quinta-feira, 17 de maio de 2018

Maria Cristina Fernandes: O melhor cabo eleitoral do lulismo

- Valor Econômico

Gilmar Mendes está por merecer uma estátua do PT

O ministro Gilmar Mendes está por merecer, do PT, uma estátua, a ser fincada diante das dependências da Polícia Federal em que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva está preso em Curitiba. O ministro foi um dos principais artífices da saída que tinha por objetivo manter Lula livre, mas longe das urnas. Obstruída a alternativa, com a qual também se beneficiaria seu grupo político, instalou uma linha de produção de habeas corpus para operadores do PSDB e MDB. Não se ouviram panelas ou generais. Nessa toada, só vai entrar na cadeia quem tiver crachá do PT. Em sua desabalada produtividade, o ministro terá conseguido o inverso do pretendido. Se o ex-presidente pagar esse pato sozinho, o lulismo sobreviverá eleitoralmente ainda que sua principal liderança permaneça encarcerada.

O ex-presidente sempre tomou decisões a partir de suas conversas. Ouve todos os lados e opta por um caminho. Como as visitas só acontecem às quintas-feiras, em duplas, desde que foi encarcerado, Lula só conseguiu conversar com quatro petistas: a presidente do partido, a senadora Gleisi Hoffmann, o ex-governador Jaques Wagner, o tesoureiro do partido, Emídio de Souza e o diretor do Instituto Lula, Paulo Okamotto. Hoje Gleisi voltará a Curitiba na companhia do ex-prefeito Fernando Haddad. Por enquanto, é ao PT que se restringe. Pode até receber cartas, mas estará privado de observar as reações e ler pelas entrelinhas.

Se os interlocutores são escassos, os fatos não o são. Desde sua prisão, a melhor notícia para o ex-presidente foi a saída do ex-ministro Joaquim Barbosa do páreo. Some-se aí a reiterada sorte de Gilmar Mendes com a distribuição de habeas corpus no Supremo. O lulismo perdeu um adversário que ameaçava reconfigurar a esquerda e ganhou um cabo eleitoral para a estratégia de vitimização. Sua causa, para além do circuito militantes, igreja, artistas e intelectuais, ganhou esta semana a subscrição de seis ex-chefes de Estado europeus, entre eles François Hollande e José Zapatero.

É em cima desse novo cenário que se dá a reaproximação com o PSB. Os governadores de São Paulo, Márcio França, e do Distrito Federal, Rodrigo Rollemberg, resistem, mas é este o interesse da ala pernambucana, que tem a maioria de votos no diretório nacional. Paulo Câmara tem um muro para escalar em sua reeleição chamado Marília Arraes. A vereadora petista de 34 anos, prima de Eduardo Campos, está pareada com o governador nas pesquisas. Rouba-lhe dois principais ideários de sua campanha, o arraesismo e o lulismo e ainda lhe tira tempo de TV para a defesa de sua gestão.

Para derrubar os arrecifes de Câmara, o PT vai exigir do PSB o céu e a terra, a começar pela aliança nacional. Uma possibilidade é uma chapa de ex-prefeitos, com a ida de Marcio Lacerda, de Belo Horizonte, para a vice do paulistano Fernando Haddad. Esta composição limparia o caminho de outra reeleição, a do governador Fernando Pimentel, em Minas Gerais. Além de exportar Lacerda, Pimentel ainda quer fortalecer o PSB em sua própria aliança e desalojar o MDB, que o ameaça dia sim e outro também com um impeachment na Assembleia Legislativa.

Este acordo ainda passaria pelo apoio do PT ao grupo do governador Ricardo Coutinho (PSB) na Paraíba. É disso que tratarão Pimentel, Câmara e Coutinho, em encontro nesta sexta no Recife. Para prosperar, o acordo tem desventuras em série. A começar do próprio Lacerda, que antes de se aventurar na política eleitoral foi secretário-executivo de Ciro Gomes no Ministério da Integração Nacional. Traz ainda um desconforto para o governador de São Paulo que peleja para fugir do estigma de esquerdista que o principal adversário à sua reeleição, o ex-prefeito João Doria (PSDB), insiste em lhe impingir.

Por isso, o PSB vai tentar restringir o acordo a um encontro de contas estadual entre Pimentel, Câmara e Coutinho. Mas o PT vai apostar na centralidade do governador de Pernambuco no PSB para valorizar o passe eleitoral de Marília Arraes. Na eventualidade de um acordo como este prosperar, não restará saída para Ciro Gomes outra saída senão o centrão. Cearense de Pindamonhangaba, indignado mas do sistema, anticoronelista mas oligarca, aliado petista mas signatário da cédula do Real, o ex-ministro é o melhor enfeixe de antagonismos que o PP poderia desejar. É a metamorfose ambulante de que o partido precisa para liderar o novo ciclo do liberalismo de Estado do país.

A relação do empresário Benjamin Steinbruch com o senador Ciro Nogueira (PP-PI) precede a contratação do ex-governador pela CSN. A filiação do empresário ao PP, no entanto, apenas aconteceu no último minuto do segundo tempo. Não é a primeira opção do partido numa eventual composição com Ciro. O deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ) tem precedência, mas o ex-ministro exibiria predisposição para o suicídio se aceitasse de vice um novo Michel Temer, disposto a assumir seu lugar a qualquer momento.

Steinbruch entraria para garantir o combo do Centrão. Se há veto contra Maia, que Ciro aceite o ex-patrão na vice e feche com a reeleição do deputado carioca para a Presidência da Câmara dos Deputados. Para além do reino das hipóteses, de concreto mesmo só a percepção de que no barco do ex-governador Geraldo Alckmin não dá para embarcar. Se tudo der errado, lá estarão todos no dia 2 de fevereiro para o início dos trabalhos no Congresso. Como diz o mantra de Ciro Nogueira que magistrados como Gilmar Mendes ajudam a perpetuar, eles estão sempre lá, quem muda é o governo.

Com um combo como este, Ciro custaria a emplacar como o novo que o eleitor está a buscar. PT e PSB não oferecem grande vantagem neste quesito, mas teriam a vitimização de Lula como escudo. O adversário preferido de um e outro, se ambos vierem a ultrapassar a ex-senadora Marina Silva (Rede), é o deputado Jair Bolsonaro (PSL). De Haddad, porque agregaria o centro. De Ciro, porque atrairia a esquerda. Mas aí se somam planos demais para definição de menos, a começar do PSB. Nenhuma aliança se concretizará antes das convenções de julho, tempo suficiente para o presidiário de Curitiba expandir seu rol de interlocutores e o cabo eleitoral de toga ampliar os serviços prestados.

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