quinta-feira, 16 de novembro de 2017

Ribamar Oliveira: Não se assustem com dados fiscais de outubro

- Valor Econômico

A trajetória é melhor do que se imaginava inicialmente

A divulgação do resultado do Tesouro Nacional em outubro, que ocorrerá daqui a duas semanas, deve provocar um forte ruído no mercado. Em primeiro lugar, tudo indica que o governo central (Tesouro, Previdência e Banco Central) registrou déficit primário no mês passado, enquanto em outubro de 2016 o resultado foi positivo em R$ 40,8 bilhões.

O mais ruidoso, no entanto, será o déficit acumulado de janeiro a outubro, que poderá chegar a R$ 120 bilhões, de acordo com projeção do próprio governo, enquanto ficou em R$ 55,8 bilhões no mesmo período do ano passado.

Parece uma trajetória fiscal desastrosa, muito pior do que a do ano passado, mas nem sempre se deve confiar em números antes de submetê-los a uma análise cuidadosa. Há questões relacionadas com a receita e com a despesa da União que precisam ser consideradas, como observou, recentemente, a secretária do Tesouro, Ana Paula Vescovi.

Em outubro de 2016, os cofres do Tesouro ficaram abarrotados com o ingresso de R$ 46,8 bilhões por conta da chamada "repatriação" de ativos de brasileiros mantidos no exterior. Esta receita extra foi a principal razão para o forte superávit primário registrado naquele mês do ano passado, que reduziu o déficit acumulado de janeiro a outubro de 2016.

Quando divulgar os dados da arrecadação tributária do mês passado, o que ocorrerá na próxima semana, a Receita Federal mostrará uma forte queda real na comparação com o mesmo mês do ano passado. A razão será, justamente, a "repatriação" de recursos ocorrida em 2016.

Excluída essa receita extraordinária, no entanto, houve um forte aumento real da arrecadação no mês passado, entre 9% e 12%, na comparação com outubro de 2016, de acordo com dados preliminares do Siafi - o sistema eletrônico que registra todas as receitas e despesas do governo federal.

Do lado da despesa, é necessário considerar que o Tesouro reverteu a "pedalada" feita nos pagamentos de precatórios do INSS e dos servidores federais, durante a gestão da ex-presidente Dilma Rousseff.

Os precatórios, que são dívidas que a Justiça manda o governo pagar, eram quitados em abril e junho e passaram a ser pagos em novembro e dezembro. Neste ano, o Tesouro voltou ao esquema anterior à "pedalada", passando a pagar os precatórios em maio e junho.

Assim, o déficit primário acumulado de janeiro a outubro deste ano inclui o pagamento dos precatórios no valor de R$ 18,1 bilhões, o que não ocorreu no mesmo período do ano passado. Haverá também mudanças significativas no fluxo futuros das receitas e das despesas.

Em novembro e dezembro deste ano, ingressarão nos cofres do Tesouro os R$ 12,1 bilhões do leilão das quatro usinas hidrelétricas que eram operadas pela Cemig e R$ 10 bilhões dos leilões da 2ª e 3ª rodada do pré-sal e da 14ª rodada de licitações de óleo e gás. Para dezembro, também está previsto o ingresso de R$ 3 bilhões por conta da antecipação do pagamento de outorga fixa do aeroporto do Galeão.

Toda essa receita extra não teve correspondente em novembro e dezembro do ano passado. Assim, nos últimos dois meses de 2017 a receita da União será maior do que no mesmo período de 2016. Além disso, em novembro e dezembro do ano passado, o governo transferiu a parcela devida aos Estados e municípios na receita da "repatriação" de recursos, o que reduziu a arrecadação líquida da União naquele período.

A despesa em novembro e dezembro de 2016 foi aumentada pelo pagamento dos precatórios, o que não ocorrerá nos mesmos meses deste ano. É preciso observar ainda que o governo gastou R$ 8,6 bilhões no fim do ano passado com o pagamento de passivos com organismos internacionais e com tarifas bancárias, entre outras despesas. Isto também não ocorrerá neste ano.

A piora do resultado acumulado de janeiro a outubro deste ano, na comparação com o mesmo período de 2016, deverá, portanto, ser revertida nos últimos meses deste ano. A secretária Ana Paula ainda projeta um déficit primário acumulado de janeiro a novembro maior do que no mesmo período do ano passado. Mas, no fim deste ano, ele terminará abaixo do registrado em 2016.

Na verdade, o resultado fiscal deste ano está em uma trajetória melhor do que o próprio governo imaginava em agosto, quando elevou a meta do déficit primário de R$ 139 bilhões para R$ 159 bilhões. Hoje, os ministros da área econômica deverão discutir um novo descontingenciamento das dotações orçamentárias. A expectativa é que a liberação fique entre R$ 5 bilhões e R$ 10 bilhões.

Esse maior relaxamento está sendo permitido pela melhoria da arrecadação. A receita tributária está crescendo, em sintonia com a recuperação da atividade econômica. Ao mesmo tempo, a receita extraordinária está maior do que a previsão inicial. É muito provável que a arrecadação do Programa Especial de Recuperação Tributária (Pert), o novo Refis, chegue perto de R$ 20 bilhões ao fim deste ano, bem superior aos R$ 13 bilhões inicialmente previstos. Até o mês passado, já estava em R$ 15 bilhões. Houve também surpresas positivas com as receitas de concessão.

Otimismo
O otimismo tomou conta da área econômica do governo. A nova projeção para o crescimento da economia neste ano está bem próxima a 1%. E tem gente importante que já acredita que 3% para 2018 é o piso. A expectativa é que as eleições de 2018 serão realizadas em situação bastante favorável, com maior oferta de emprego e aumento da renda.

Há, no entanto, incertezas que poderão conturbar o cenário. Integrantes da equipe econômica admitem que o humor do mercado poderá azedar se o Congresso não aprovar a reforma da Previdência Social, mesmo que seja apenas a fixação da idade mínima com uma regra de transição. Caso a reforma não seja aprovada, ninguém arrisca traçar um cenário para a economia. Alguns acreditam que os investidores tenderão a apostar contra o Brasil.

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