sexta-feira, 19 de outubro de 2018

Aumentam suspeitas sobre campanhas na rede social

Murillo Camarotto e Luísa Martins | Valor Econômico

BRASÍLIA, SÃO PAULO E DO RIO - Denúncia de que empresas estariam comprando pacotes de disparos em massa de mensagens no WhatsApp contra o PT, partido do presidenciável Fernando Haddad, aumentou a suspeita de que o uso das redes sociais para disseminar "fake news" está causando forte impacto na campanha eleitoral. As empresas, segundo reportagem da "Folha de S. Paulo", apoiam o candidato Jair Bolsonaro (PSL), líder das pesquisas. A prática é ilegal. Doações de pessoas jurídicas a candidatos estão proibidas pela lei eleitoral.

O PT entrou com ação para que a Justiça Eleitoral investigue o caso. O partido solicita que o TSE torne Bolsonaro inelegível. A coligação em torno de Fernando Haddad pede, ainda, a decretação da prisão do empresário Luciano Hang, caso ele não colabore com as investigações. Hang é dono da rede de lojas Havan, supostamente um dos envolvidos na compra desses serviços.

"Basta prender um empresário que ele vai fazer delação premiada e entregar a quadrilha toda", disse Haddad em sua conta no Twitter. Ele afirmou ter informações de que Bolsonaro, em jantares com empresários, teria pedido apoio financeiro para a campanha. Também pelo Twitter, o candidato do PSL não negou o apoio de empresários para a divulgação de mensagens pelo WhatsApp. "Apoio voluntário é algo que o PT desconhece e não aceita. Sempre fizeram política comprando consciências".

A Polícia Federal ainda não foi acionada pelo TSE para investigar a denúncia, mas, na segunda-feira, divulgará investigação sobre autores de "fake news". Em evento, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, condenou duramente o uso desse recurso na campanha. "Numa democracia não pode haver censura, mas é preciso também que não haja abuso, ilícito na forma como os eleitores se expressam e convencem os demais a apoiar determinado candidato", observou. "Não pode haver cooptação viciada".

Campanha em rede social está sob suspeita
A suposta participação de empresários em uma campanha maciça para disseminar mensagens contra o Partido dos Trabalhadores (PT) transformou as redes sociais em pivô de uma polêmica que despertou reações em Brasília, ontem, e recebeu atenção da mídia internacional.

Em reportagem, o jornal "Folha de S. Paulo" publicou que empresas teriam comprado pacotes de disparo em massa com mensagens contra o PT no WhatsApp, o aplicativo controlado pelo Facebook. Segundo o jornal, uma grande operação de empresários que apoiam o candidato Jair Bolsonaro (PSL) estaria sendo planejada para a próxima semana, antecedendo o segundo turno das eleições.

Se comprovada, a denúncia poderia configurar prática ilegal de doação de campanha por empresas, o que é vedado pela legislação. Além disso, o gasto não estaria sendo devidamente contabilizado pela campanha de Bolsonaro na Justiça Eleitoral. As companhias ainda estariam incorrendo em outra irregularidade ao comprar bases de dados de terceiros, o que também é proibido por lei.

Em Brasília, o ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, reuniu-se com a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, e com procuradores eleitorais.

Em discurso, Dodge disse que o Ministério Público Eleitoral (MPE) combate os ilícitos eleitorais, mas não fez menção à suposta ilegalidade na campanha do PSL.

Após o encontro, o ministro disse que a Polícia Federal (PF) poderá investigar o caso, se for acionada pelas autoridades competentes.

"Isso é da esfera da Justiça Eleitoral Federal. Se formos convocados, iremos verificar tudo isso. Mas cabe a iniciativa à Justiça Eleitoral. Estamos à disposição", afirmou.

O ministro informou que a PF pode apresentar hoje, ou no início da próxima semana, os resultados das primeiras investigações relacionadas à circulação de notícias na mídia social. Ressalvou, no entanto, que os relatórios vão abordar, principalmente, questionamentos feitos sobre o sistema eletrônico de votação, e não questões relacionadas aos apoiadores dos candidatos à Presidência da República.

