sábado, 1 de setembro de 2018

Míriam Leitão: PIB não caiu, mas desacelerou

- O Globo

A boa notícia é que o país cresceu em cinco trimestres nos últimos seis, porém os números revelam a anemia da recuperação

A incerteza eleitoral e a crise de confiança, após o baque da greve dos caminhoneiros, são os principais fatores apontados por especialistas para o fraco crescimento do PIB de abril a junho, de 0,2% na comparação com o primeiro trimestre do ano. A indústria e os investimentos encolheram 0,6% e 1,8%, respectivamente, no trimestre. Nesse cenário, empresários pisam no freio e economistas já revisam para baixo as projeções de crescimento para o ano. O rombo fiscal de R$ 159 bilhões não permite investimentos públicos, e o superávit é esperado só em 2022.

Para recuperar empregos, país precisa crescer ao menos 2% ao ano. A notícia é ruim, mas tem atenuantes e também um alerta. O crescimento do PIB de 0,2% no segundo trimestre é fraco, praticamente zero. O que ajuda a explicar o resultado é que o trimestre foi atropelado pela greve do transporte de carga. Nesse aspecto, ter ficado no azul, ainda que pálido, é melhor do que voltar ao negativo. Nos seis últimos trimestres, houve alta em cinco e isso chega a ser uma boa notícia. Porém, o alerta é que a economia está desacelerando. Se comparado com o mesmo trimestre do ano passado, a alta é de 1%, quando era de 1,2% no período até março.

O país saiu mesmo da recessão e não voltou ao negativo desde o primeiro trimestre de 2017, o problema é que a economia desacelera antes de retomar o crescimento mais forte. Ele perdeu o fôlego, a densidade de retomada. Esse é o triste resumo desta dolorosa e lenta saída da crise.

O resultado de 0,2% no trimestre, ou 1% na comparação com o mesmo período do ano anterior, é muito menos do que o país precisa para superar a crise no mercado de trabalho. A paralisação do setor de transportes afetou principalmente a indústria e os investimentos e freou a recuperação. Ainda assim, há notícias positivas no relatório divulgado ontem pelo IBGE. A economia havia tido oito quedas consecutivas, desde o primeiro trimestre de 2015. Desses, seis ocorreram no governo Dilma, quando a economia caiu na recessão. Ela deixou o governo no meio do segundo tri de 2016, no pior momento da crise, quando os quatro trimestres acumulavam retração de 4,6%.

Nos dois primeiros trimestres integralmente do governo Temer, a economia ainda encolheu, depois foi para o terreno positivo, como se pode ver no gráfico. O problema é a falta de dinamismo desse movimento para recuperar-se da queda. Na taxa em 12 meses, tudo voltou para o azul no segundo trimestre, com exceção do consumo do governo, que precisa cortar gastos por causa da crise fiscal.

Os dados do PIB foram divulgados um dia após o IBGE mostrar novamente o maior drama do país: no trimestre encerrado em julho, 12,9 milhões de brasileiros estavam desempregados, outros 4,8 milhões simplesmente desistiram de procurar vagas. No total, 27,6 milhões estavam subutilizados no mercado de trabalho. Na taxa, houve uma queda do desemprego, mas muito fraca. Saiu de 12,9% para 12,3%. Um PIB que só sobe 0,2%, depois de uma alta de 0,1% no primeiro trimestre, não atende à urgência da crise que o país vive no emprego.

No segundo trimestre, a indústria de transformação e a construção civil caíram 0,8%, no segundo recuo seguido em relação ao trimestre anterior. Os investimentos encolheram 1,8% nessa forma de comparação. Esses foram os mais afetados pela greve dos caminhoneiros. Os serviços, por outro lado, conseguiram crescer 0,3%, e o consumo das famílias subiu 0,1%.

Tudo somado, o primeiro semestre acabou sendo fraco e por isso as projeções para 2018, que chegaram quase a 3%, já estão na casa de 1%. O Bradesco, por exemplo, estima apenas 1,1% de alta. O Itaú estima 1,3%, enquanto a MB Associados projeta 1,6%, mas com possibilidade de o dado ser revisado para pior. A Rosenberg Associados cortou de 2% para 1,5% a sua estimativa. Ontem, o Banco Central também divulgou os dados das contas públicas. O setor público consolidado fechou o mês de julho com um déficit de R$ 3,2 bilhões, rombo menor do que o esperado pelo mercado, mas ainda assim mais um número vermelho, o que já virou rotina nesse indicador. A dívida bruta também continuou subindo e atingiu 77% do PIB. O país está preso em uma dupla armadilha: baixo crescimento e crise fiscal.

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