domingo, 1 de outubro de 2017

A imagem da transição | Luiz Carlos Azedo

O presidente da República é prisioneiro de uma pauta negativa: a Operação Lava-Jato, na qual o governo está muito enredado

Uma das características da atual conjuntura é o descolamento da economia da imagem do governo Temer. Enquanto o país deixa para trás a recessão, com indicadores econômicos cada vez mais positivos, os índices de aprovação do presidente Michel Temer não dão o menor sinal de recuperação, pelo contrário, se deterioraram ainda mais. Entretanto, é inegável que as medidas adotadas pelo governo reverteram o curso dramático da economia — na administração de Dilma Rousseff, de 2013 a 2016, passamos da estagnação para a recessão, com inflação altíssima e desemprego acima de 10%.

A recessão teve um peso enorme no impeachment de Dilma Rousseff, mas o inverso não está sendo verdadeiro para o governo Temer. A inflação deve ficar abaixo dos 3%, os juros podem cair abaixo dos 7%, mas nada disso rende aplausos populares. Parece que a equipe econômica liderada pelo ministro Henrique Meirelles (Fazenda) faz parte de outro governo. Como a política monetária foi blindada, porém, há que se admitir que esses resultados positivos não seriam possíveis sem as reformas implementadas pelo Palácio do Planalto.

Mudanças na lei de conteúdo nacional, retomada dos leilões do pré-sal, liberalização dos preços dos combustíveis e redução de tarifas de importação de bens de capital jogaram um papel decisivo na construção do novo ambiente econômico e a mudança da taxa de juros cobrada pelo BNDES. A reforma trabalhista, a nova lei da terceirização e o teto constitucional para expansão dos gastos públicos completam o cenário virtuoso, em que pese a meta de deficit fiscal de R$ 159 bilhões e o rombo na Previdência, cuja reforma empacou.

Nada disso, porém, alterou a avaliação do governo. Temer está com 77% de ruim e péssimo, 16% de regular e apenas 3% de bom e ótimo. Em situações como essa, o bode expiatório costuma ser a política de comunicação do governo. Mas o beabá da relação com a mídia e do marketing vem sendo observado: o governo faz campanhas publicitárias frequentes, o presidente mantém uma agenda de aparições públicas diárias e concede frequentes entrevistas. Não consegue, apesar disso, construir uma agenda positiva. Na verdade, o presidente da República é prisioneiro de uma pauta negativa: a Operação Lava-Jato, na qual o governo está muito enredado.

Os aliados de Temer tentaram fazer o feitiço virar contra o feiticeiro, ao articular uma “frente ampla” contra os procuradores e magistrados que atuam na Lava-Jato, principalmente, o ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot. Mas a estratégia começa a ser esvaziada, porque a nova procuradora-geral, Raquel Dodge, assumiu o cargo com temperança e suavidade. O problema é que Janot saiu de cena, mas as denúncias, não. Os rumos da Operação Lava-Jato dependem do Supremo Tribunal Federal (STF). É briga de cachorro grande.

Temer articula a rejeição da segunda denúncia do ex-procurador-geral pela Câmara e saiu na frente ao conseguir a indicação do veterano deputado Bonifácio de Andrada (PSDB-MG) para relator do processo, um passo importante para antecipar a votação, a qual precisa do apoio de apenas 172 deputados para rejeitá-la. Na primeira denúncia, amealhou 263 votos; espera ter mais apoio agora que a poeira baixou.

Caso Aécio
Uma decisão surpreendente da Primeira Turma do STF consolidou a “frente ampla”: o afastamento do senador Aécio Neves (PSDB-MG) do cargo, entre outras “medidas cautelares”, como a proibição de sair de casa à noite. PMDB, PT e PSDB se uniram em defesa de Aécio, o que reforçou as posições de Temer na Câmara. O problema é que a reação dos políticos gerou um choque entre o Congresso e o Supremo, cujas consequências podem ser mais graves. Na Câmara, a rejeição da denúncia contra Temer faz parte das regras do jogo: a investigação do presidente da República será congelada até o fim do mandato, como na primeira denúncia. A melhora do ambiente econômico ajuda a justificar essa decisão. No Senado, porém, a situação se complicou, porque a rejeição de “medidas cautelares” não está prevista na Constituição.

Os senadores avaliam: “quem pode mais pode menos”, ou seja, se podem revogar a prisão de um dos pares com base na Constituição, por analogia, podem revogar “medidas cautelares” previstas no Código de Processo Penal. Essa exegese, porém, cabe ao Supremo, que vai deliberar sobre o assunto em 11 de outubro. Alguns senadores querem se antecipar e criar um fato consumado, o que pode afrontar o Supremo e provocar uma crise institucional. Não é preciso ser marqueteiro para concluir que essa agenda é péssima para o Palácio do Planalto e aliados. O que puxa para baixo a imagem de Temer é a Lava-Jato.

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