sexta-feira, 26 de outubro de 2018

Democracia modera discursos de candidatos: Editorial | O Globo

Lula já havia recuado em 2002, agora Bolsonaro e Haddad fazem o mesmo, mas não se aceitam recaídas

O hoje ex-presidente Lula estava em 2001 ainda na sua primeira encarnação como radical. Vinha de três derrotas consecutivas em disputas presidenciais, até que decidiu moderar o discurso para encarar a quarta campanha consecutiva. Deu certo, elegeu-se e se manteve no Planalto para conquistar o segundo mandato consecutivo, em 2006.

Em entrevista ao GLOBO, o cientista político e professor do Insper Fernando Schüler, ao examinar a polarização radicalizada destas eleições — característica turbinada pelas redes sociais, em que o distanciamento físico entre as pessoas e a consequente possibilidade do anonimato estimulam a agressividade irresponsável — disse que, apesar de tudo, a democracia “é uma extraordinária máquina de moderar posições”.

O recuo de Lula, na campanha do primeiro mandato, quando ainda não havia redes sociais eletrônicas, é prova disso. As derrotas consecutivas lhe ensinaram que pregava para militantes e simpatizantes petistas, não para os eleitores que precisava atrair com a finalidade de furar o teto histórico do partido, de 30% dos votos.

Mesmo Bolsonaro, que tem tido êxito em explorar discursos radicais, dado o desgaste acumulado pelo PT nos 13 anos de governo federal, dá mostras de perceber que não irá longe com o figurino do deputado ex-capitão do Exército. O que lhe permitiu ganhar no primeiro turno não é adequado para as urnas de domingo, tampouco para governar. A chamada oscilação para baixo dentro da margem de erro na última pesquisa Ibope deve tê-lo alertado.

Vem daí, não por coincidência, o recuo no desatino da absorção do Ministério do Meio Ambiente pela pasta da Agricultura, na atenuação de medidas de liberação no porte e uso de armas e em outros temas. Sem falar das negativas à volta da CPMF, à Constituinte de “notáveis” do seu vice, general Mourão, e na resposta devida ao filho Eduardo quando este fez a menção destrambelhada do fechamento do Supremo.

Haddad tenta o mesmo no PT, mas enfrenta dificuldades para fazer o caminho rumo à sensatez. Porém, ao menos retirou a Constituinte chavista do seu programa. O próprio Bolsonaro, provável vitorioso no domingo, precisa seguir no seu processo de moderação, tantos foram os desatinos que cometeu na campanha e mesmo na sua vida parlamentar. Seus ataques e ameaças à imprensa, a Lula, aos petistas em geral, ao MST etc. precisam ser compensados por gestos e palavras de sensatez.

Em nada o diminuirá. Ao contrário. Mas o exemplo de Lula mostra que recuos em erros e mudanças necessárias de tom precisam ser verdadeiros. Na campanha de 2002, o marqueteiro da vez, Duda Mendonça, criou o personagem “Lulinha, paz e amor”, encenado pelo candidato. Não era verdadeiro. O velho Lula voltou por inteiro no segundo governo, e é este que está preso em Curitiba, incomodado com momentos de sensatez de Haddad.

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