Segundo o Valor apurou, a PF pode apresentar resultados referentes a ameaças recebidas pela presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministra Rosa Weber. Segundo um texto que circulou nas redes sociais, o candidato Jair Bolsonaro (PSL) estaria "matematicamente eleito". "Se as urnas forem fraudadas", diz a mensagem, a população irá para as ruas até que haja uma nova eleição com voto impresso. "Experimente deixar que isso aconteça", prossegue o texto.

"A nossa grande preocupação está focada, hoje, com a questão do respeito da vontade do eleitor. Essa é a prioridade. As outras 'fake news', as pessoas que foram atingidas devem requisitar a investigação ou intervenção policial", disse Jungmann. "Vamos supor que foi algo contra a honra; cabe a quem se sentiu atingido fazer uma reclamação e pedir que seja aberta a investigação."

A PF também investiga a autoria de um vídeo no qual policiais militares de Brasília denunciam fraudes nas urnas eletrônicas. O diretor-geral da PF, Rogerio Galloro, tem discutido frequentemente a questão das notícias falsas, mas não participou de reuniões sobre o assunto, como chegou a circular.

Ontem, Jungmann lembrou que não há tipificação penal para a veiculação de notícias falsas, a não ser quando estas resvalam em crimes de injúria ou contra a honra. Ele reconheceu que o controle da circulação de notícias falsas é complexo e depende da participação de toda a sociedade.

"O Estado tem dificuldade de conviver e se relacionar com a velocidade do mundo digital, onde não há hierarquia, não há regras. Estamos fazendo uma ponte entre o mundo digital e o presencial, que é onde estão os órgãos e as instituições", disse Jungmann. "Quando você trabalha com as "fake news", o problema é confirmar a veracidade, porque elas são em grande número e viralizam aos milhões de 'likes'", disse o ministro.

Sobre a atuação de empresários no WhatsApp contra o PT, a expectativa é que a Procuradoria-Geral Eleitoral (PGE) não proponha uma ação específica no TSE para pedir investigação sobre suposto abuso de poder econômico, que teria sido cometido pela campanha de Bolsonaro.

O mais esperado é que a atuação do MP se dê "no âmbito de representações já encaminhadas" à Corte eleitoral sobre o tema. O PT ajuizou uma ação para pedir a inelegibilidade de Bolsonaro pelos próximos oito anos, enquanto o PDT estuda pedir a anulação das eleições, caso se confirme uma fraude.

Ontem, Raquel Dodge reforçou o apelo contra a disseminação de notícias falsas. Ela disse que o Ministério Público Federal está preparado para garantir a normalidade do processo eleitoral.

O ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), disse que a Justiça Eleitoral está tomando todas as providências necessárias para combater as condutas ilícitas praticadas na eleição. "É preciso que pratiquemos o "fair play", que significa cumprir as regras do jogo. Haverá um Estado a gerir e uma sociedade a atender em todas as manhãs seguintes ao pleito eleitoral", disse o ministro. Fachin participou de uma reunião do Ministério Público Eleitoral como representante de Rosa Weber.

A denúncia de que empresários estariam usando o WhatsApp para denegrir a imagem de Haddad teve repercussão internacional. Jornais como "The Wall Street Journal" e "The New York Times" divulgaram notícias e artigos em seus sites sobre o assunto, ressaltando a importância que a mídia social passou a ocupar nas eleições brasileiras.

O empresário Luciano Hang, presidente da rede de lojas Havan, fez uma transmissão ao vivo pelo Facebook no qual negou participar da campanha ilegal. Ele foi mencionado na matéria da "Folha" como um dos participantes. "Eu não preciso disso. Eu faço o meu conteúdo na minha rede e ele se dissemina", afirmou.

Sócio da QuickMobile, empresa de estratégia digital, Peterson Rosa disse ao Valor que a empresa não prestou serviços relacionados à campanha eleitoral neste ano. A companhia também foi citada pela "Folha". Rosa afirmou que a QuickMobile trabalhou na campanha de Dilma Rousseff à presidência em 2014 distribuindo mensagens por SMS, mas que este ano não fechou contrato com partidos, candidatos ou empresas para o envio de conteúdo ligado ao pleito.

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