quarta-feira, 27 de junho de 2018

BC olha riscos e deixa em aberto próximas decisões: Editorial | Valor Econômico

Surpresas negativas ocorrem e, em um cenário de maiores riscos, o Banco Central deixou de indicar os próximos passos da política monetária, embora tenha deixado claro o que considera relevante para as decisões a serem tomadas nas próximas reuniões do Comitê de Política Monetária. Há incertezas no cenário doméstico e piora no cenário externo, mas, por ora, pesado o balanço de riscos, o BC resolveu manter uma "política estimulativa".

A greve dos caminhoneiros adicionou dúvidas sobre o ímpeto da atividade econômica a curto prazo. Até abril, os indicadores da atividade econômica apontavam crescimento "consistente", segundo a ata da reunião do Copom, mas a paralisação "dificulta a leitura da evolução recente". Não é a recuperação que está em jogo, mas seu ritmo, que pode ter sido alterado, como vêm mostrando os sucessivos rebaixamentos da taxa de expansão da economia no boletim Focus - agora em 1,7%.

Os efeitos sobre os preços do desabastecimento provocado pela interrupção do fornecimento de cargas, por seu lado, serão "altistas significativos e temporais", o que não causa ainda a menor preocupação em relação ao não cumprimento da meta de inflação, pois as medidas da inflação subjacentes continuam em níveis muito baixos. O que muda é que agora "diminuiu o risco de a inflação ficar significativamente abaixo da meta no horizonte relevante".

O Copom avaliou os cenários de mercado, com base nas projeções do Focus para câmbio e taxa Selic e um próprio. Ambos se apresentam tranquilizadores. Com dólar a R$ 3,63 e R$ 3,65, para 2018 e 2019, e taxa Selic inalterada este ano e de 8% em 2019, as taxas previstas de inflação alcançam 4,2% e 3,7%, abaixo das metas. Com câmbio a R$ 3,70 e mantendo-se a Selic atual, de 6,5%, o BC calcula taxas de 4,2% e 4,1%.

O que pode puxar a inflação para cima é a disparada do dólar. Com o dólar a R$ 3,70, o Copom apontou, por exemplo, uma alta dos preços administrados de 7,4% este ano. Quanto ao efeito sobre os demais preços, eles dependerão, como o BC tem reiterado, "do nível de ociosidade da economia e da ancoragem das expectativas de inflação", entre outros fatores. A folga da capacidade de produção ainda é grande e as expectativas de inflação, termômetro da ancoragem, não apontam desvios relevantes à frente.

Neste ponto, o BC ressaltou algo que trouxe ruídos em sua comunicação anterior, quando, após indicar que poderia fazer mais um corte nos juros, optou por manter a taxa. Ele sublinhou a "importância de insistir na comunicação de que não há relação mecânica entre choques recentes e a política monetária". Esta última terá foco exclusivo, segundo o Copom, nas projeções e expectativas de inflação e no balanço de riscos. No jargão, o BC vai perseguir os efeitos secundários da desvalorização cambial sobre os preços, não usar a taxa de juros para deter eventuais corridas do dólar.

O fator mais imediato de possível modificação nos preços relativos foi a disparada recente do dólar. Com intervenções maciças com swaps cambiais e alguma colocação de dólares à vista com possibilidade de recompra, as cotações passaram a ter oscilações mais suaves e não chegaram a ultrapassar R$ 3,80. Mas esse nível de acomodação é incerto. Por um lado, a valorização do dólar deve prosseguir não apenas pelos aumentos de juros já programados pelo Federal Reserve americano, como pelo diferencial de crescimento da economia americana em relação às demais desenvolvidas, após o pacote de estímulos fiscais de Trump. Uma guerra comercial em larga escala pode tumultuar a economia global e provocar novas desvalorizações do real.

Na ausência de aumento dos riscos no cenário externo, uma nova onda de turbulências no câmbio tem data marcada com as eleições. Em maio já houve "avant première" da reação dos mercados à ausência, até aqui, de um candidato do centro do espectro político com compromisso firme em relação às reformas, em especial a da Previdência. Esse quadro pode ou não se definir com as convenções até agosto. Se as pesquisas não indicarem modificação significativa, com Jair Bolsonaro e Marina na liderança, e Ciro Gomes (PDT), chegando perto, o real deve se depreciar ainda mais.

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