quarta-feira, 3 de janeiro de 2018

Drogas e realismo: Editorial/Folha de S. Paulo

Em tendência inequívoca, o apoio à descriminalização da maconha, embora ainda francamente minoritário, apresenta-se cada vez maior entre os brasileiros.

A parcela dos favoráveis à medida alcançou 32%, segundo pesquisa do Datafolha. A proporção não passava dos 17% em 1995, no início da série histórica.

Difícil prever se o percentual continuará crescendo ou em que ritmo. A aceitação da tese é desigual na sociedade: chega aos 40% entre os jovens de 16 a 24 anos; cai a 24% entre os evangélicos.

De mais certo, a experiência de outros países deverá influenciar o debate interno nos próximos anos. Tome-se o caso do vizinho Uruguai, onde o plantio e a comercialização da maconha foram liberados ao longo de quatro anos.

Nesse sentido, é notável que nos EUA, onde 8 dos 50 Estados liberaram o consumo recreativo da droga, o apoio à norma, segundo o instituto Gallup, tenha chegado a 64% –a maior cifra em quase meio século de aferição.

A aprovação se tornou majoritária mesmo entre os republicanos, de tendência mais conservadora: nesse grupo, chegou a 51%, em vigoroso crescimento de nove pontos percentuais desde 2016, a despeito da posição contrária externada pelo governo Donald Trump.

A crescente simpatia da opinião pública americana à descriminalização parece relacionada a experiências positivas como a do Colorado.
Naquele Estado, a dimensão do narcotráfico caiu, enquanto cresceu a arrecadação tributária. Previsões de explosão do número de consumidores e da criminalidade não se confirmaram.

No Brasil, a discussão caminha de maneira bem mais lenta, em grande parte devido ao temor de governantes e legisladores diante da oposição de 66% da população.

A realidade impõe, no entanto, que essa inércia seja rompida. As políticas repressivas, de guerra às drogas, revelam-se dispendiosas e ineficazes em todo o mundo –e aqui não há exceção.

Há décadas as propostas nacionais para a segurança pública orbitam em torno da expansão de verbas e do encarceramento. Este se ampliou sobremaneira; aquelas escasseiam em todos os governos; as taxas de criminalidade não cedem.

A legalização de drogas mais leves não constitui panaceia nem é desprovida de riscos. Convém, como defende esta Folha, que seja gradual e passe por consulta popular. Deve ser examinada sem preconceitos, porém, dado que o caminho da proibição pura e simples se encontra esgotado.

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