sábado, 13 de outubro de 2018

Adriana Fernandes: Não deixem o Brasil quebrar

- O Estado de S.Paulo

Novas projeções da dívida pública brasileira caminham para 100% do PIB

Bastou menos de uma semana de campanha, no segundo turno das eleições, para ficar claro que os acenos reformistas dos dois candidatos ao Palácio do Planalto – Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT) – não são firmes. Ao contrário.

Quem esperava ações na direção da reforma da Previdência imediatamente após o resultado das urnas pode ir revendo o seu ponto de vista. É plausível afirmar que em alguns pontos do debate da proposta de reforma da Previdência houve até mesmo um retrocesso.

Antes das eleições no primeiro turno, o time econômico de Bolsonaro, sob a batuta de Paulo Guedes, emitia sinais de que já na transição trabalharia pela reforma, inclusive aproveitando algumas partes da proposta do governo Michel Temer. Investidores, analistas e operadores do mercado passaram a acreditar que as contas públicas estariam “salva” e a confiança retornaria.

No campo adversário, Haddad emitia sinais também de que faria uma reforma mais ampla – além daquela prevista no programa do PT, que cita mudanças no regime próprio da Previdência dos servidores públicos. Em debate, chegou a falar na fixação de uma idade mínima para o acesso à aposentadoria no País.

Só que não.

Nada disso foi reforçado nos últimos dias. Bolsonaro falou em uma reforma tocada vagarosamente. “Não é como muitos querem. Não adianta querer botar remendo novo em calça velha”, disse. Na quarta-feira, falou em “botar” uma idade de 61 anos. Na quinta, o candidato do PSL disse não ter fechado questão em torno da idade mínima. “Pode mudar. No primeiro ano, a gente pode fazer um plano 62-57 anos”, afirmou.


Haddad, por outro lado, voltou a focar na aposentadoria dos servidores, deixando claro que mudanças nas regras do INSS não estão em pauta, contrariando grupo de economistas do PT que defendem a urgência de uma reforma ampla já no início de um eventual governo.

Os dois candidatos resolveram focar em mudanças da reforma, no futuro, na direção do modelo capitalização, regime incompatível com o quadro de déficits crônico das contas públicas, pois exigiria um custo gigantesco para bancar o benefício dos que já se aposentaram ou vão se aposentar. Um custo crescente, que em 2040 chegaria a R$ 310 bilhões. Está claro que os planos para capitalização servem de subterfúgio para não fazer a reforma logo, já exigiria mais estudos.

Ainda na terça-feira, o Estadão/Broadcast alertava que as resistências à reforma seriam grandes nas duas candidaturas. Um dia depois, o ministro da Casa Civil em um eventual governo de Bolsonaro, o deputado Onyx Lorenzoni, descartou trabalhar para aprovar o texto do governo Temer e jogou para frente um possível debate sobre a ideia da capitalização para a Previdência.

O mercado reclamou do pessimismo em torno da proposta e prometeu relevar as declarações de Onyx. A resistência não durou muito. A ficha começou a cair dias depois com as próprias declarações do candidato. O mau humor se instalou.

A polarização a que chegamos já mostrou que não dá para pensar no futuro com um olhar do passado. O eleito não terá vida fácil. Os apoiadores de hoje serão os críticos de amanhã.

Não é porque o mercado financeiro apoiou o programa bolsonarista que a reforma vai sair logo. Tem de combinar com a “política”. Sempre ela.

A “renovação” do Congresso não é garantia de que as reformas vão avançar. A ordem do dia da nova legislatura deve ser dominada pelas pautas que elegeram os novos congressistas, sobretudo a segurança.

O que pode acontecer? Uma deterioração rápida da crise fiscal. Assim, a reforma da Previdência virá a fórceps, com maior custo para todos, como ocorreu em outros países.

É por isso que as novas projeções da dívida pública brasileira caminham – assustadoramente – para a marca de 100% do PIB. Já se prevê que a dívida pública poderá chegar a 98% em 2023. Detalhe: no primeiro ano do sucessor do presidente que será eleito no próximo dia 28.

Se o futuro presidente (Bolsonaro ou Haddad) não fizer um ajuste rápido, chega-se fácil aos 90% do PIB. As consequências serão ainda mais dramáticas do que as que vivemos hoje.

Aos dois candidatados, o que se pode pedir no momento é: não deixem o Brasil quebrar.

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