segunda-feira, 7 de maio de 2018

Traço cultural: Editorial | O Globo

Não é fácil estabelecer limites de gastos no Brasil, mas já existem mecanismos com este fim

É tarefa dura e ingrata no Brasil tentar conter a irresponsabilidade fiscal, devido à insana propensão de parte dos políticos de gastar sem se preocupar com a origem do dinheiro e com as consequências de políticas fiscais demagógicas, populistas.

Não se trata de uma questão lógica, mas até de fundo cultural, que seduz a direita e a esquerda. Talvez pelo peso desmesurado que o Estado sempre teve no país, quem está no poder tende a considerar que basta vontade política para alijar a miséria, distribuir renda etc. Salvo conhecidas exceções.

A responsabilidade fiscal desagrada ao político que assume o Executivo já com a preocupação de usar o dinheiro público para pavimentar a reeleição passados quatro anos. Na ditadura militar, quando não havia eleições, os erros na condução das finanças do país foram cometidos devido aos mesmos dirigismo e intervencionismo que cativam a esquerda. Os extremos se tocam.

Daí a dificuldade na construção de normas legais que contenham o voluntarismo dos poderosos de turno. Mas, seja como for, estes mecanismos têm sido criados. Um deles é a “regra de ouro”, estabelecida pelo artigo 167 da Constituição, pela qual o Estado não pode se endividar acima das chamadas despesas de capital (investimentos, inversões financeiras e amortizações da dívida pública). Ou seja, é inconstitucional o Tesouro lançar títulos a fim de obter recursos para pagar gastos de custeio (salários, Previdência, custo da máquina).

É indiscutível a importância da regra. Outra norma é a Lei de Responsabilidade Fiscal, de 2000, para enquadrar estados e municípios num parâmetro mínimo de prudência nas despesas. Ela foi incluída na Carta, e isso ajudou no impeachment da presidente Dilma, por crime de responsabilidade, porque desrespeitou a LRF.

Já no governo Temer, vice de Dilma, foi aprovado, por emenda constitucional, o teto dos gastos, para conter a elevação de despesas sem controle. O teto é reajustado pela inflação, e a soma das despesas primárias (sem incluir os juros da dívida) não pode ultrapassá-lo. Se algum gasto crescer demais, outros itens do Orçamento precisam ser cortados, para o total não exceder este limite.

Trata-se de instrumento pedagógico de grande eficácia, porque ensina aos políticos que o Estado não tem capacidade infinita de gastar, e que eles precisam fazer escolhas. É o que garante que o próximo presidente terá de executar a reforma da Previdência, nas linhas definidas na Câmara (limite de idade, equalização de regras entre assalariados e servidores públicos, por exemplo). Como são aposentadorias e pensões que empurram as despesas para além do teto, a reforma é inevitável.

Por isso, é preciso cuidado com ideias de flexibilização do teto constitucional. O importante tem de ser executar as reformas que mantenham as despesas dentro daquilo que a sociedade pode pagar em impostos.

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