sexta-feira, 4 de maio de 2018

EUA dão ultimato e impõem cotas para o aço brasileiro: Editorial | Valor Econômico

Brasil, Argentina e Coreia do Sul dobraram-se às exigências americanas e concordaram em limitar, via cotas, suas exportações de aço para o mercado americano. Pelo peso de suas economias e a importância de suas exportações do produto para os Estados Unidos, a União Europeia se insurgiu e deixou claro que não está disposta a aceitar os ditames protecionistas de Donald Trump. A resistência europeia aumenta a importância da decisão chinesa sobre o assunto, que tem nessa semana um capítulo importante, com as reuniões entre os principais integrantes da equipe de comércio de Trump e os burocratas de Pequim. A posição chinesa pode, se a intenção inicial se mantiver, abrir uma das maiores batalhas comerciais da história da Organização Mundial do Comércio (OMC).

O governo brasileiro deveria definir melhor sua estratégia diante dos ímpetos protecionistas de Trump, que não deverão se restringir ao aço e alumínio. O motivo inaugural da iniciativa americana não para em pé - riscos à segurança nacional das importações - e mesmo este argumento esdrúxulo foi abandonado no decorrer do tempo. Ficou explícito nas declarações da trinca Wilbur Ross, secretário do Comércio, Robert Lighthizer, da USTR, e Peter Navarro, conselheiro especial da Casa Branca para o tema, que os EUA pretendem obter vantagens comerciais com as sanções, o que simplesmente desmente o objetivo original.

O alvo principal da ação para barrar a entrada do aço nos EUA, assunto do qual Lighthizer, titular da USTR, é especialista, após décadas advogando como lobista para o setor, tinha como meta a China, o maior produtor mundial. No entanto, a China, diretamente, é um exportador marginal para o mercado americano, e o impacto tarifário foi desviado em cheio para os exportadores tradicionais, como Brasil e Coreia do Sul.

Tanto o maior exportador aos EUA, o Canadá, como o México, ligados aos americanos por acordo comercial, até agora escaparam das tarifas - nem deveriam ter sido cogitados como alvos. Trump tem objetivos específicos e não os deixou em paz porque pretende renegociar em termos mais favoráveis o Nafta. Pelos instintos prevalecentes na Casa Branca, o Nafta seria revogado, mas as empresas americanas se opõem à ideia.

O Brasil está sendo constrangido a se submeter à restrição das cotas, que têm como limite o volume médio exportado nos últimos três anos. Pelos cálculos das indústrias do setor, isso trará redução de 7% sobre as vendas de produtos semi-acabados ao mercado americano em 2017. No caso do aço acabado, o impacto será muito maior, embora as vendas não sejam tão significativas - de 20% a 60% de redução, segundo o tipo de produto. No caso do alumínio, as empresas do setor preferiram encarar a sobretaxa de 10% a aceitar as cotas.

A União Europeia, maior bloco econômico do mundo, criticou a investida americana e deixou claro que deveria ficar "total e permanentemente isenta dessas medidas, já que elas não podem ser justificadas com base na segurança nacional". Inicialmente, os argumentos da China tomaram o mesmo rumo, indicando que a disputa comercial deveria seguir seu curso junto à OMC, o caminho natural. A equipe protecionista de Trump tem um contencioso ideológico com a organização, a quem acusa de ser contrária aos interesses americanos, o que não é nem de longe confirmado pelos fatos.

Governos protecionistas e com inclinações anti-americanas, como os de Lula e Dilma Rousseff, tiveram poucas e previsíveis pendengas comerciais com as administrações liberais de George W. Bush e Barack Obama. As posições agora se inverteram. O governo de Michel Temer tem tendência liberal, mas Trump é escancaradamente, embora de maneira seletiva, protecionista.

O problema é que Trump tem conseguido até agora quebrar as regras do comércio e dividir os países que até então seguiam as regras da OMC. Se seu primeiro alvo for atingido, tudo indica que haverá mais e maiores confrontos comerciais. O governo brasileiro deveria estar pronto a aderir a iniciativas de qualquer país que pretenda impedir as barreiras criativas de Trump em seu foro adequado, a OMC. Há grande chances de que a UE e a China tomarão este caminho.

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