terça-feira, 8 de maio de 2018

Indústria vacila e põe ritmo de recuperação em dúvida: Editorial | Valor Econômico

Os resultados da indústria em março acenderam um sinal de alerta e provocaram a revisão para baixo das estimativas de crescimento neste ano. Esperava-se que este ano fosse melhor para a produção industrial do que 2017, quando a expansão foi de 2,5%, quebrando uma sequência de três anos de baixa. A retomada ajudaria a recuperar o mercado de trabalho, com empregos geralmente formais e de melhor remuneração. Agora já não se tem a mesma certeza. Também estão em jogo as expectativas para o Produto Interno Bruto (PIB) do primeiro trimestre, que será divulgado no fim do mês, e podem influenciar as previsões para o ano inteiro, que já antecipavam uma retomada gradual.

De alguns ângulos, os números podem parecer positivos. A produção industrial medida pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) cresceu 1,3% em relação a março de 2017 e foi a 10ª taxa positiva consecutiva desde junho de 2017. Em 12 meses, a expansão foi de 2,9%, o mesmo resultado acumulado em fevereiro e o mais elevado desde junho de 2011. A produção industrial está 15,3% abaixo do nível recorde de maio de 2011.

Mas prevaleceu a comparação com último trimestre de 2017, que sinaliza uma certa estagnação. Com o recuo de 0,1% em março, a indústria simplesmente anula o crescimento que havia registrado em fevereiro. Dos 26 ramos pesquisados, 14 tiveram taxas negativas. O crescimento de 3,1% no primeiro trimestre mostra desaceleração em comparação com os 4,9% do quarto trimestre de 2017, o que se repetiu em praticamente todos os principais setores. O resultado foi determinado pelo comportamento dos bens intermediários, que representam cerca de 60% do setor industrial, e registraram queda de 0,7%, a terceira seguida, com perda acumulada de 3,9%. No caso dos bens de consumo semi e não duráveis, o crescimento refluiu de 2,8% nos últimos três meses de 2017 para 0,8% no primeiro trimestre deste ano.

Já o segmento de bens de consumo duráveis, que cresceu 1% em março e continua sendo o que apresenta crescimento mais vigoroso, ainda assim não se saiu melhor no final do ano passado, com expansão de 16,2% no primeiro trimestre em comparação com 17,9% nos últimos três meses de 2017, com desacelerações importantes na produção de automóveis e outros equipamentos de transportes.

Alguns indicadores reforçam as expectativas mais cautelosas. O nível de utilização da capacidade instalada da indústria de transformação calculado pela FGV e pela CNI vem aumentando ligeiramente, mas segue muito abaixo da média histórica nos dois casos. Os estoques diminuíram, mas não mudaram muito desde fevereiro.

O início de ano poderia ser ainda mais fraco para a indústria se as exportações do setor não tivessem tido bom resultado. O quantum de manufaturados exportados calculado pela Funcex, que mede as quantidades embarcadas, aumentou 15,6% no primeiro trimestre em comparação com apenas 1,4% do mesmo período de 2017. A queda da produção de bens intermediários, por exemplo, teria sido mais intensa não fossem as exportações de alimentos e de papel e celulose. No entanto, a turbulência na Argentina com a forte desvalorização do peso e a elevação dos juros locais adiciona uma preocupação extra no cenário porque pode afetar as exportações de manufaturados brasileiros, principalmente automóveis, dado que esse é o terceiro maior mercado externo do Brasil. As imposições comerciais dos Estados Unidos também deverão ter impacto no embarque de manufaturados de aço, como laminados, e de alumínio.

A Copa do Mundo pode trazer um alento extra para esse quadro uma vez que geralmente estimula a produção e venda de eletroeletrônicos, setor que ainda tem capacidade ociosa elevada, apesar de sua produção ter aumentado 11,1% no primeiro trimestre em comparação com o mesmo período de 2017. O consumo pode ser favorecido pelo recuo da inflação e dos juros, desde que o crédito volte a fluir. Mas o aumento do consumo depende também da reação do mercado de trabalho. A indefinição do cenário eleitoral e da futura condução da economia não ajuda, porém. Talvez o brasileiro tenha que se conformar em ver uma reação da indústria em ritmo aquém do esperado.

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