quinta-feira, 21 de junho de 2018

Míriam Leitão: BC entre juros e câmbio

- O Globo

O Banco Central manteve os juros em 6,5% e esclareceu que não subirá as taxas para combater a elevação do dólar. Usará a política monetária apenas se houver impacto mais forte na inflação. Por enquanto, ela está, em todos os cenários, abaixo do centro da meta. E o nível de atividade está fraco, portanto é preciso ter o estímulo dos juros baixos. O que preocupa o BC é o abandono das reformas.

Manter os juros era a decisão a tomar. Desde a última reunião houve várias mudanças para pior na conjuntura e dois choques de preços: a greve do transporte de carga e a volatilidade cambial. O comunicado do BC fala desses dois fatos. Diz que a greve afetou o nível de atividade, mas acredita que a maior probabilidade é de que, passados dois meses, o processo de recuperação da economia continue.

O Copom acha que a greve e a alta do dólar vão afetar a inflação, mas não de forma a colocar em risco a meta. Em qualquer dos cenários a taxa deve ficar abaixo de 4,5%. O Banco Central admite que desde a última reunião ficou mais forte a tendência de alta dos índices.

Os choques recentes estão sim elevando a inflação. O país está no meio desse processo. Os IGPs estão altos e o IPCA-15 de hoje deve ficar em torno de 1%. O efeito do câmbio é um pouco mais demorado, mas também impactará os índices. Contudo, não há previsão de riscos para as taxas de inflação. Entre outros motivos porque a economia está muito fria. Neste ambiente, a transferência do câmbio para os preços é mais lenta e difícil.

Desde a última reunião houve piora em todas as previsões de crescimento e a cada dia há um novo indicador mostrando isso. Ontem a CNI divulgou o Índice de Confiança do Empresário Industrial e a avaliação das condições presentes despencou de 48,3 pontos para 37,3. Qualquer número abaixo de 50 é pessimismo, mas ele se aprofundou. Piorou também a avaliação para os próximos seis meses.

Nas últimas semanas, com a volatilidade cambial, muitos economistas, bancos, consultores tiveram dúvidas sobre qual seria o entendimento do Banco Central. Essa reunião estava sendo aguardada porque poderia explicar esse novo contexto. E o comunicado foi bem claro em dizer que os juros não tentarão segurar a taxa de câmbio. Em outras palavras, o Brasil não fará o mesmo que a Argentina ou Turquia. “Choques que produzam ajustes de preços relativos devem ser combatidos no impacto secundário que poderão ter na inflação prospectiva”, diz o BC. Acrescenta que os efeitos desses choques podem ser mitigados num ambiente de capacidade ociosa da economia e com as expectativas de inflação ancoradas na meta. “Portanto não há relação mecânica entre os choques recentes e a política monetária.”

A questão ainda em aberto é qual é o limite da oferta de swaps cambiais pelo Banco Central. Para o economista Márcio Garcia, da PUC-Rio, o que o BC consegue é evitar o exagero das cotações (overshooting), mas não controlar a cotação. E que dependendo da alta, pela política de metas de inflação, os juros teriam que subir:

— Evitar overshooting é bem importante porque dá tempo para que os agentes se protejam, com menores danos à economia. Mas subir juros com economia fraca dependerá do câmbio. No nível em que está não, mas a R$ 4,50 ou mais teria que subir sim.

O que o comunicado do BC diz é que, por enquanto, “o Copom reitera que a conjuntura econômica prescreve política monetária estimulativa ou seja com taxas de juros abaixo da taxa estrutural".

E faz, no comunicado, o alerta de sempre, de que se as reformas não continuarem o país não terá, no médio e longo prazos, nem inflação baixa, nem crescimento sustentado.

Há riscos para a economia brasileira. Muitos riscos, mas neste momento não vêm do câmbio. A situação fiscal é de grande fragilidade e o quadro eleitoral é nebuloso. Mesmo no cenário em que seja bem sucedida uma candidatura que entenda a necessidade de buscar o equilíbrio fiscal, o novo governo terá dificuldade de reduzir o déficit e estabilizar a dívida.

Mas, o que o BC disse ontem é que neste momento não há ameaça de inflação acima da meta, e é preciso estimular o crescimento. Portanto, nada muda.

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