quarta-feira, 11 de julho de 2018

Perto da guerra: Editorial | Folha de S. Paulo

EUA dão início ao conflito comercial com a China por meio de sanções relativamente modestas

Após meses de expectativas e escalada retórica em torno de uma guerra comercial, os Estados Unidos deram o primeiro tiro na sexta-feira (6), ao impor tarifas de 25% sobre US$ 34 bilhões em produtos importados da China, que anunciou revide em igual intensidade.

Infelizmente trata-se, ao que tudo indica, apenas da primeira etapa. Nesta terça (10), já se falava em restrições atingindo os US$ 200 bilhões. Do lado americano, o primeiro alvo foram setores de alta tecnologia, em que o rival emergente tem conseguido colocar sob ameaça a dominância dos EUA.

O presidente Donald Trump não se furtou a mencionar explicitamente sua preocupação com o programa Made in China 2025, que tem como objetivo levar o gigante asiático à liderança em áreas sensíveis e de potencial militar, como inteligência artificial e biotecnologia.

A resposta chinesa até aqui fora taxar produtos agrícolas e automóveis, principais artigos comprados nas transações bilaterais. O foco parece mais cirúrgico —enfraquecer o republicano, em ano de eleições legislativas, nas regiões produtoras que perderão com as tarifas.

Seria prematuro, talvez, classificar o início das hostilidades como uma guerra comercial, já que as sanções incidiam sobre uma pequena parcela de uma troca de bens que chega a US$ 635 bilhões anuais, com saldo de US$ 375 bilhões em favor da China. Representam também fatia ínfima do Produto Interno Bruto dos dois países.

O risco, cada vez mais presente, é uma sucessão de medidas restritivas. Pequenas escaramuças podem sair do controle e se transformar em batalhas sangrentas.

Só se sustenta o equilíbrio de baixas tarifas e alto volume de exportações e importações entre grandes mercados, como EUA, Ásia e União Europeia, se todos os envolvidos assim procederem.

Caso uma parte opte por sanções, passa a ser racional para as demais seguir o mesmo caminho, o que pode resultar em danos graves para as cadeias produtivas espalhadas pelo mundo.

Trump já anunciou que, em caso de retaliação chinesa, pode taxar os cerca de US$ 505 bilhões importados do país asiático —que, nesse caso, teria mais dificuldades de responder, dado que suas compras não passam de US$ 130 bilhões.

Em tese, ainda há tempo de evitar um conflito de alta intensidade, capaz de jogar o mundo em uma recessão. Quanto mais numerosos os setores e empresas atingidos, maior será a oposição dos interesses instalados, sobretudo nos EUA.

Vai ficando claro, contudo, que as duas grandes potências econômicas inauguraram um novo capítulo em suas relações. Daqui para a frente, cada um tentará proteger sua base produtiva e tecnológica, no que promete ser uma longa e acirrada disputa pela hegemonia.

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