sábado, 2 de dezembro de 2017

Míriam Leitão: Retomada lenta

- O Globo

O resultado do PIB foi menor do que o projetado. Esperava-se 0,3% de alta e foi 0,1%, o que não é nada. No entanto, os outros números juntos contam que o país está mesmo deixando a recessão para trás. O investimento cresceu depois de quinze longos trimestres de queda, quase quatro anos. O consumo em alta reflete o que a pesquisa do emprego mostrou esta semana: a massa de rendimentos cresceu.

Houve ontem à tarde uma onda de revisão para melhor da previsão do PIB deste ano, entre consultorias e bancos. Parece estranho já que o número do trimestre veio menor do que o esperado. É que o IBGE divulgou índices mais altos para os outros dois trimestres anteriores. É por isso que a taxa ficou quase estável. É efeito estatístico após a revisão para melhor dos períodos passados. Pelas novas contas, o país cresceu entre janeiro e março 1,3%, com a expansão ainda maior da agricultura naquele período. A taxa de abril a junho subiu para 0,7%. É por isso que os dados do terceiro trimestre, comparados a esses melhores, ficaram menores do que o previsto.

No terceiro trimestre, a agropecuária encolheu 3% e derrubou a média. Sem esse segmento, o PIB teria avançado 0,6%. Por isso, os especialistas preferem comparar com um horizonte mais longo. Frente ao mesmo período de 2016, a economia cresceu 1,4% no terceiro trimestre, após a alta de 0,4% na pesquisa anterior. É para esse recorte que os economistas têm olhado nas suas revisões.

A MB Associados agora espera crescimento de 1%. É a mesma estimativa do Bradesco, que também melhorou sua projeção ontem. O Itaú colocou viés de alta no seu cenário para o PIB e calculou que, mesmo se o resultado do quarto trimestre ficar estável, a economia fechará o ano com expansão de 1%. Mas como todos acentuam: as incertezas políticas e fiscais podem frear a retomada.

A história do PIB deste ano foi em grande parte determinada pelo clima muito favorável, que garantiu a super safra. A agropecuária disparou 12,9% no primeiro trimestre e puxou a economia. No ano, está com uma alta de 14,5%. A fartura da produção de alimentos derrubou os preços, e isso melhorou o orçamento do consumidor. Veio daí o impulso inicial do consumo, que ainda pegou uma carona na liberação do FGTS na primeira metade do ano. No terceiro trimestre a demanda continuou em alta. O consumo das famílias avançou 2,2%. Foi o motor da economia no período, junto com os investimentos.

A agropecuária tem um peso pequeno no PIB, algo como 5%. Mas o desempenho dela movimenta toda a cadeia do agronegócio que, estima-se, equivale a mais de 20% da economia. A super safra, por exemplo, puxa as exportações, que cresceram 7,6% no trimestre frente a 2016. Ainda ontem, o governo divulgou outro superávit na balança comercial. No ano até novembro, o saldo está positivo em US$ 62 bi. É o melhor resultado da série. E as importações também estão crescendo, em outra indicação de que a atividade está melhorando.

Daqui para frente, o combustível deve vir da queda dos juros. Na semana que vem o Copom deve aprovar novo corte de meio ponto percentual. Se isso acontecer, a Selic vai chegar ao menor nível da história do real, a 7%. A taxa de juros mais baixa continuará impulsionando as compras e os investimentos das famílias e empresas nos próximos trimestres.

O segmento de máquinas já está crescendo. A próxima virada deve vir do ramo da construção. Uma pesquisa da auditoria Deloitte, feita com 750 grandes companhias que registram receita líquida de R$ 1,7 trilhão por ano, revela que em 2018 o setor de construção projeta investir 11% a mais. Isso é o que se vislumbra hoje. Mas as incertezas políticas podem funcionar como um sinal fechado, exatamente quando a atividade começa a ganhar velocidade.

O Brasil está retomando lentamente o crescimento, após a recessão mais longa da nossa história. Ao contrário de outras quedas grandes do PIB — a do começo dos anos 1980 e aquela provocada pelo Plano Collor — a recuperação não será forte nem rápida. Tem sido uma melhora desconfiada. A crise política, o buraco nas contas públicas, as incertezas do quadro eleitoral do ano que vem servem como um freio para esta retomada.

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