terça-feira, 26 de dezembro de 2017

Empresas substituem crédito por captações no mercado: Editorial/Valor Econômico

Um estudo divulgado pelo Banco Central em seu Relatório Trimestral de Inflação (RTI) de dezembro mostra que as empresas estão compensando a queda no crédito bancário por captações em operações como emissões de debêntures, de notas promissórias e de ações. Esse é o início de uma saudável transição nas fontes de financiamento ao setor produtivo, que antes eram excessivamente dependentes das linhas direcionadas dos bancos públicos e agora usam mais o mercado privado de capitais.

O crédito bancário a pessoas jurídicas, um mercado que em novembro somava R$ 1,423 trilhão, vem registrando retração desde meados de 2016, à medida que empresas excessivamente endividadas procuram desalavancar os seus balanços. Esse processo já está bem avançado, mas não concluído, tanto que o Banco Central prevê para 2018 uma contração de 2% no crédito bancário para as pessoas jurídicas.

A Petrobras, por exemplo, anunciou seu novo plano de negócios, na semana passada, com a previsão de reduzir a sua dívida líquida dos atuais US$ 88 bilhões para US$ 77 bilhões até o fim de 2018, incluídos nesses números financiamentos bancários e não bancários. Em setembro de 2016, o endividamento atingiu volume recorde, de US$ 100 bilhões.

De forma semelhante, o mercado de crédito bancário a empresas como um todo sofreu uma forte contração nos últimos anos, mostra o estudo do Banco Central, que faz uma análise detalhada de sua evolução desde o início do processo recessivo, em 2014. Um dado que chama a atenção nas estatísticas é que, até meados de 2016, o crédito a pessoas jurídicas seguiu em crescimento, a despeito de a atividade econômica ter entrado em declínio no segundo trimestre de 2014, segundo o Comitê de Datação dos Ciclos Econômicos (Codace).

Ao abrir os dados pelo tamanho das operações, porém, o Banco Central constatou que o crédito para as pequenas e médias empresas já estava se contraindo entre dezembro de 2014 e dezembro de 2015. Nesse período, o que cresceu foram as operações com valores acima de R$ 50 milhões, em geral contratadas com grandes corporações. Quem sustentou o mercado foram, sobretudo, as operações dos bancos públicos, com destaque para o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), cuja carteira avançou R$ 58 bilhões. Naquele período, o governo levou ao limite o uso dos bancos públicos como instrumento anticíclico.

O fracasso dessa política se revelou no período seguinte. De dezembro de 2015 a outubro de 2017, mostram os dados do BC, o saldo de crédito a pessoas jurídicas apresentou uma contração de R$ 156 bilhões, considerando apenas operações com valor superior a US$ 50 milhões. Os 36 maiores tomadores de crédito representam nada menos do que 80% dessa queda. Os bancos públicos respondem por 63% da queda na carteira de crédito no período, incluindo as grandes empresas e as pequenas.

Nesse ano, o Congresso Nacional aprovou projeto de lei que muda a remuneração dos empréstimos do BNDES, que em 2018 passam a ser feitos pela Taxa de Longo Prazo (TLP) em vez da Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP). A TLP é calculada a partir dos juros das Notas do Tesouro Nacional -série B. Assim, a nova taxa flutua de acordo com as forças de mercado, o que permitirá, no futuro, reciclar a carteira do BNDES por meio de operações de securitização no mercado de capitais.

O mercado de capitais, por sua vez, mostra sinais de retomada, puxado pelo fortalecimento da confiança dos investidores, pela recuperação da Bolsa de Valores, pela queda dos juros básicos e pela mudança na política de concessão de crédito pelos bancos públicos. As emissões domésticas de papéis e ações cresceram 75% de janeiro a outubro, comparado com o mesmo período do ano passado.

Cálculos do Banco Central mostram que emissões mais que compensaram a queda no crédito. Enquanto que a concessão de crédito caiu 4,7% nos dez primeiros meses do ano, comparado com o mesmo período de 2016, a soma de captações no mercado de capitais e concessões dos bancos apresenta alta de 1,8%. Isso é exatamente o que se espera, à medida que os bancos públicos deixam de inibir o mercado privado como fonte de financiamento para as empresas.

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