quinta-feira, 9 de novembro de 2017

Maria Cristina Fernandes: O sarrafo de Tasso

- Valor Econômico

Com protagonismo tucano, aliança de 2018 estaria mantida

Foi uma ofensiva em três atos. Começou no domingo com o artigo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, foi seguida pelo manifesto dos economistas tucanos e teve seu clímax ontem com o lançamento da candidatura do senador Tasso Jereissati à presidência do partido. A primeira resposta dos governistas ao início do desembarque do PSDB foi a ameaça de convocação do ministro das Cidades, Bruno Araújo, acusado pelos pemedebistas de privilegiar seu Estado natal (Pernambuco) e o de Geraldo Alckmin (São Paulo), com obras do Minha Casa Minha Vida.

O rompimento também é a senha que aliados de Michel Temer aguardavam para por na rua candidaturas que o presidente possa chamar de suas, como a do presidente da Câmara, Rodrigo Maia, e do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles. Mas Tasso Jereissati não dá por desfeita a perspectiva de uma aliança eleitoral para 2018. A esse amálgama, que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso um dia chamou de vanguarda do atraso, o senador dá uma definição mais bem comportada - "Numa eleição tudo é possível desde que o protagonismo seja do PSDB".

A ofensiva tucana parte do pressuposto de que o impulso eleitoral é de rejeição à política tradicional. Luiz Inácio Lula da Silva e Jair Bolsonaro seriam seus filhos diletos e só haveria espaço para mais um se o terceiro rebento vier a mostrar repúdio a tudo o que está aí. Foi isso que moveu o mea culpa do programa de TV do partido em agosto e conduz a candidatura de Tasso. Resguardados, naturalmente, mandato e foro do senador Aécio Neves.

O PSDB partiu para o tudo ou nada e Tasso parece disposto a nadar contra a corrente para mostrar que é possível romper com aliados históricos bem aquinhoados no poder sem cair na segunda vala. Das arapucas armadas no caminho dos tucanos, a mais ardilosa é a ameaça de concorrência dos partidos que gravitam no entorno do Palácio do Planalto. Nem Maia, nem Meirelles parecem ter futuro eleitoral, mas embaçam o meio de campo da candidatura do governador paulista que custa a chegar a dois dígitos. "Ninguém tem nome forte", reconhece Tasso, "mas o PSDB pelo menos está fazendo um esforço de se conectar com a população".

Das medidas que julga capazes de reverter a rejeição ao partido está a redação de um novo código de ética e a contratação de um profissional de compliance. Um executivo do gênero não teria como se impor a parlamentares ou governantes eleitos pelo voto popular, mas Tasso diz que sua função seria a de denunciar à Executiva do partido as irregularidades que vier a constatar.

Para gerir este programa de compliance, o senador do PSDB cearense chamou o deputado paulista Carlos Sampaio que tem no pedido de recontagem de votos das eleições de 2014 o capítulo mais importante de sua biografia. Como a governança tucana quer olhar para frente, não vai estrear pelas estripulias do candidato derrotado, Aécio Neves. No seu artigo, o ex-presidente apela publicamente para que o senador mineiro seja poupado.

O PSDB já tem assegurado o apoio do PTB, mas o senador diz que ainda é cedo para definir os critérios da política de alianças tucana. Esnobados pelos tucanos, os governistas não vão deixar barato. A gestão Temer está na medida para seus propósitos. Sem força para exigir a votação de medidas impopulares, o governo tem prazo de validade a cumprir e uma anistia a ser arrancada do Congresso. Até o PAC ressuscitou, para a alegria geral de seus aliados. Por que os partidos governistas abandonariam o Planalto num momento como este para ir atrás de uma candidatura tucana que ainda está por mostrar sua viabilidade?

"Todos os partidos terão que passar por um processo de recriação", diz Tasso, que rejeita a ameaça de isolamento do PSDB e cita a desconexão generalizada com o enunciado da idílica infância tucana, de agremiações que permaneçam longe das benesses do poder, mas perto do pulsar das ruas.

O sinal é trocado e não há perspectivas que se inverta. Os parlamentares já se assenhoraram de normas eleitorais que sugerem baixa renovação para enfrentar as incertezas de 2018. Mas a campanha de vacinação não para por aí. A liberação dos jogos de azar facilitaria a vida de quem achou pouco um fundo eleitoral de R$ 2 bilhões. Se as malas de dinheiro de Rodrigo Rocha Loures e Geddel Vieira Lima passearam à sombra do Coaf, do BC e da Receita, quem impedirá que cassinos e lavanderias funcionem sob o mesmo teto?

A baixa renovação do próximo Congresso pode vir a ameaçar tempos difíceis para quem quer que assuma o poder em 2019. Para este enfrentamento, o senador tucano preconiza a elaboração de um programa de governo a ser abertamente discutido com o eleitor, sem subterfúgios ou mistificações. A base deste programa é o manifesto elaborado pelos economistas do partido e lançado na segunda feira em apoio à candidatura de Tasso à presidência do PSDB. A ex-diretora do BNDES, Elena Landau, uma das cinco signatárias do documento, diz que o acúmulo de promessas cumpridas e desvirtuadas das últimas disputas obriga o partido a ser o mais transparente possível para não ser acusado de estelionato eleitoral.

É um texto mais liberal que o "Ponte para o futuro" do PMDB. Diz que o governo tem que prover educação e saúde de qualidade mas que, para isso, não precisa ter escolas ou hospitais nem precisa contratar professores ou médicos, e sim adotar indicadores de eficiência na gestão dos recursos dessas áreas. O "programa radical de privatização" anunciado no texto não necessariamente incluiria a Petrobras, explica Tasso. "Mas há 300 ou 400 empresas estatais hoje sem eficiência e que viraram cabides de emprego".

No seu trecho mais provocativo, o manifesto anuncia como tarefa urgente o fim da captura política das agências reguladoras. Presidente da Comissão de Assuntos Econômicos do Senado, Tasso é quem comanda a sabatina dos diretores das autarquias. Foi sob sua presidência que a CAE assistiu a uma indicada para a superintendência do Cade ser trocada pelo Palácio do Planalto, às vésperas da sabatina, por um indicado do centrão. A manobra é um exemplo da ordem com a qual o senador tucano se diz disposto a romper, a de liberais que só sobrevivem à sombra do poder. Não surpreende o alvoroço em que se encontram o PSDB e seus aliados.

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