quarta-feira, 1 de agosto de 2018

Bruno Boghossian: O fim da zona de conforto

- Folha de S. Paulo

Candidato surfa na polarização e se exime de responsabilidade sobre futuro do país

É hora de Jair Bolsonaro sair de sua zona de conforto. O deputado do PSL fez fama com anos de ataques ao “politicamente correto” e atraiu um eleitorado farto do PT ao alimentar uma polarização ideológica com a esquerda, mas não estamos mais nos salões do Congresso.

Bolsonaro tenta consolidar sua liderança na corrida presidencial com declarações que escandalizam seus opositores, enquanto se exime da responsabilidade de apontar um caminho para a crise que vivemos.

Frases de efeito e opiniões polêmicas cristalizam seu eleitorado, mas não resolvem os problemas dramáticos de um país complexo como o Brasil. A dois meses da eleição, a bola precisa voltar ao centro do campo.

O capitão reformado não conseguiu apresentar soluções no programa Roda Viva de segunda-feira (30). Ao falar de desemprego, disse apenas que o governo deve retirar amarras do mercado e “a própria sociedade resolverá o problema”, ignorando que a questão não se limita a direitos sindicais e burocracia.

Sobre mortalidade infantil, citou de modo confuso a saúde bucal e o cuidado com o sistema urinário de gestantes para evitar partos prematuros. Na educação, disparou contra cotas raciais para animar seus eleitores, mas deixou uma névoa sobre as cotas por renda. Não se sabe com clareza o que ele pensa sobre o acesso de pobres ao ensino superior.

Depois da entrevista, Bolsonaro reclamou de perguntas sobre o regime militar. Nas redes sociais, destacou que o país sofre com desemprego, homicídios e estupros. “É disso que o povo quer saber”, afirmou.

O presidenciável só finge indignação. Ele sabe que o público tem direito de conhecer suas opiniões e que o desembaraço com que trata temas como ditadura, racismo e desigualdades entre homens e mulheres ressoa bem em parte do eleitorado.

Bolsonaro tem razão ao dizer que o Brasil está mais interessado nas propostas para melhorar o bem-estar da sociedade. Em 82 minutos de entrevista, ele foi incapaz de expor uma plataforma concreta para o país.

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