quarta-feira, 29 de novembro de 2017

Centro se articula para tentar romper polarização eleitoral: Editorial/Valor Econômico

A dez meses das eleições, o cenário da disputa presidencial é de muito baixa previsibilidade e continuará assim até que se dissipem as dúvidas sobre se o primeiro colocado nas pesquisas, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, poderá ou não concorrer e o quadro de alianças políticas se consolide. O segundo colocado, Jair Bolsonaro, depende vitalmente da candidatura de Lula para angariar votos, tarefa que lhe será mais facilitada se o centro do espectro político continuar fragmentado. Sem Lula, os candidatos de centro, mesmo divididos, podem aspirar à vitória. Com Lula no páreo, há boas chances de o cenário de polarização prosperar.

Vários movimentos preparatórios foram feitos nos últimos dias. O Planalto ventilou que não descarta a candidatura de Michel Temer e acredita que a recuperação da economia pode levantar do chão, aonde está, a popularidade do presidente. É difícil que Temer se candidate, mas a cogitação tem outro significado, maior. Temer e o PMDB têm, pelos recursos do fundo partidário e pelo tempo de TV na propaganda eleitoral - o segundo maior -, grande capacidade de influir nos resultados. Como usarão esse poder começa a se esboçar agora.

Depois do processo agudo de fragmentação partidária, coube a raposas do PMDB, como o ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), organizar o "centrão", um bando de siglas à cata de oportunidades. O "centrão" se reforçou quando o Planalto passou a abrigar um presidente enfraquecido por denúncias de corrupção que, por duas vezes, teve de pedir à Câmara que não fosse afastado. PMDB e centrão estão juntos no plano de mudar o centro de gravidade eleitoral a seu favor.

Uma candidatura construída no Planalto ou que tenha seu apoio pode atrair legendas que ainda não têm rumo claro. O atual presidente da Câmara, Rodrigo Maia (RJ), está sendo cativado por Temer, depois de ameaças de rompimento. O DEM tem dividendos eleitorais consideráveis a colher se mantiver aliança com o PSDB, mas também se deslocar-se para o lado do PMDB.

O dilema de se manter ou sair da órbita pemedebista é mais angustiante para o PSDB e dilacera as hostes tucanas, sempre propensas à indecisão. O candidato mais forte, Geraldo Alckmin, terá de assumir a presidência do partido contra a vontade, para evitar um cisma verdadeiro. O fato de ser o mais experiente dos pré-candidatos do PSDB pesa muito na disputa interna, mas não tanto na arena externa, se a raia do centro estiver congestionada. João Doria, Luciano Huck e Henrique Meirelles, embora distintos, concorrem na mesma faixa do eleitorado, dividindo votos, o contrário do que é preciso para que uma candidatura reformista se firme como alternativa à polarização.

Luciano Huck disse que não vai concorrer e o futuro de Doria é uma incógnita: pode tentar pleitear, em piores condições, candidatura a governador do Estado, ou tentar a Presidência pelo PMDB, algo que a sua perda de ímpeto nas pesquisas dificulta bastante. Alckmin, que era pelo afastamento do PSDB do governo, agora diz que a legenda tem de fugir do "isolamento", necessidade que o Planalto já percebeu e deve explorar.

Sem acordo com o PMDB, Alckmin pode ter como concorrente nas urnas o ex-tucano Henrique Meirelles que, como o governador paulista, é hábil em agir nos bastidores e cuja sabedoria política não pode ser desprezada. Se o desempenho da economia melhorar, como se prevê, os ventos ajudam Meirelles, um dos responsáveis por isso, e deixam em condição mais difícil um candidato oposicionista moderado como Alckmin, cujo partido até ontem estava de mãos dadas com Temer. Nessas condições, os pontos que Alckmin não ganhar nas pesquisas contam a favor de Meirelles. E Alckmin tem baixo score nelas até agora.

A rejeição aos políticos abre um bom espaço para outsiders, mas as regras eleitorais os obrigarão a ser acolhidos em alguma máquina partidária influente. As redes sociais ganharam importância, ainda que talvez não sejam suficientes para romper o esquema partidário. Marina Silva, da Rede, por exemplo, terá 12 segundos de propaganda em cada um dos dois blocos diários e Joaquim Barbosa, caso aceite concorrer pelo PSB, 45 segundos.

A esquerda está enfraquecida, o centro se desintegra e a direita sozinha não vai a parte alguma. O "novo" terá de romper a couraça de um sistema que já não funciona, mas que resiste a mudanças. Prevalece a incerteza.

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