terça-feira, 7 de novembro de 2017

Pressão por alta de juros testará Powell no comando do Fed – Editorial: Valor Econômico

Para os padrões extravagantes das decisões de Donald Trump a escolha de Jerome Powell para chefiar o Federal Reserve foi recebida sem surpresa ou polêmicas pelos investidores. Rico, moderado, republicano com bom trânsito no partido, ele tem seguido Janet Yellen nas principais decisões de política monetária e apoiado a estratégia bastante gradual de elevação dos juros e de redução da montanha de US$ 4,5 trilhões acumulados no balanço do Fed para fazer frente à Grande Recessão iniciada em 2008. Só a revanche política pode explicar por que, se era para manter a continuidade de orientação do banco, Yellen não foi convidada a permanecer no comando do banco central mais poderoso do mundo.

Com expectativas cada vez mais baixas diante dos atos de Trump, os mercados praticamente não se moveram depois da indicação, um sinal de que foram rejeitados os principais "finalistas" da lista do presidente que poderiam provocar terremotos financeiros - Kevin Marsh e John Taylor. Críticos do relaxamento monetário, eles possivelmente imprimiriam uma cadência altista mais rápida nos juros. Para Taylor, pai da regra que leva seu nome, os juros já estariam acima dos 2% se presidisse o Fed.

Com passagens pelo Tesouro e por um dos maiores fundos de private equity do mundo, o Carlyle, Powell tem experiência prática de mercado e sabe ganhar dinheiro - possui fortuna de US$ 55 milhões. É advogado, não economista, e não tem títulos acadêmicos a apresentar nessa área. O último não economista a presidir o Fed, William Miller, teve uma trajetória infeliz. Deixou o Fed em 1979, após ter sido derrotado em votação na qual se opôs a uma alta dos juros que a maioria do board julgava necessária.

Há grandes desafios à frente de Powell. Um deles é a desova dos trilhões acumulados no balanço do Fed, situação sem precedentes e território desconhecido para o banco. Além disso, com a economia global em recuperação, os EUA em boa forma (avanço de 3% no 3º trimestre), e sincronia com os países emergentes, o ambiente para a existência de taxas de juros muito baixas está ficando para trás. Apesar de a inflação estar ainda baixa e distante das metas dos bancos centrais, a tendência é de alta dos juros.

Nos discursos de Powell como membro do Fed delineiam-se alguns diagnósticos e desafios. Ele vê nessa época de transição monetária o risco de que pequenas surpresas possam levar a reações abruptas e destrutivas por parte dos mercados. Há algum tempo se formam nos mercados condições que propiciam uma mudança rápida de direção. Os ativos estão caros, especialmente ações, os indicadores de risco permanecem muito baixos e a alavancagem tem sido estimulada por juros irrisórios e enorme liquidez. O Fed não costuma se mexer para "estourar" bolhas de preços de ativos e essa atitude cautelosa deve ser mantida por Powell.

O que pode exigir resposta mais imediata do Fed sob Powell são os efeitos do pacote de redução de impostos para empresas de Trump, que deve produzir um déficit adicional de US$ 1,5 trilhão em dez anos, e o programa de estímulos a investimentos na infraestrutura. Acelerar a taxa de crescimento, objetivo claro do governo, quando a economia se encontra em pleno emprego pode elevar a inflação e obrigar o Fed a rever seu cronograma de aumento dos juros. Até hoje, quem apostou que o Fed estava atrás da curva errou. Mas tudo pode ser diferente de uma hora para outra.

As incertezas com o comportamento errático e imprevisível de Trump podem dar trabalho a Powell. Na questão da desregulamentação bancária, defendida pelo governo, o escolhido para o Fed é moderado e propõe que se reduzam os custos da regulação, mas que ela seja mantida em sua essência. O que Powell não tem controle e pode ser uma surpresa são os três novos companheiros na diretoria do Fed que Trump vai indicar, inclusive o vice-presidente do banco. Há o risco de ele nomear economistas para os quais se inclinou recentemente, como Marsh e Taylor.

A timidez da inflação no atual estágio da recuperação é um mistério para o Fed, como Yellen disse várias vezes. É possível que a reforma tributária de Trump, que desagradou até alguns setores que pretendia favorecer, seja amortecida a tal ponto no Congresso que seus efeitos sobre a atividade econômica não sejam muito relevantes. Uma política fiscal expansionista, porém, é só o que falta para testar a calma inflacionária - e, talvez, a moderação de Powell.

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