segunda-feira, 18 de setembro de 2017

O remédio é veneno – Editorial | O Globo

Depois que o estatismo e os gastos causaram a crise, usar as mesmas políticas é um desatino

Parte do debate econômico brasileiro costuma ser contaminada por projetos ideológicos, o que impede que argumentos sejam ouvidos, que a própria realidade exerça seu papel pedagógico. Neste período de grande turbulência, iniciado de forma mais nítida em 2014, ano da campanha de reeleição de Dilma, e que vem até hoje, em que a economia se recupera, mas não na velocidade desejada, fica exposta de maneira nítida esta característica. O esgarçamento da situação política e econômica aguçou o Fla-Flu na sociedade. Mas, em algum momento, verdades indiscutíveis se imporão. Entende-se, porém, que a militância, de perfil religioso, messiânico e sectário — à direita e à esquerda —, seja refratária a reconhecer erros.

A presidente Dilma cometeu estelionato eleitoral ao se reeleger com uma proposta estatista, mas já sabendo que esta via era equivocada. Tanto que ela sofreu impeachment — ao descumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal e ainda manipular as contas públicas —, enquanto ministros seus buscavam aplicar um arremedo de ajuste fiscal, termo demonizado por ela e o PT.

Seu próprio governo, pautado por teorias heterodoxas que não funcionam mesmo repetidas inúmeras vezes — não é por falta de ensaio que falham, mas por equívocos estruturais —, reconhecera que precisava arrumar as contas públicas, depois de praticado o estelionato. A característica religiosa e sectária da militância fica exposta quando defende curar a recessão com o mesmo veneno que a provocou: mais gastos. Tudo é questão de crença. Pois o desregramento de despesas, principalmente as engessadas — previdência, outros gastos ditos sociais, salários do funcionalismo —, o aumento da dívida pública também para turbinar investimentos subsidiados, somados à concessão descuidada de incentivos tributários ao consumo, com as famílias já endividadas, corroeram a confiança dos empresários e não estimularam o consumo.

A economia, então, desacelerou, investimentos e consumo se retraíram, enquanto a dívida e o déficit públicos, em relação ao PIB, decolaram. A nota de risco de crédito do país caiu, foi para a faixa de “lixo” (junk). Estima-se que do final do último governo Lula ao impeachment de Dilma foram perdidos dez anos de boas práticas fiscais e monetárias. A década perdida do PT.

O estrago é mastodôntico: o déficit público total (incluindo os juros) está na faixa de 8%a 9% do PIB (3%é o máximo permitido na zona do euro); e a dívida escala em direção a 90% do PIB. Medidas sensatas tomadas pela equipe econômica do governo Temer, em direção oposta às de Dilma, cortaram a espinha dorsal da inflação (em pouco mais de um ano, ela caiu de dois dígitos para abaixo de 4%),e a economia já ensaia alguma recuperação, depois que o PIB perdeu aproximadamente 8% em dois anos, queda histórica.

Sem a reforma da Previdência, contra a qual PT, aliados e populistas de direita estão unidos, não se irá longe, pois as contas públicas continuarão em desequilíbrio estrutural. Tudo devido a visões estatistas. Não entenderam o passado, não percebem o presente.

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