quarta-feira, 4 de julho de 2018

Parente ataca pluralidade partidária

O painel "A governança do Brasil: os problemas, a agenda, as saídas" contou ainda com a participação do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso

Carla Araújo e Rafael Bittencourt | Valor Econômico

BRASÍLIA - A pluralidade partidária da política brasileira foi duramente criticada ontem pelo presidente do conselho de administração da BRF, Pedro Parente. O executivo, que foi ministro-chefe da Casa Civil no governo FHC e comandou a Petrobras na gestão Temer, considera que a atual configuração do sistema partidário impede o governo alcançar um nível satisfatório de eficiência.

Parente deixou, no mês passado, a presidência da Petrobras ao completar dois anos à frente da companhia. A saída ocorreu quando o governo sinalizou, durante a greve dos caminhoneiros, que poderia mexer na política de reajuste do preço dos combustíveis que ajudava a companhia a sair da situação de dificuldade financeira.

Em debate promovido pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), Parente defendeu a noção de "funcionamento orgânico" do governo para que seja alcançada uma boa governança na gestão pública. "O governo deve funcionar como uma entidade única, com uma clara diretriz e visão estratégica, onde prevalece a responsabilidade coletiva, sobretudo do presidente e de seus ministros", disse, na edição deste ano do Encontro Nacional da Indústria (Enai).

Parente - que foi criticado por uma ala no governo pela defesa da manutenção da política de preços da Petrobras - disse ainda que uma boa governança pública é aquela que permite autocorreções sem maiores traumas. "Se houver a necessidade de mudanças esse sistema tem que ser capaz de proporcionar a mudanças sem ruptura", disse Parente.

O executivo considera que, com a pluralidade partidária da política brasileira, é "impossível" colocar em prática a ideia de "governo orgânico". "O planejamento, a gestão pública, essas coisas não existem porque temos 30 ou 26 partidos representados no Congresso Nacional. Cada um tem a sua visão. A pergunta óbvia que vem é: essa é a melhor maneira de gerir os recursos do contribuinte?", questionou.

Parente destacou ainda a influência da "cultura do fisiologismo" nas relações entre partidos e na tomada de decisão de governos. "Indicações políticas que são naturais no primeiro nível, como em qualquer lugar do mundo, se estendem a níveis de gestão que são estritamente profissionais, de [funcionários] carreira, o que permite o aparelhamento da máquina pública", disse Parente, ressaltando que as agências reguladoras também foram alvo "desse loteamento dos cargos políticos, dada essa fragmentação" de partidos.

O ex-ministro reconheceu que não é "de maneira nenhuma otimista" em relação à capacidade de ganho de eficiência gestão pública nas condições atuais: "Esses problemas, e outros, não permitem a autocorreção da governança. O que acontece é justamente o contrário, propicia a autopreservação e o agravamento dessa situação."

Parente foi questionado se existe atualmente um "excesso de controle" que inibe a eficiência do gestor público. Ele, no entanto, não considera que isso ocorre simplesmente por causa do combate à corrupção protagonizado pela Lava-Jato. "Eu não considero que o problema seja em decorrência da operação, mas do próprio sistema gestão pública, que é baseado em processos, é altamente formalista e burocrático, onde a atenção para o resultado é muito pequena."

O painel "A governança do Brasil: os problemas, a agenda, as saídas" contou ainda com a participação do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que também salientou problemas relacionados à fragmentação política atual. Ele disse que não se considera tão pessimista quanto o antigo companheiro de governo, mas que não acredita que o momento político terá uma solução no curto prazo.

"Sou otimista no sentido que, em certos momentos da história brasileira, foi possível criar um movimento coletivo capaz de fazer as pessoas se unirem, acreditarem que, além das nossas diferenças, há uma coisa que pode nos levar juntos para um novo caminho. Isso está em jogo, agora. A eleições é um momento oportuno para isso acontecer", disse o ex-presidente.

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