terça-feira, 6 de março de 2018

É a estupidez: Editorial | Folha de S. Paulo

Trump diz que restringirá importações de aço e alumínio e há risco de escalada protecionista

Após meses de retórica protecionista, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, resolveu partir para a ação —infelizmente. Em recente reunião com empresários, anunciou que imporá em breve tarifas sobre as importações de aço e alumínio, medida que pode ser o primeiro tiro de uma guerra comercial em larga escala.

Houve pronta repercussão no Brasil, cujos embarques de aço ao mercado americano somaram US$ 2,6 bilhões em 2017 (de US$ 217,7 bilhões em exportações do país). Em dois dias, as principais siderúrgicas nacionais perderam R$ 2 bilhões em valor de mercado.

O objetivo é assegurar que ao menos 80% da capacidade industrial dos EUA nesses segmentos possa se manter em uso, o que não vem ocorrendo por causa das compras de produto estrangeiro.

De forma mais ampla, trata-se de reduzir o déficit comercial americano —de cerca de US$ 800 bilhões anuais, o maior do mundo em valores absolutos.

Baseada em considerações de segurança nacional (produção de equipamento militar), a recomendação do Departamento de Comércio, que tende a ser seguida por Trump, é estabelecer cotas ou taxar as importações de aço e alumínio em 25% e 10%, respectivamente.

Não está claro se todos os países estariam sujeitos às mesmas restrições. O mesmo documento listou os principais vendedores para os EUA, entre os quais estão, entre outros, Brasil, China e Índia.

A ofensiva estúpida pode desencadear retaliações em série dos parceiros comerciais e retrair o volume de comércio internacional, com prejuízo generalizado.

Nem mesmo parecem claros os benefícios mais imediatos à economia americana. Outros compradores desses insumos, como os fabricantes de automóveis, perdem competitividade e empregos. O risco de inflação e juros mais altos também se torna crescente.

O republicano se move para agradar a sua base eleitoral antes das eleições legislativas de outubro, especialmente nos estados associados à velha base industrial do país. Nesse sentido, é até plausível que Trump se contente com uma ou outra providência pontual.

Tudo indica, porém, que a escalada protecionista vai continuar, com foco na China. Está em curso uma investigação com potencial mais amplo, relacionada às práticas chinesas para ganhar acesso à propriedade intelectual.

Se a restrição ao aço e ao alumínio —que representam parcela ínfima das compras americanas— já pode enfraquecer os mecanismos multilaterais de negociação comercial, um conflito aberto das duas maiores potências na área tecnológica teria impactos desastrosos.

Nenhum comentário: