quinta-feira, 22 de fevereiro de 2018

Luiz Carlos Azedo: O sobrevivente

- Correio Braziliense

Com a saída de cena de Luciano Huck, a ala tucana insatisfeita com o estilo de Alckmin também já começa a ensaiar o coro “Doria, presidente!”

O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, começou articulações para montar seus palanques regionais a partir de entendimentos com os caciques do PSDB. Ontem, em Brasília, ele se reuniu com senadores e deputados da legenda e manifestou a intenção de iniciar as conversas sobre a situação eleitoral de cada estado, a começar por Minas Gerais, onde o “candidato natural” é o senador Antônio Anastasia (PSDB). Alckmin, porém, não conseguiu unificar o seu palanque em São Paulo.

O problema chama-se João Doria, o prefeito da capital, no exercício do cargo há 14 meses. É uma ironia, pois sua eleição se deve à ousadia de Alckmin nas eleições municipais de 2016. A relação entre os dois é de desconfiança, desde quando Doria aproveitou o embalo da própria vitória eleitoral e saiu pelo país como possível candidato a presidente da República. A movimentação agastou a relação entre ambos e somente não foi à frente porque administrar a maior cidade do país não é um passeio pela Avenida Paulista. A queda de popularidade do prefeito nas pesquisas de opinião provocou um recuo de Doria, que também perdeu a possibilidade de se candidatar a presidente pela legenda quando Alckmin assumiu o comando do PSDB.

O sonho de Alckmin era um palanque unificado em São Paulo, que viabilizasse sua aliança com o PSB, a partir do apoio dos tucanos paulistas à reeleição de Márcio França (PSB), o vice-governador do estado. Mas os tucanos paulistas optaram por lançar a candidatura de Doria ao Palácio dos Bandeirantes, o que dificultou a vida de Alckmin. França promete passar o rodo em quem não apoiá-lo e também não pretende sair do PSB. A alternativa que restou foi a dos dois palanques, que costuma ser um foco permanente de crises nas campanhas.

A presença de França como vice de Alckmin é fruto de um cálculo político que deu errado, com a morte do governador Eduardo Campos (PSB), num desastre aéreo, na campanha eleitoral de 2014. Era uma jogada para unir os dois partidos no segundo turno contra Dilma Rousseff, fosse em torno de Campos ou de Aécio Neves (PSDB). França foi um aliado leal e, desde a eleição, não fez outra coisa que não fosse tentar atrair o seu partido para a aliança com Alckmin. Agora, cobra a fatura.

A chave da aliança, porém, é a situação em Pernambuco, onde o PT lançou como candidata uma das netas do ex-governador Miguel Arraes, Marília Arraes. O governador Paulo Câmara (PSB) e a viúva de Eduardo Campos, Renata Campos, sentiram o golpe e tentam se reaproximar do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Marília, porém, é pasta fora do tubo; já cresceu nas pesquisas. Minas pode jogar um papel importante na aliança se o PSB apoiar o ex-governador Anastasia e indicar o ex-prefeito de Belo Horizonte, Márcio Lacerda, para vice de Alckmin. O governador do DF, Rodrigo Rollemberg, o ex-governador Renato Casagrande e o ex-deputado Beto Albuquerque são simpáticos à aliança.

Até agora, Alckmin é um sobrevivente entre os caciques do PSDB. Por causa da Lava-Jato, os senadores Aécio e José Serra (SP) mergulharam. O desgaste do envolvimento da legenda nas delações premiadas da Odebrecht e da JBS são enormes. As investigações chegaram ao Metrô de São Paulo e ao Rodoanel, grandes obras realizadas no estado onde o cartel das empreiteiras alimentou o caixa dois eleitoral. Nenhuma denúncia atingiu diretamente o governador paulista, que se manteve longe dos holofotes nacionais, embora seja muito criticado por isso.

Asas
Mas é bom o governador paulista fritar o peixe com um olho no ninho e o outro no gato, no caso, João Doria e o presidente Michel Temer. O prefeito de São Paulo dá sinais de que pode bater asas a qualquer chamado, principalmente se vier do Palácio do Planalto. Por ora, o candidato dos sonhos do grupo palaciano é próprio presidente Michel Temer se a economia mantiver o rumo de retomada do crescimento e a intervenção no Rio de Janeiro der os frutos que esperam. O próprio Temer faz tudo o que pode para embaraçar a candidatura de Alckmin e já andou dizendo que poderia apoiar um “nome novo” na política.

Com a saída de cena de Luciano Huck, a ala tucana insatisfeita com o estilo de Alckmin também já começa a ensaiar o coro “Doria, presidente!”. E o prefeito tem passagem fácil entre os jovens empresários do mercado financeiro que estimulavam o apresentador a se candidatar a presidente da República. Em Brasília, velhas raposas políticas que tiveram um papel importante no impeachment e apoiam o governo não veem essa alternativa com maus olhos, muito pelo contrário. Mas foi por essa razão que Alckmin aceitou a tese dos dois palanques em São Paulo, já que Doria não aguenta mais a prefeitura de São Paulo, melhor que seja candidato a governador.

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