sexta-feira, 17 de novembro de 2017

Resistência à mudança – Editorial: O Estado de S. Paulo

Após o Congresso aprovar uma lei, é de esperar que ela seja cumprida. O respeito à norma é consequência natural e imediata do regime democrático: aquilo que os representantes eleitos pelo povo decidem deve valer de fato.

Até o Congresso votar um projeto de lei, a democracia manifesta-se de forma muito especial no debate e no estudo das questões envolvidas. No momento em que o Congresso dá o seu veredicto a respeito de determinado projeto de lei, o respeito à democracia se traduz no acatamento do que foi decidido pelos parlamentares e o tema, durante razoável período de tempo, deixa de ser questão aberta. De outra forma, não haveria possibilidade de avanço ou de mudança, pois a rigor as leis nunca entrariam em vigor, numa perpétua discussão dos assuntos.

Fazer valer a decisão do Congresso é, agora, o desafio relativo à reforma trabalhista. A Lei 13.467/2017 foi aprovada e entrou em vigor no dia 11 de novembro. Trata-se de uma vigorosa atualização da legislação trabalhista, com várias e promissoras novidades. Se elas forem respeitadas, podem proporcionar um novo horizonte para as relações trabalhistas, com efeitos positivos sobre a economia e o desenvolvimento social do País. Tem-se visto, no entanto, uma desarrazoada oposição à nova lei, como se ainda estivesse em discussão se deve ou não valer. Ora, a Lei 13.467/2017 está vigente e deve ser respeitada.

Como já era de esperar, parte dessa oposição à nova lei se origina em alguns sindicatos. Seus interesses foram contrariados – a Lei 13.467/2017 extinguiu o imposto sindical – e eles tentam pôr obstáculos às novas regras. É mais uma manifestação da desconexão das entidades sindicais com os interesses reais dos trabalhadores. A expectativa é de que o fim do imposto sindical possa contribuir para melhorar essa representatividade. Sindicato bom para pelego é ruim para trabalhador.

Tem havido, no entanto, outra espécie de oposição à Lei 13.467/2017, que, de certa forma, é muito mais perigosa do que a reação de alguns sindicatos. Fala-se aqui de quem, a propósito de aplicar a reforma trabalhista aprovada pelo Congresso, interpreta as novas regras à luz da antiga legislação. Por suposto, a nova lei trouxe mudanças. Se os parâmetros interpretativos continuarem a ser exatamente os mesmos do passado, não há dúvida de que a Lei 13.467/2017 será mal interpretada e mal aplicada.

É o caso do trabalho intermitente. Com a reforma trabalhista, tornou-se possível contratar uma pessoa para que trabalhe apenas esporadicamente, na medida da demanda, com um salário proporcional ao período trabalhado de fato. Trata-se de uma medida simples, mas extremamente relevante para quem procura emprego e para quem emprega. Antes da Lei 13.467/2017, ou o empregador tinha demanda para contratar uma pessoa por tempo integral ou não contratava. A lei ignorava tantas outras possibilidades, com enorme prejuízo para o emprego, o empreendedorismo e a própria produtividade do País.

Essa medida simples acarreta mudanças antes impensáveis. Alguém contratado sob o regime do trabalho intermitente poderá ganhar, num mês, menos que o salário mínimo. Não é uma situação desejável, mas é muito melhor do que simplesmente não trabalhar e nada receber. Naturalmente, esse trabalhador, se não recolher a diferença, não fará jus aos benefícios do INSS. Pois bem, alguns apontam tal possibilidade como a suposta prova de que a reforma trabalhista eliminou direitos.

Esse tipo de argumentação explicita a ilusão de quem deseja pôr na lei um mundo perfeito, absolutamente irreal e indiferente a qualquer plausibilidade. Foi, pois, justamente esse modo de pensar – alheio a quem precisa de trabalho e a quem empreende – que saiu vencido na votação da reforma trabalhista. O Brasil deu-se conta de que sua legislação trabalhista, tão díspar da experiência de outros países onde o trabalhador vive em condições muito melhores do que as daqui, era fator de prejuízo, e não de desenvolvimento. É certo que a Lei 13.467/2017 precisa respeitar, como de fato respeita, a Constituição. Mas, logicamente, ela pode inovar e suas inovações devem ser respeitadas.

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