quarta-feira, 2 de maio de 2018

Míriam Leitão: O real da economia

- O Globo

O Brasil vai crescer pouco este ano porque o consumo não poderá alavancar a economia, o desemprego está alto, a renda, estagnada e os investimentos, muito baixos. A inflação e os juros caíram e isso deveria ser um estímulo, mas o custo do dinheiro permanece elevado demais, porque poucos bancos dominam o mercado de crédito e isso entope os canais que levam a política monetária à economia. Não há milagre.

Já é boa notícia que o país esteja fora da recessão, na qual foi jogado pelos desatinos de política econômica do governo Dilma. Mas o governo Temer acertou pela metade. Escolheu uma boa equipe e a mantém, aprovou o teto de gastos, o Banco Central tem tido autonomia, e ele impediu o uso político da Petrobras. Por outro lado, concedeu aumentos ao funcionalismo público em época de restrição, aceitou todas as imposições nos refinanciamentos de dívidas tributárias de grupos de lobbies como os ruralistas e desistiu de alguns projetos de ajuste fiscal. Entre os abandonados estão desde os de difícil aprovação, como a reforma da Previdência, até os menos complexos, como a taxação dos fundos exclusivos.

Por isso não se admira que as projeções dos economistas para o PIB do ano estejam minguando a cada semana. O que antes era um PIB de 3% está agora mais perto de 2,5%. As duas incertezas, a externa e a interna, servem como um freio de mão puxado. A economia internacional passa por uma boa fase, como disse o FMI, em seu último relatório, mas vive assombrada por vários riscos. Um deles, Trump. Aqui o desemprego continua alto e o déficit público em março atingiu R$ 25 bilhões.

No Brasil, a incerteza tem várias frentes. A primeira é a eleitoral. O país está a 158 dias das eleições, e tem apenas ideias vagas do que significa, do ponto de vista prático, o pensamento de política econômica de cada candidato. Há dúvidas concretas. Como lidar com o resultado primário que estará no ano que vem no sexto déficit consecutivo, sem perspectivas de equilíbrio a curto prazo? O Banco Central divulgou na segunda-feira que o déficit do setor público consolidado ficou em R$ 25 bilhões em março. Se o desajuste continuar alto, sobe também a dívida pública. Quando a ex-presidente Dilma assumiu, era de 52% do PIB e agora está em 75%. Que reformas serão feitas para reestruturar o gasto público e estabilizar a dívida?

Há melhoras inegáveis na conjuntura. A inflação, que havia chegado a dois dígitos, está abaixo de 3%. Depois da recessão de 3,5% nos anos de 2015 e 2016, a economia ficou quase estável no ano passado, com alta de 1%, e este ano terá um PIB magro, porém positivo. Mas não há projeto nem perspectiva de crescimento forte nos próximos anos que ajudem a resolver o problema mais agudo que nós temos: o desemprego.

A ameaça de guerra comercial entre Estados Unidos e China é apenas uma dos pontos que tornam o cenário internacional mais instável. A política econômica de Trump, de aquecer a economia através da redução de impostos, elevar o déficit público e subir barreiras comerciais pode redundar em mais inflação e elevação dos juros, o que muda toda a rota do fluxo internacional de capitais. O Brasil tem reservas cambiais para enfrentar as oscilações dos fluxos de recursos, mas o déficit público fragiliza a economia.

No ajuste fiscal feito na boca do caixa, o corte sempre recai sobre os investimentos, e por isso eles estão tão baixos. No setor privado, as empresas seguram os planos à espera de uma definição mais clara das eleições. Por todos esses motivos, a retomada da atividade após a recessão 2014-2016 é tão lenta. Na economia não há milagre. Se não há as pré-condições, não acontece o crescimento.

As projeções mais otimistas do começo do ano se baseavam na expectativa de aumento do consumo como fator de retomada, e ele melhoraria pelos estímulos de política monetária. O Banco Central, de fato, reduziu os juros aos níveis mais baixos da história e liberou parte do compulsório dos bancos. Numa economia que funcionasse dentro da normalidade, isso alavancaria o crédito e reduziria fortemente os juros bancários. Isso não ocorreu. Com desemprego, déficit público, dinheiro caro, baixo investimento e incerteza política, seria estranho se o país estivesse embalado.

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