quarta-feira, 29 de novembro de 2017

Luiz Carlos Azedo: O choque de Alckmin

- Correio Braziliense

A deliberada distância do tucano em relação ao presidente Temer talvez seja uma tentativa de facilitar a aproximação com o eleitor, mas abre o flanco para outro projeto de centro

Ao mesmo tempo que o PSDB lança um documento no qual propõe uma espécie de novo “choque de capitalismo”, para citar a expressão usada pelo falecido governador Mario Covas na campanha eleitoral de 1989, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, ontem, deixou muito claro que defende a saída imediata do PSDB do governo Temer. Se fosse feita há uma semana, a declaração seria parte do tiroteio tucano; agora, não. Candidato único a presidente da legenda, com as desistências do governador de Goiás, Marconi Perilo, e do senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), soa como uma espécie de aviso aos navegantes do rumo que tomará campanha eleitoral, mantendo distância regulamentar do presidente Michel Temer nas eleições de 2018.

Na campanha eleitoral de 1989, as teses de Covas causaram perplexidade no campo da centro-esquerda, que foi às urnas profundamente dividida, com seus principais partidos buscando a própria identidade. Numa eleição com 22 candidatos, Leonel Brizola (PDT), Luiz Inácio Lula da Silva (PTB), Roberto Freire (PCB) e até mesmo Ulysses Guimarães (PMDB) ironizaram as posições de Covas, que acabaram abduzidas por Collor de Mello (PRN), com um discurso forte de abertura da economia, reformas liberais e combate às mordomias da alta burocracia e dos políticos. A radicalização política levou Lula e Collor ao segundo turno, dois candidatos que poderiam ser chamados de outsiders. Ao contrário do que se imaginava, as teses de Covas eram até modestas diante das demandas da sociedade.

De certa forma, o documento do PSDB, intitulado “O Brasil que queremos”, faz um contraponto ao programa “Ponte para o futuro”, lançado pelo PMDB às vésperas do impeachment de Dilma Rousseff e que serve de norte político para as reformas iniciadas pelo presidente Temer. A cúpula tucana defende que o Estado brasileiro deixe de ser “vetor de distribuição de privilégios e concentração de renda nas mãos de ricos e poderosos”. E propõe o fim do “capitalismo de compadrio”, com critérios e metas para concessão de subsídios, renúncias fiscais e benefícios tributários, além do acompanhamento periódico do orçamento público. “Em particular, o acesso dos mais ricos a serviços públicos gratuitos precisa ser reavaliado”. É um contraponto às práticas do PMDB e de outros aliados no governo.

O PSDB argumenta que o crescimento econômico é condição necessária para a redução das desigualdades e a geração de riqueza e renda — “Sem crescimento, os demais objetivos sociais e políticos ficam inviabilizados” —, mas fica no meio do caminho quanto à questão da redução do tamanho do Estado: “Nem máximo, nem mínimo, pois esse é um falso dilema, o Estado eficiente, musculoso, deve também recuperar sua capacidade de regulação, garantindo melhores serviços aos usuários e a necessária segurança jurídica para a realização dos negócios”. Coordenado pelo presidente do Instituto Teotônio Vilela, José Aníbal, o texto afirma que o capitalismo é o sistema que “gera melhores condições” para a conquista de qualidade de vida, porém, manéêm o viés social-democrata ao fazer a ressalva de que o livre mercado, por si só, “não é capaz de assegurar distribuição mais equânime das riquezas produzidas e, assim, superar as desigualdades e a pobreza”.

Empecilho
No ninho tucano, Perilo e Tasso desistiram do comando do PMDB para viabilizar a candidatura de Alckmin, pondo um fim à disputa interna pelo controle da legenda, o que é um desfecho lógico diante da relação de forças internas. Ontem, ao inaugurar quatro novos andares do Hospital de Criança de Ribeirão Preto, Alckmin ensaiou o discurso para as eleições de 2018: “Nós precisamos tirar esse Estado pesado, ineficiente, das costas dos trabalhadores e dos empreendedores brasileiros. Não cabe no PIB o tamanho desse Estado que hoje acaba sendo um empecilho ao crescimento do país. De outro lado, um Estado que funcione, que seja eficiente, que tenha boas políticas públicas, que atenda aqueles que mais necessitem e que promova o desenvolvimento regional”, disse.

Aparentemente, apostará numa política econômica mais austera e liberal para consolidar sua candidatura, que vem sendo bem-sucedida internamente, porém, do ponto de vista eleitoral, não se revelou robusta o suficiente para se impor às demais forças do chamado campo democrático. A deliberada distância em relação ao presidente Temer talvez seja uma tentativa de facilitar a aproximação com o eleitor, mas abre o flanco para o grupo palaciano articular outro projeto, no qual a centralidade seja do PMDB e não dos tucanos.

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