sexta-feira, 13 de abril de 2018

Alex Manente: Texto datado

- O Globo

Não subsistem circunstâncias que levaram o constituinte, naquele momento, a exigir o trânsito em julgado

A condenação do ex-presidente Lula pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região e a prisão do líder petista fizeram com que o debate sobre o princípio da presunção de inocência ganhasse ampla repercussão na imprensa e em todos os setores da sociedade brasileira.

A Constituição de 1988 foi redigida sob a inspiração de ideais democráticos que emergiram da superação da ditadura militar. Naquele momento histórico, premido pelas graves violações aos direitos humanos durante o regime anterior, o constituinte incluiu na Lei Maior vários princípios garantistas, entre eles o da presunção de inocência.

A Carta Cidadã, ao tratar da presunção de inocência, estabeleceu que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”, ou seja, antes do esgotamento dos recursos. A partir disso, no ano de 2016 o Supremo Tribunal Federal estabeleceu a possibilidade de início do cumprimento da pena por condenação criminal após a condenação em segunda instância, sem a necessidade do trânsito em julgado. Desde o início, houve muita controvérsia no meio jurídico sobre tal interpretação.

De um lado, em favor da interpretação do Supremo, as correntes que defendem maior ativismo judicial sustentam que a prisão após a condenação em segundo grau é possível, visto que os tribunais superiores não podem apreciar fatos e provas do processo, apenas questões de direito. De outro lado encontram-se os garantistas, que afastam a possibilidade de início do cumprimento da pena antes do trânsito em julgado. Quem assistiu ao julgamento do habeas corpus de Lula no dia 4 de abril pôde perceber claramente essa divisão entre as duas correntes.

Passados 30 anos desde a promulgação da Constituição, entendo que não subsistem no Brasil as circunstâncias que levaram o constituinte, naquele momento, a exigir o trânsito em julgado para afastar a presunção de inocência. Por isso, apresentei uma emenda à Constituição (PEC 410) para que o texto constitucional estabeleça que “ninguém será considerado culpado até a confirmação de sentença penal condenatória em grau de recurso”. Com isso, não haveria mais qualquer dúvida quanto à possibilidade de início do cumprimento da pena por condenação criminal após a condenação por um órgão judicial colegiado.

Há quem sustente que a emenda de minha autoria não poderia ser aprovada, por ferir a cláusula pétrea que veda emendas constitucionais tendentes a abolir os direitos e garantias fundamentais, entre os quais se encontra a presunção de inocência. Contudo, a mudança que estamos sugerindo não está abolindo a presunção de inocência, apenas modificando o momento processual a partir do qual a culpa dos acusados passaria a ser considerada. Ou seja, o núcleo essencial da proteção — presunção de inocência — permanece íntegro, só havendo modificação na fase do processo em que se considera o acusado culpado. Trata-se de uma alteração necessária.

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Alex Manente é deputado federal (PPS-SP) e autor de PEC da prisão em segunda instância

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