segunda-feira, 30 de abril de 2018

Ranier Bragon: Em que mundo estamos?

- Folha de S. Paulo

'Em que mundo estamos?' soa como a única manifestação legítima da fala do presidente na sexta

Não era nem meio-dia de sexta (27) e um irritado Michel Temer convocou a imprensa para rebater suspeitas, reveladas pela Folha, de que ocultou dinheiro de propina em negócios imobiliários da família.

“Em que mundo é que estamos?”, perguntou lá pelas tantas, em meio a diagnósticos que, justiça lhe seja feita, parecem mesmo de outro planeta.

No universo paralelo de Temer, o “revoltante” é ter vindo à tona a linha de investigação da Polícia Federal.

Em outra recente reportagem, a Folha mostrou que um dos fornecedores da reforma da casa da filha do presidente recebeu pagamento em dinheiro vivo das mãos da mulher do coronel Lima, amigão de longa data de Temer e uma das pessoas mais mudas de que se tem notícia quando o assunto é investigação.

O que disse o presidente da República, a filha, o coronel ou a mulher sobre isso? Nada digno de nota.

Mas no mundo de Temer quem deve explicações são os policiais —serão investigados, a seu mando—, que deveriam simplesmente ter dito: “Olhe aqui, presidente, vem cá.

Apresente os documentos aí referentes à doação que fez, à compra que fez”.

Temer certamente se referia ao universo paralelo. No real, reclamou em janeiro da agressividade e da falta de respeito de 50 perguntas que a PF lhe fez nessa mesma investigação.

Na sexta, também mandou recados a Lula —“Não tenho casa na praia”—, como se estivesse em condições de jogar pedra no telhado de quem quer que seja. Além de um a si próprio: o de que duvida que a imprensa entre na PF de madrugada, “sorrateiramente”, para obter informações. Como não se lembrar do sorrateiro acesso de Joesley Batista ao Palácio do Jaburu naquele inesquecível 7 de março de 2017?

Temer teve tempo, em sua fala, até para dizer que seu governo suscita “admiração extraordinária” no exterior, mas, em resumo, não se explicou concretamente sobre o que interessa: as graves suspeitas que pesam contra ele. Atitude inadmissível a um presidente da República, neste ou em qualquer outro mundo.

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