre presidenciáveis Levy Fidelix, do PRTB, e José Maria Eymael, do PSDC, não estariam entre eles e perderiam seu pedaço do fundo partidário e da propaganda na TV e rádio.

Esse percentual de apoio aumentará 0,5% a cada quatro anos até 2030, quando chegará a 3% dos votos válidos nacionalmente e 2% em nove Estados ou 15 deputados federais em um terço do país. Se essa regra mais dura fosse aplicada em 2014, restariam 12 partidos: PMDB, PT, PSDB, PP, PR, PSD, PSB, DEM, PRB, PDT e PTB, pelos critérios de voto, e SD, pelos eleitos. Legendas mais tradicionais, como PCdoB, PPS e PV, ficariam de fora, assim como o Psol.

Diante da perspectiva de que a proposta de reforma política da qual foi relatora será aprovada na próxima semana no Senado, a deputada Shéridan (PSDB-RR) negou que, com seu texto, o princípio da pluralidade seja tolhido. Na avaliação dela, o ponto sobre a cláusula de desempenho é "restritivo, porém não é eliminatório". "Os partidos continuam sendo constituídos. O que o projeto estabelece é que passarão a existir critérios mínimos para que eles tenham acesso ao dinheiro e ao tempo de televisão", disse Shéridan.

Um dos partidos que mais corre risco com a cláusula de desempenho é o Psol, sigla pequena de esquerda que nasceu a partir de uma dissidência do PT. Na última eleição, o Psol obteve 1,8% dos votos nacionais nas eleições para a Câmara, o que o colocaria ligeiramente acima da barreira de 1,5% recém-aprovada pelos deputados.

Anos atrás, foi o Psol, junto com o PCdoB, que ingressou com uma reclamação no Supremo Tribunal Federal (STF) contra a cláusula de desempenho que havia sido aprovada pelo Congresso nos anos 90 e estava prestes a entrar em vigor. O STF acabou aceitando os argumentos dos dois partidos e cancelou a norma, decisão que é criticada até hoje por analistas políticos.

Hoje, o Psol continua vendo a regra com desconfiança. Mas não deve recorrer novamente. "Votamos contra, mas essa cláusula aprovada agora é menos gravosa que a do projeto original", diz o deputado Ivan Valente (Psol-SP).

No partido, o entendimento corrente é crítico à proliferação de siglas. Mas a solução mais adequada, conforme Valente, seria a adoção imediata da proibição de coligação em eleição proporcional. A norma também foi aprovada, mas para vigorar apenas a partir de 2020. "Isso, sim, seria um grande ganho. Se você acabar com isso [coligação em eleição proporcional], você estrangula os partidos de aluguel. Porque aí cria-se uma situação em que eles valem nada. Mas adiaram essa solução."

A regra não aprovada da federação de partidos, segundo o deputado, poderia eventualmente até ajudar o Psol no caso de um mau resultado eleitoral. "Mas o partido nunca acreditou nessa solução, não era uma batalha nossa", conclui.

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